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Dos números ao infinito

Por meio do olhar astronômico e enciclopédico do inglês Ian Stewart, livro mostra que a matemática é indispensável para decifrar os mistérios do universo


postado em 12/06/2020 04:00 / atualizado em 11/06/2020 14:49

(foto: Ilustração: Lelis)
(foto: Ilustração: Lelis)
 

Em 1977, a Nasa enviou para o espaço sideral – “indo onde nenhum homem jamais esteve” – as naves Voyager I e II. Uma viagem sem volta, buscando desvendar e compreender alguns dos quase infinitos mistérios e segredos do universo. Dentro dessas espaçonaves, e com o intuito de apresentar com “orgulho” a cultura terrena para uma possível inteligência extraterrestre – acredito que uma menção ao nosso atual presidente seria um bom update caso esses alienígenas suspeitassem de que somos seres minimamente racionais – os cientistas, encabeçados pelo grande Carl Sagan, então professor da Universidade de Cornell, inseriram os chamados Golden Records. Esses registros, cuidadosamente gravados em um disco laser dourado, contêm sons, imagens e equações matemáticas com o objetivo de apresentar ao universo a diversidade cultural e biológica do terceiro planeta do Sistema Solar.
O lançamento dessa “garrafa” no “oceano cósmico” funciona como uma cápsula do tempo. Pode ser que quando, ou se, alguma “inteligência” receber esse presente, a Terra já esteja extinta, seja por questões políticas (minha aposta), virais ou pelo fim inerente da nossa galáxia. Engenhosamente, Sagan e seus colegas reuniram, além dos cantos de pássaros e baleias, músicas de culturas e épocas distintas e saudações em 55 idiomas; porém – é importante ressaltar – as primeiras “linhas” dessas gravações contêm equações matemáticas e físicas.


Qual o motivo de inserir essas equações? Será que elas são universais ou apenas uma linguagem inventada pelos seres terrenos? Há uma disputa filosófica sobre a natureza da matemática. Os platônicos – os que acreditam que a matemática é descoberta reveladora – consideram que existem padrões intrínsecos à natureza dos quais seríamos apenas intérpretes-decodificadores do código preexistente no Universo. Já outros, os que trabalham com a matemática moderna e enxergam os axiomas apenas como “regras de um jogo”, acreditam que a matemática é inventada – um sistema de manipulação de símbolos artificiais criado unicamente pelo ser humano para “explicar/adaptar” o mundo sensível. Galileu encarava o Cosmo como um monte de equações e mistérios, e sua missão era descobrir/desvendar tais enigmas. A sequência de Fibonacci, por exemplo, surgiu de modelos matemáticos, mas depois foi observada na natureza: em como as ramificações de algumas árvores se desenvolvem, na quantidade de pétalas das flores, na ramificação dos brônquios dos pulmões e, acredite, até mesmo no “incompreensível e inesperado” mercado financeiro. Descoberta de uma mente divina que seria facilmente compreensível para os alienígenas? Nunca saberemos. Porém, há os não platonistas que enxergam a matemática como um jogo de xadrez ou GO, na qual só somos capazes de descrever a natureza porque a “criamos” ou a “enxergamos” limitados assim. Essa matemática inventada seria incompreensível para os extraterrestres que recebessem as Voyager.  

Da história ao futuro

Em seu novo e fascinante livro, o autor de 17 equações que mudaram o mundo e Será que Deus joga dados? nos conta essas e outras histórias, e nos leva a uma jornada pelos sentidos, invenções e descobertas do Universo, sempre de mãos dadas com a matemática. Inventada? Descoberta? Não importa, pois ainda assim continuamos encantados e fascinados com a abordagem poética e deslumbrante da dança do Cosmo e do tango da história do pensamento.


Professor de matemática na Universidade de Warwick, o inglês Ian Stewart inicia com os primeiros pensadores que começaram a especular por meio de distintas crenças acerca da origem e do funcionamento do Universo. Esse passeio pelo espaço e tempo chega até os dias atuais. Apesar de fazer pouco uso de fórmulas e definições rigorosas, Stewart, com algum rigor, explica o que está por trás dos modelos matemáticos e as posturas filosóficas e culturais dos diversos cientistas que se dedicaram ao tema. Por certo, desde os tempos antigos, os seres humanos se fascinam com o Sol, com a Lua, com as estrelas e com os outros planetas do nosso sistema, e por isso buscam conhecer e elaborar um pouco mais.


Pelo olhar astronômico e enciclopédico do matemático, viajamos desde o tratado de Almagesto, escrito pelo grego Ptolomeu no século 2, até os modelos e equações mais modernas para tentar explicar o que há de “novo” no surgimento e no “fim” do Universo. Nos 19 capítulos, Stewart examina em ordem cronológica as diferentes maneiras pelas quais os cientistas e os filósofos abordaram o Cosmo. Além disso, o autor discorre sobre alguns mistérios aos quais não estamos cientes. Por exemplo, sabemos que as Leis de Newton descrevem a gravidade como uma força entre dois corpos, mas essas mesmas leis não explicaram como exatamente essa força funcionava. Newton e outros tentaram resolver essa questão, que permaneceu sem solução até Einstein aparecer, séculos depois, com a sua brilhante teoria da relatividade geral – que demorou para ser realmente aceita.


Stewart deixa claro que os modelos, as ideias e as narrativas do livro são apenas uma simplificação da “realidade” – poesia e música de um concerto nebuloso, infinito e maravilhoso.


Espaço “sideral” para interpretações e revelações eternas. Stewart tem uma longa carreira com a escrita de livros científicos populares, mas nunca perde a poesia do mistério. O resultado deste livro é uma viagem literal pelos buracos negros, supernovas, supercordas – um mundo surreal-real que certamente irá satisfazer qualquer pessoa que deseje vislumbrar os segredos e as histórias mais belas de um dos contos ou capítulos mais fascinantes da nossa presença por aqui, neste Universo regido por leis descobertas ou apenas largados ao léu.

A arte no espaço

E a arte, será ela universal? Em 2008, Inhotim recebeu uma exposição chamada Once upon a time, que consistia na exibição dessas imagens que a Nasa enviou ao espaço com a Voyager II em 1977. As equações matemáticas – vistas como arte encanto universal – estavam lá. Essa missão, segundo a crença de alguns, é uma das mais bem-sucedidas da história interestelar, já que possibilitou à “humanidade” sonhar/visitar outros planetas e escapar do nosso “sisteminha mínimo solar”. Inspirado pelo tempo-espaço, o artista e também cineasta Steve McQueen criou uma trilha sonora exibida durante a projeção das imagens. Nessa trilha, ouvimos vozes em línguas e idiomas desconhecidos – a proposta era compor um fenômeno extático frequentemente usado nos cultos espirituais. Seriam então matemática e a arte universais e espirituais? Um alienígena se comoveria com a exatidão da arte e a beleza da matemática, ambas buscando pelo infinito universal? Nessas imagens faltam, no entanto, a representação da pobreza, dos conflitos, dos genocídios e das doenças. Seria importante apresentá-los aos nossos vizinhos? Ou é melhor escondê-los, pois é justamente isso, como humanidade, de que nos envergonhamos, porém, seguimos perpetrando? A obra discute esses e outros importantes pontos. O fato é que as Voyagers ainda estão viajando pelo espaço sem destino e em 300.000 anos passarão pela estrela Sirius, “bem logo ali”, e bem longe de tudo que há e não há no universo descrito poeticamente por Stewart.

 

* Graduado em matemática, Jacques Fux é escritor, autor de Antiterapias, Nobel, Meshugá: um romance sobre a loucura, entre outros livros

 

 

Desvendando o cosmo: Como a matemática nos ajuda a compreender o Universo

  • De Ian Stewart
  • Zahar Editora.
  • 408 páginas

l R$ 70


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