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Estado de Minas Economia

Colheita de uva no RS era feita em regime de trabalho análogo à escravidão

Homens que trabalhavam na colheita da uva em Bento Gonçalves (RS) relatam ter sido enganados e submetidos a uma rotina de exploração e horrores


25/02/2023 10:40 - atualizado 25/02/2023 10:42

Mão colhendo cacho de uva
(foto: Reprodução/Vinícola Aurora)

Resgatados em uma operação mobilizada por MTE (Ministério do Trabalho e Emprego), MPT-RS (Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul), Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal na noite de quarta-feira (22/2), os homens que trabalhavam na colheita da uva em Bento Gonçalves (RS) em regime análogo à escravidão relatam ter sido enganados e submetidos a uma rotina de exploração e horrores.


Desde o resgate pelas autoridades, eles foram alojados no ginásio municipal da cidade turística da serra gaúcha, onde seriam identificados para, segundo o MTE, receberem o pagamento da empresa que os contratou, os respectivos valores referentes a direitos trabalhistas e transporte de volta para casa. Eles também receberão três parcelas do seguro desemprego.


A maior parte dos homens eram conhecidos uns dos outros e moravam em Salvador (BA). Segundo o MPT-RS, foram 192 homens resgatados com idades entre 18 e 57 anos e tinham, a maioria, entre 20 e 39 anos.


No ginásio, eles relataram terem sido ludibriados com propostas de emprego temporário com pagamento de R$ 4 mil, alojamento e refeições. Alguns receberam a proposta encaminhada por redes sociais por parentes e conhecidos. Outros teriam sido aliciados.


Desde a chegada, no início de fevereiro, eles se viram alojados em quartos apertados em uma pousada no bairro Borgo e submetidos a uma rotina de trabalho diário das 5h às 20h na colheita da uva, com folgas somente aos sábados.


Os trabalhadores relataram ser vigiados e intimidados por seguranças armados, o que incluía serem retirados da cama com uma arma de choque e constantemente xingados por serem baianos. Eles contaram ainda que a comida oferecida era estragada e, caso quisessem comprar outros alimentos, só poderiam fazê-lo em um mercadinho a poucos metros dali, que praticava preços superfaturados. Nesse caso, o valor seria descontado do valor da remuneração ao final do trabalho.


Caso quisessem deixar o local, eram impedidos pelos seguranças por estarem em dívida com o empregador pelo alojamento e pelo transporte. O somatório das práticas levou o MPT-RS a classificar a prática como um caso análogo à escravidão e a operação que as interrompeu como um resgate.


O caso foi descoberto quando seis homens conseguiram fugir. Três foram a Caxias do Sul e três para Porto Alegre, cidades em que procuraram a Polícia Rodoviária Federal e denunciaram o caso.


O empresário Pedro Augusto Oliveira Santa, responsável pelas empresas Fênix Serviços de Apoio Administrativo e Oliveira & Santana, foi preso e libertado mediante pagamento de fiança de R$ 39.060.


Conforme os trabalhadores relataram aos investigadores, eles prestaram serviços a três vinícolas locais: Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton. Conforme o MPT-RS, após o pagamentos aos trabalhadores das verbas rescisórias e do transporte para a cidade de origem, a instituição vai trabalhar na responsabilização da cadeia produtiva.


Em nota de esclarecimento à imprensa, a Fênix declarou que "os graves fatos relatados pela fiscalização do trabalho serão esclarecidos em tempo oportuno, no decorrer do processo judicial".


A vinícola Aurora, também por meio de nota à imprensa, disse que "se solidariza com os trabalhadores e reforça que não compactua" ao que eles foram submetidos. Segundo o texto divulgado, a vinícola contrata, no período sazonal da colheita, "trabalhadores terceirizados, devido à escassez de mão de obra na região" e que repassava R$ 6.500 à terceirizada por mês por cada trabalhador.


A Cooperativa Garibaldi, em nota, disse que desconhecia a situação relatada e que, diante do apurado, encerrou o contrato com a empresa para a prestação de serviço de descarregamento de caminhões, mas que "seguia todas as exigências contidas na legislação vigente".


O texto diz ainda que a cooperativa "reitera seu compromisso com o respeito aos direitos –tanto humanos quanto trabalhistas – e repudia qualquer conduta que possa ferir esses preceitos".


Já a Salton, também em nota, disse que "a empresa não possui produção própria de uvas na Serra Gaúcha, salvo poucos vinhedos [...] manejados por equipe própria", mas que tinha contrato com sete trabalhadores da empresa em cada turno para o descarregamento de carga. Diante do relatado pela imprensa, disse que "não compactua com estas práticas e se coloca à disposição dos órgãos competentes para colaborar com o processo".


O caso em Bento Gonçalves levou a Uvibra (União Brasileira de Vitivinicultura) a emitir nota dizendo não tolerar, "sob qualquer circunstância, as condições de trabalho e de habitação oferecidas por esta empresa prestadora de serviço".


A entidade admitiu que, embora as vinícolas não fossem as empresas empregadoras, "existe amplo consentimento de que a cadeia vitivinícola deve ser mais vigilante e austera com relação à contratação de serviços terceirizados." A Uvibra também se colocou à disposição para participar de um colegiado com autoridades e sindicatos para fiscalizar a questão dos serviços temporários.


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