Apesar de o uso da cloroquina em pacientes infectados com o novo coronavírus não ter eficácia comprovada, o presidente Jair Bolsonaro insiste em dizer que o remédio é a solução para a COVID-19. Diante disso, a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) resolveu chamar a atenção para o risco da automedicação, após “interpretações precipitadas afirmando que medicamentos antimaláricos são eficazes para tratamento e prevenção de formas graves da COVID-19”.
Em posicionamento divulgado para a imprensa, a ASBAI mostra diversos pontos sobre o uso do medicamento em pacientes contaminados. “Observamos a automedicação de pessoas assustadas com a doença e a prescrição indiscriminada desses medicamentos off-label por médicos, apesar da ausência de boas evidências científicas que sustentem seu benefício clínico no combate à COVID-19”, afirma trecho do documento.
Nesta quarta-feira (13), Jair Bolsonaro disse que vai conversar com o ministro da Saúde, Nelson Teich, para incluir o uso da cloroquina e seu derivado hidroxicloroquina no protocolo de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS).
Vale relembrar que a cloroquina e a hidroxicloroquina são medicamentos utilizados há várias décadas como agentes antimaláricos e anti-inflamatórios em doenças reumatológicas e autoimunes como o lúpus eritematoso sistêmico.
Taxa de mortalidade não muda
Na segunda-feira (11) o resultado de uma das principais pesquisas sobre o assunto foi publicado na revista Jama (Journal of The American Medical Association). Nela, o estudo feito por pesquisadores da Universidade de Albany, no estado de Nova York, não encontrou relação entre o uso do medicamento e a redução da mortalidade pela doença.
Foram analisados 1.438 pacientes infectados com o novo coronavírus em 25 hospitais de Nova York.
Foram analisados 1.438 pacientes infectados com o novo coronavírus em 25 hospitais de Nova York.
A taxa de mortalidade dos pacientes tratados com hidroxicloroquina foi semelhante à dos que não tomaram o medicamento, assim como a taxa de pessoas que receberam hidroxicloroquina combinada com antibiótico azitromicina.
Além disso, os pacientes que tomaram a combinação de medicamentos tiveram duas vezes mais chances de sofrer parada cardíaca durante o período de análise.
Além disso, os pacientes que tomaram a combinação de medicamentos tiveram duas vezes mais chances de sofrer parada cardíaca durante o período de análise.
Outro ponto são os problemas cardíacos que já são um efeito colateral conhecido da cloroquina. “Considerando as inúmeras publicações científicas enfatizando a alta frequência e gravidade das manifestações cardíacas da COVID-19, este é um importante sinal de alerta contra o uso indiscriminado da hidroxicloroquina nos casos leves e ambulatoriais da doença", afirma a ABAI.
O documento divulgado pelos brasileiros ainda chama a atenção para a mistura do elemento com outras drogas. “Existe o aumento do risco de sua toxicidade devido à interação com outras drogas, morbidades cardíacas subjacentes e lesão renal aguda, cenários clínicos frequentemente observados em pacientes, particularmente os idosos com COVID-19.”
Há alguns dias, Teich, a exemplo de Mandetta e da Organização Mundial de Saúde (OMS), afirmou que não há comprovação científica sobre a eficácia do remédio no tratamento da COVID-19 e foi contra a posição de Bolsonaro.
Bolsonaro se baseia em estudo francês
Além do lúpus, a cloroquina é usada no tratamento de artrite reumatoide e malária. O medicamento ganhou projeção mundial como possível solução para o coronavírus após a publicação de um estudo na França, realizado pelo infectologista Didier Raoult, da Universidade de Medicina de Marselha.
Os resultados levaram líderes mundiais como o presidente norte-americano, Donald Trump, e o brasileiro, Jair Bolsonaro, a defender o uso desse medicamento contra a COVID-19.
Na pesquisa os pacientes contaminados recebem a hidroxicloroquina associada com um antibiótico chamado azitromicina. Apesar dos resultados que foram considerados promissores, a comunidade científica se mostrou dividida em relação à possível eficácia do medicamento.
De acordo com a maioria dos pesquisadores, o estudo foi feito com um número pequeno de participantes, apenas 30. Além disso, eles alertam para a necessidade de análises profundas sobre os efeitos colaterais do remédio, que são muitos.
*Estagiária sob supervisão da subeditora Kelen Cristina