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Estado de Minas

Processados pelo MP, pais das vítimas da Boate Kiss vão recorrer à OEA

Familiares são acusados de calúnia e difamação por causa de críticas feitas à atuação do MP na investigação das causas e responsáveis pela tragédia. Processos já estão em fase de sentença


postado em 12/12/2016 11:49 / atualizado em 12/12/2016 12:09

(foto: Divulgação/Facebook)
(foto: Divulgação/Facebook)
Como se não bastasse a dor de perder os filhos de maneira trágica, os pais das vítimas do incêndio da Boate Kiss, que completa quatro anos agora em janeiro, enfrentam também processos de calúnia e difamação movidos por promotores do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) - Joel Oliveira Dutra, Mauricio Trevisan, Ricardo Lozza e João Marcos Adrede Y Castro- que atuam ou já atuaram na investigação. Eles não gostaram de críticas feitas pelos pais à imprensa, nas redes sociais e ainda em cartazes afixados em frente a boate Kiss, à época da tragédia sobre a condução do inquérito das mortes.

O incêndio na boate localizada em Santa Maria, interior do Rio Grande do Sul, matou 242 pessoas, a maioria jovens, e deixou 636 feridos, entre eles cerca de 50 com sequelas graves. As ações de calúnia estão em fase final e podem ter sentença em primeira instância até o começo do ano que vem.

O promotor Ricardo Lozza move um processo contra Sérgio da Silva e Flávio José da Silva, presidente e vice da Associação dos Familiares das Vitimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM). Os dois perderam seus filhos na tragédia de 27 de janeiro de 2013. Sérgio perdeu o filho Augusto Sérgio Krauspenhar da Silva, na época com 20 anos. Flávio perdeu a filha Andrielle Righi da Silva, que este ano faria 25.

Já os promotores Joel Dutra e Mauricio Trevisan processam Paulo Carvalho, também dirigente na AVTSM, que perdeu o filho Rafael Paulo Nunes de Carvalho, na época com 32. Em outro processo, Marta Beuren, cujo filho Sílvio Beuren, de 31, também morreu no incêndio, está sendo processada civilmente, com pedido de indenização, pelo promotor João Marcos Adede Y Castro que, antes de aposentar no final de 2013, era um dos responsáveis pelo caso.

Inquérito O motivo das ações, segundo o advogado Pedro Barcellos Júnior, que defende alguns dos acusados, são críticas feitas pelos pais à condução do inquérito que investigou as causas e os responsáveis pela tragédia, que causou comoção mundial e é considerado um dos piores incêndios já registrados em ambientes fechados no mundo. As críticas foram feitas por meio de postagens no Facebook, artigos em jornais e cartazes.

Lozza era o responsável por um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com os donos da Boate Kiss, instaurado para resolver um problema com a vizinhança causado pelo barulho da casa noturna. Foi no curso desse processo de regulamentação desse assunto que os donos da boate colocaram uma espuma imprópria no teto que, durante o incêndio, liberou uma fumaça tóxica responsável pela maioria das mortes.

Na visão dos pais, tanto o MP, como a prefeitura e o Corpo de Bombeiros, foram negligentes na fiscalização da boate. Mas ano passado, o MP-RS resolveu pedir o arquivamento do inquérito contra os servidores e a absolvição de cinco bombeiros denunciados no caso. Os promotores foram procurados pela reportagem, por meio da assessoria de comunicação do MP-RS, mas não foi dado nenhum retorno sobre o pedido de entrevista. 

Irregular “O principal motivo é que os pais alegam que os promotores sabiam que a boate estava funcionando de forma irregular e deixaram ela funcionar assim, mesmo sendo assinado o Termo de Ajustamento de Conduta dentro do Inquérito Civil que apurava crime ambiental e poluição sonora. Esse é o processo ´contra Flávio e do Sérgio. Já Paulo Carvalho escreveu artigos sobre corporativismo e protecionismo uma vez que o MP sabia da situação da boate e nada fez com relação aos agentes públicos. “Restou escrachado que sabiam também assim como o MP, da situação da boate estar ilegal”, alega Pedro.

Os pais também criticaram publicamente a decisão dos promotores de pedir o arquivamento do inquérito civil que apurava a responsabilidade de servidores públicos municipais na tragédia, entre eles o ex-prefeito de Santa Maria Cezar Schirmer (PMDB), e atual secretário de Segurança Pública do Rio Grande do Sul.

A boate foi reformada sem autorização da Superintendência de Análise de Projetos e Vistorias da prefeitura, mas ainda assim obteve o alvará de localização do imóvel – documento que comprova que ela oferece condições de segurança.

Para o MPRS, a falha foi resultado da falta de comunicação entre os setores. Os pais não aceitaram alegando que houve omissão do poder público, inclusive do MPRS, e não problemas de comunicação. O Conselho Nacional do MP ignorou a alegação dos familiares e aceitou o pedido de arquivamento do inquérito.

De acordo com o Pedro Barcellos, os proprietários da boate, um músico e seu assistente de palco, são os únicos condenados pela Justiça de Santa Maria no processo que apura as mortes, mas eles recorreram ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre. 

 

 'Vou lutar até o fim'


Paulo Carvalho não se conforma com a morte do filho. Para ele, tudo poderia ter sido evitado se o poder público tivesse cumprido seu papel de fiscalizar estabelecimentos como a Boate Kiss. Por isso, ele diz não aceitar o arquivamento do inquérito contra o servidores públicos, todos indiciados pela Polícia Civil no término do inquérito, e segue pedindo justiça.

“Vou lutar até o fim. Ninguém vai me calar. Posso até ser preso, mas vou continua denunciando falha dos proprietários e omissão do serviço publico, combinação que causou essa enorme tragédia. Não quero vingança, quero justiça”, cobra Paulo Carvalho, que se emociona sempre que toca no nome do filho e se refere a ele somente no presente.

Morador de São Paulo, apesar da distância de Santa Maria, ele segue firme junto com outros pais na luta por justiça e conta que a dor uniu as famílias. “A gente é quase irmão. Quando nos encontramos não ficamos chorando. Ficamos lembrando das coisas boas que passamos com eles”, relata ele, que esteve em Santa Maria no final do mês passado para prestar depoimento no processo em que é acusado de calúnia.

As ações do MPRS contra os pais, classificadas por ele como “vergonhosas e desumanas”, já foram denunciadas na Corte Internacional de Haia e agora devem ser levadas à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). “Estamos finalizando o documento”.

“O processo contra os pais podem até nos condenar, mas não podem mudar a injustiça que nossos filhos foram vítimas antes e durante a apuração das responsabilidades pela tragédia e nem vão nos calar” , assegura Paulo, processado por causa de dois artigos publicados no jornal Diário de Santa Maria e uma publicação feita em seu Facebook, com críticas à atuação dos promotores no caso. Nos artigos, Paulo conta que acusou os promotores de corporativismo.

Para ele, os servidores públicos deveriam ter sido denunciados, já que por causa da falta de ação do município a tragédia ocorreu. E lembra que em outros países onde aconteceram tragédias parecidas, funcionários públicos e autoridades foram responsabilizados. Como exemplo ele cita o caso de um incéndio na cidade de Perm, na Rússia, que matou cem pessoas. Lá, segundo ele, todo o comando da cidade foi afastado por omissão. “Aqui no Brasil processam os pais que ousaram contestar os arquivamentos dos processos de agentes públicos”.






 


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