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Estado de Minas CHECAMOS

Reportagem da Globo de 1996 não associa Lula, Dilma e FHC a justiçamentos; vídeo foi manipulado

Reportagem da TV Globo sobre justiçamentos de guerrilheiros na ditadura militar não imputou crimes ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e aos ex-mandatários Dilma Rousseff (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Publicações com essa alegação foram compartilhadas mais de 33 mil vezes desde 2019, voltando a circular em agosto de 2023, mas são baseadas em uma montagem. A reportagem original, veiculada em 1996 no programa Fantástico, foi manipulada para exibir fotos desses políticos em meio a uma entrevista com um ex-guerrilheiro.


16/08/2023 17:14 - atualizado 21/08/2023 07:27
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Reportagem da TV Globo sobre justiçamentos de guerrilheiros na ditadura militar não imputou crimes ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e aos ex-mandatários Dilma Rousseff (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Publicações com essa alegação foram compartilhadas mais de 33 mil vezes desde 2019, voltando a circular em agosto de 2023, mas são baseadas em uma montagem. A reportagem original, veiculada em 1996 no programa Fantástico, foi manipulada para exibir fotos desses políticos em meio a uma entrevista com um ex-guerrilheiro. 

'Esse arquivo dos anos 80 foi 'enterrado' pela Rede Globo a pedido do PT que pagou uma grana para enterrarem. Porém,havia uma cópia que vazou e temos que divulgar a todos os brasileiros e mundo', afirmam usuários no Facebook, no Telegram, no Kwai, no YouTube, no TikTok e no X (antes Twitter). 

O vídeo também foi enviado ao WhatsApp do AFP Checamos, para onde os usuários podem encaminhar conteúdos vistos em redes sociais, se duvidarem de sua veracidade.

Na gravação, de pouco mais de 12 minutos, os apresentadores relatam o que descrevem como 'a face oculta da guerrilha brasileira'

'Acusados de traição, militantes políticos acabavam assassinados pelos próprios companheiros de partido. Eram os chamados justiçamentos, execuções determinadas em julgamentos sumários sem direito à defesa. Um homem que participava nesses tribunais resolve contar essa história. Caso de um passado doloroso, que só agora vem à tona', dizem.

No conteúdo viral, imagens do presidente Lula, dos ex-mandatários Dilma Rousseff e Fernando Henrique Cardoso, e de outras figuras políticas, como Carlos Marighella e o ex-ministro José Dirceu, são exibidas em meio à narração dos casos que teriam acontecido durante a ditadura militar brasileira (1964-1985).

Captura de tela feita em 14 de agosto de 2023 de uma publicação no Facebook
Captura de tela feita em 14 de agosto de 2023 de uma publicação no Facebook

Uma busca por palavras-chave levou ao registro original publicado no g1, portal de notícias da Rede Globo, com o título 'Acervo: reportagem original do Fantástico sobre justiçamentos'. O material, datado de 28 de julho de 1996, tem duração de pouco mais de cinco minutos - menos da metade do registro viral.

A reportagem apresentada pelo jornalista Fernando Molica trata do assassinato de militantes políticos de esquerda por seus pares, os chamados 'justiçamentos'.  O ex-guerrilheiro Carlos Eugênio Sarmento da Paz é entrevistado e afirma que quatro pessoas foram executadas nessas circunstâncias durante a ditadura militar.

Mas, em nenhum momento da gravação original são exibidas as imagens, ou mencionados os nomes de Lula, Dilma, FHC, José Dirceu ou Marighella. O vídeo adulterado também incorpora outros conteúdos que não fazem parte da matéria original.

Grande parte desses trechos tenta associar a ex-presidente Dilma a atos violentos realizados por grupos contrários à ditadura militar, como a ação que resultou na morte do soldado Mario Kozel Filho.

Em 26 de junho de 1968, um veículo carregando um explosivo se chocou contra o Quartel General do 2º Exército, em São Paulo, levando à morte de Kozel Filho e deixando outros cinco feridos. Posteriormente, o atentado foi atribuído à organização Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).

Mas, como o Checamos já mostrou anteriormente, não há registro de que Dilma tenha participado desta ação. Embora tenha atuado como militante contra o regime militar desde 1964, a ex-presidente sempre negou ter participado de ações armadas.

Na gravação falsamente atribuída à reportagem do Fantástico, é exibida uma imagem de Dilma supostamente ao lado de um fuzil, que provaria que ela foi 'mentora' dessa ação.  

Uma busca reversa mostra, no entanto, que a foto foi manipulada. O registro original foi feito em outubro de 1988, quando ela trabalhava como secretária municipal da Fazenda de Porto Alegre e não mostra qualquer tipo de arma ao seu redor.

Comparação feita em 11 de agosto de 2023 de uma publicação no Facebook (E) e a fotografia original no site do UOL
Comparação feita em 11 de agosto de 2023 de uma publicação no Facebook (E) e a fotografia original no site do UOL

A partir de seis minutos, a sequência viral exibe a entrevista de um suposto general russo identificado como 'Major Anatholy Navashki' que supostamente 'conta a verdade sobre 64 e desmascara os comunistas do Brasil'.

Uma busca reversa levou ao vídeo original que mostra, na verdade, uma entrevista com o cientista russo Mikhail Vasilyevich Popov. De acordo com a ferramenta de tradução do Google, na gravação, ele comenta sobre o papel de Vladimir Lenin e Josef Stalin no comunismo mundial. 

O Brasil é citado apenas uma vez, quando o pesquisador fala sobre desenvolvimento industrial e colonialismo. Em nenhum momento, na transcrição da entrevista disponível no site russo, é mencionado o nome de Dilma ou de outros políticos brasileiros.

Este conteúdo também foi verificado pelo Fato ou Fake, projeto de verificação de fatos da Rede Globo, que negou a alegação de que a reportagem teria sido 'enterrada'. 'O vídeo não estava no ar porque, na época, os vídeos do jornalismo da Globo não eram publicados regularmente. A internet comercial no Brasil começou em 1995, e a publicação de vídeos era rara', explicou.

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