(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas WASHINGTON

Os algoritmos, uma ferramenta de governo de dois gumes


30/03/2022 18:07

A tecnologia digital se tornou onipresente e os algoritmos determinam parte das decisões dos governos, mas carregam riscos porque não permitem os processos de transformação necessários nas democracias, estimam analistas.

Os partidos políticos "parecem não ser mais os canais naturais de participação cidadã, sobretudo entre os jovens", que preferem as plataformas online e as redes sociais para se expressarem, afirmou esta semana José Antonio Chang, reitor da Universidade San Martín de Porres (USMP), no Peru.

E estes mundos digitais são controlados por algoritmos. De acordo com o que o usuário faz, diz ou compra, eles processam suas preferências.

Essas tecnologias são "inevitáveis" em um mundo complexo, que não pode ser governado apenas por decretos, boletins oficiais do Estado e ordens, explicou Daniel Innerarity, diretor do Instituto de Governança Democrática, durante a Cátedra das Américas, um fórum da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo tema foi "Política na era digital: Inteligência artificial e democracia".

A relação da sociedade com a internet passou por várias fases: do entusiasmo inicial em que era considerada um canal de democratização às acusações de ser um vetor de manipulação. Agora, mais do que julgar a tecnologia, é preciso definir sua utilidade e compatibilidade com a democracia, avalia Innerarity.

O especialista parte da premissa de que a governança via inteligência artificial tem vantagens, já que os algoritmos oferecem mais neutralidade e medem melhor o impacto das políticas públicas.

Mas há também inconvenientes: os algoritmos nos dizem o que desejamos por ter comprado tal coisa ou expressado uma opinião nas redes sociais, sem refletir.

- Mecanismo banal -

A questão é que a política "é uma reflexão coletiva acerca do que desejamos, não é simplesmente a realização de nossos desejos", adverte Innerarity.

As previsões dos algoritmos se baseiam em nossos comportamentos passados, partindo do pressuposto de que no futuro eles serão semelhantes.

"Isso entra em contradição com uma característica fundamental da política: a possibilidade de mudar certas coisas", explica ele, dando como exemplo que se fosse pelos algoritmos, nunca nos tornaríamos sociedades menos machistas, visto que esse movimento é fruto de uma reflexão.

Não se trata de "um vigilante manipulador, quase conspirador, mas muito mais de um mecanismo banal, o que o faz mais perigoso", diz Innerarity.

E tratar os cidadãos como meros consumidores é outro erro, pois sua opinião sobre que tipo de sociedade querem não é pedida, e em uma democracia, que por definição é o autogoverno do povo, é importante que isso seja feito, acrescenta.

A gestão algorítmica serve "para identificar muitas preferências, mas é muito inadequada para as dimensões do processo político que não são suscetíveis à computação", observa ele.

Isto porque as máquinas são imbatíveis quando dispõem de todos os dados, mas naufragam onde as pessoas se destacam: na tomada de decisões que envolvem ambiguidades e incertezas.

Em 1863, o presidente dos Estados Unidos, Abraham Lincoln, fez seu famoso discurso de Gettysburg em que defendia um "governo do povo, pelo povo e para o povo", um sistema em que os cidadãos sejam titular, sujeito e destinatário.

Agora é necessário definir que nível de vontade popular é expressado na big data, propõe Innerarity.

- A sorte está lançada -

Chang concorda com a importância de se estudar como este desenvolvimento tecnológico, "que é um salto qualitativo na vida do ser humano tão importante quanto a invenção da roda", afeta "nossa concepção de democracia representativa".

Especialmente nas Américas, onde 25% da população entre 10 e 24 anos quer que "as formas da democracia se aproximem dos modos de comunicação compatíveis com os desafios do século XXI".

O secretário-geral da OEA, Luis Almagro, reconheceu que a tecnologia digital aproximou a população "das decisões públicas".

No entanto, alerta que "o empoderamento cidadão" em "muitos casos gerou fragmentação e polarização" e "diminuiu o papel dos meios de comunicação de massa como responsáveis por filtrar o que é verdadeiro e confiável".

De qualquer forma, a sorte está lançada. O futuro será digital.

"Com a invasão russa da Ucrânia, vivemos uma espécie de retrocesso a antigas categorias, de ocupação de espaço, é uma guerra muito analógica", mas "que não nos distrai", afirma Daniel Innerarity.

Os conflitos de hoje em dia, diz ele, "estão se desenrolando no terreno digital", como as questões ambientais, a igualdade de gênero e o futuro do trabalho.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)