Rodrigo Craveiro
Brasília – “Em nossas próprias mãos, em nossas mãos sozinhas, se encontra o destino do povo alemão. Apenas se levantarmos, por meio de nosso próprio trabalho, nossa própria indústria, determinação, ousadia e perseverança. Somente assim nos levantaremos novamente.” O primeiro discurso do austríaco Adolf Hitler, depois de ser empossado chanceler do Terceiro Reich pelo presidente Paul von Hindenburg, em 30 de janeiro de 1933, em nada antecipava a catástrofe que os alemães e o mundo enfrentariam. Em 12 anos de governo, o Führer usou pulso de ferro para liderar um país em guerra e transformou as Schutzstaffel – as SS – em máquina de matar. Sob a ideologia nacional-socialista (ou nazista), seus comandados assassinaram mais de 6 milhões de judeus.
Oito décadas após a chegada de Hitler ao poder e 68 anos depois de seu suicídio, a Alemanha busca acertar as contas com a história. Na semana passada, por duas ocasiões, a chanceler Angela Merkel assumiu a culpa do país pelo nazismo. “Naturalmente, nós temos uma responsabilidade perpétua pelos crimes do nacional-socialismo, pelas vítimas da Segunda Guerra Mundial e, acima de tudo, pelo Holocausto”, comentou, na segunda-feira. “Devemos dizer claramente, geração após geração: com coragem, cada indivíduo pode ajudar a garantir que o racismo e o antissemitismo não tenham chance.” Dois dias depois, durante uma exposição na antiga sede da Gestapo (a polícia secreta nazista), ela acusou as elites e amplos setores da sociedade de participarem da ascensão do Führer.
Em entrevista ao Estado de Minas, três especialistas em nazismo falaram sobre as marcas que Hitler deixou na Alemanha. Para o alemão Dierk Borstel, cientista político da Universidade de Dortmund, o país precisa suportar o fardo do passado, tanto por seu papel na eclosão da Segunda Guerra Mundial, quanto pela singularidade do Holocausto. “Essa responsabilidade tem um grande peso, e não se limita somente à geração imediata dos criminosos nazistas”, comenta. Ele alerta sobre a existência de uma minoria de adeptos da extrema direita que se relacionam com o nacional-socialismo histórico e seu ideário. “Até agora, as suas organizações não chegaram ao Parlamento (Bundestag) ou ao governo. Mais problemáticas são suas ações em cidades, com alguns atos de violência e tentativas de dominação local”, diz.
A sociedade alemã alimentava o antissemitismo e acumulava queixas de problemas socioeconômicos. Não fossem essas configurações, garante Borstel, Hitler dificilmente teria chegado ao poder. Apesar de acreditar que não exista outro líder extremista de direita a caminho, ele admite a existência de um instigante terreno fértil para ações políticas na Alemanha. “Pesquisas da Universidade de Bielefeld constatam que 10% dos alemães têm tendências antissemitas e de extrema direita.”
Sedução Richard Breitman, historiador da American University (em Washington) e coautor de Hitler´s shadow: Nazi war criminals (na tradução, A sombra de Hitler: criminosos de guerra nazistas), explica que o Führer transformou o nacionalismo em chauvinismo. “O antissemitismo tornou-se uma crença de que os judeus representavam um inimigo demoníaco, uma ameaça terrível.” De acordo com ele, alguns alemães foram seduzidos pela habilidade de Hitler em tornar o país próspero. “Os talentos de Hitler foram essenciais para o sucesso do nazismo, como a retórica hábil, a astúcia política, a força de vontade e a determinação de chegar ao máximo”, afirma Breitman.
Batalha de Stalingrado
A cidade de Volgogrado readotou seu antigo nome de Stalingrado por algumas horas ontem, enquanto a Rússia comemorava o 70º aniversário da batalha que mudou os rumos da Segunda Guerra Mundial. A vitória na Batalha de Stalingrado, que durou seis meses e causou a morte de cerca de 2 milhões de pessoas, é símbolo de orgulho nacional, que produziu surtos de sentimento patriótico e, em alguns momentos, nostalgia em relação à era soviética e ao ditador Josef Stalin. O presidente russo Vladimir Putin voou para Volgogrado, conhecida como Stalingrado de 1925 a 1961, para levar uma coroa de flores e se encontrar com veteranos depois de uma parada militar liderada por soldados em uniformes da Segunda Guerra Mundial e com a presença de um tanque T-34, da época do conflito. Depois da batalha de Stalingrado, tropas soviéticas avançaram a oeste em direção a Berlim, tomando a capital alemã 27 meses depois.