A França se prepara para relembrar o 50º aniversário da morte de Edith Piaf, em outubro de 1963, com uma enxurrada de filmes, shows e livros, incluindo uma biografia que se propõe a desfazer alguns dos mitos que cercam a vida deste "mito francês".
Sempre se diz que Piaf nasceu sob um poste de luz, em uma rua do bairro de Belleville, em Paris. Mas isso não é verdade, de acordo com o livro "Piaf, um mito francês", publicado pela editora Fayard.
A cantora de voz fenomenal nasceu em 19 de dezembro de 1915, no hospital Tenon, localizado no 20º distrito de Paris, informa a biografia, escrita por Robert Belleret, jornalista do jornal Le Monde, que fez uma investigação minuciosa.
Belleret se baseou principalmente em uma centena de cartas enviadas por Piaf a seu confidente, Jacques Bourgeat, que até agora não haviam sido publicadas.
O autor também descobriu centenas de arquivos, o que permitiu que ele esclarecesse muitas das mentiras e meias-verdades em torno da vida turbulenta da diva, filha de um acrobata e uma cantora de rua.
"Por que se enfeitou, se exagerou ou se inventou tanto sobre Piaf?", pergunta-se Belleret no prefácio de seu livro, de 700 páginas, que investiga o nascimento, a infância e a vida amorosa da cantora, além de alguns episódios obscuros da trajetória de Piaf, como sua atitude durante a ocupação de Paris pelas tropas nazistas.
"Tratam-se de verdades e meias-verdades que foram transmitidas por seus parentes, mas que Piaf também ajudava a circular para autoalimentar o mito", destaca Belleret.
"Piaf mentia muito sobre sua vida, a começar pelo seu próprio nascimento", escreve Belleret, que também é o autor de uma excelente biografia do cantor Léo Ferré.
O livro refuta as alegações de Piaf de que ela deu documentos de identificação falsos para prisioneiros franceses, durante duas apresentações que ela dizia ter sido obrigada a fazer na Alemanha nazista.
"Piaf levou uma vida de extravagâncias durante a guerra", assinala o escritor, que também fez um relato detalhado dos amores desta "Don Juan feminina".
A cantora de voz marcante foi uma "sedutora insaciável, uma destruídora de lares que multiplicava suas conquistas", como Marcel Cerdan, Yves Montand, Georges Moustaki e Eddie Constantine, diz.
Apesar de não esconder seus lados obscuros (seus caprichos, seus vícios, sua mesquinhez), a biografia não compromete em nada o mito, destacando o talento imensurável da artista, sua vontade de trabalhar, sua energia, seu magnetismo no palco, seu carisma e sua tenacidade.
Belleret enfatiza também o extraordinário dom de Piaf para a escrita, o que a levou a compor cerca de 90 músicas, que correram o mundo, como "La Vie en Rose" ("A vida cor de rosa") e Hymne à l'Amour ("O Hino ao Amor").
A artista e compositora lendária - cuja dimensão internacional foi consolidada pelo filme "Piaf" (2007), que garantiu um Oscar à sua intérprete, Marion Cotillard - será relembrada em outubro na França e em Nova York, cidade-fetiche da artista, que lhe oferecerá um tributo.
Piaf, que morreu em 1963, aos 47 anos, depois de uma vida atormentada mas cheia de amor, paixão e homenagens, continua a ser a cantora mais amada na França.