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Estado de Minas TRABALHO ESCRAVO

Produtor de café em Minas é autuado por trabalho análogo à escravidão

O proprietário das Fazendas Klem, Cesar Viana Klem, afirmou que a propriedade dos fazendeiros havia sido 'invadida'


14/03/2023 12:00 - atualizado 14/03/2023 16:21

Imagem de uma plantação de café
Além disso, o dono da Fazendas Klem disse que foi criada uma narrativa de 'trabalho análogo à escravidão' (foto: Foto: Seapa/Divulgação)
Os pacotes de café chamam a atenção pela beleza nos sites em que são vendidos na internet. Os nomes dos produtos incluem palavras como "gourmet", "premium" e "especial". O preço é bem mais alto que o de marcas encontradas em qualquer supermercado, chegando a R$ 112 o quilo. Por trás de tudo isso, porém, trabalho análogo ao escravo, aponta o MTE (Ministério do Trabalho e Emprego). 

 

Uma fiscalização do Gmóvel (Grupo Especial de Fiscalização Móvel) do ministério resgatou na última colheita de café em Minas Gerais, em julho do ano passado, sete trabalhadores - três mulheres e quatro homens - em condições análogas ao escravo em uma propriedade da empresa Fazendas Klem Importação e Exportação de Cafés em Manhumirim, na Zona da Mata, em Minas Gerais. 

 

A reportagem entrou em contato com a Fazendas Klem por telefone e recebeu pedido para que fosse enviado um e-mail com as perguntas sobre a fiscalização do MTE na propriedade. A mensagem foi enviada na segunda (13) às 15h59, mas não houve resposta até as 12h desta terça. 

 

Durante audiência no Ministério do Trabalho e Emprego na regional da pasta em Manhuaçu, depois do resgate dos trabalhadores, o proprietário das Fazendas Klem, Cesar Viana Klem, que em uma rede social se apresentava como "terrivelmente cristão", fez todos os pagamentos devidos aos trabalhadores resgatados, que retornaram para a Bahia. 

 

Em publicação no último dia 7, porém, ao comentar a prisão do líder da FNL (Frente Nacional de Lutas Campo e Cidades), José Rainha, no Pontal do Paranapanema, o dono da Fazendas Klem escreveu o seguinte texto: "Nós tivemos nossa propriedade 'invadida' por 'supostos trabalhadores', que criaram uma narrativa de 'trabalho análogo a escravo' que está nos levando à falência. Se nada for feito no sentido de auxiliar o agricultor, essa esquerda vai destruir o agronegócio brasileiro". 

 

A Fazendas Klem estava dentro de um seleto grupo de produtores de café no Brasil que ostenta o selo Rainforest Alliance, uma ONG (Organização Não Governamental) com atuação em todo o mundo que atesta a sustentabilidade de produtores agrícolas. 

 

O site da organização afirma que seu selo "significa que o produto (ou um ingrediente específico) foi produzido por agricultores, silvicultores, e/ou empresas trabalhando em conjunto para criar um mundo onde as pessoas e a natureza prosperam em harmonia".

A Rainforest Alliance informou que a empresa Fazendas Klein não conta mais com a certificação. 

 

Depoimentos dos sete trabalhadores e trabalhadoras aos fiscais do GMóvel, aos quais a Folha de S.Paulo teve acesso, mostram a situação precária pela qual passaram na propriedade. Todos são de Caetanos, região centro-sul da Bahia. O grupo chegou a Manhumirim na madrugada do dia 20 de junho de 2022, depois de desembarcarem em Realeza, distrito da cidade vizinha de Manhuaçu.

  

Um carro da fazenda, conforme relataram, os buscou em Realeza, distrito da cidade vizinha de Manhuaçu, a 774 quilômetros de Caetanos. Nos depoimentos, os trabalhadores afirmam que a decisão de partirem para Manhumirim ocorreu depois de um vídeo que circulou entre os trabalhadores rurais do município mostrando uma fazenda com muitos pés de café por serem colhidos. 

 

A propriedade seria essa para a qual se dirigiram. No entanto, ao chegarem, notaram que não havia tanto café pronto para ser colhido. Um dos trabalhadores rurais disse ter acertado a ida para a fazenda com um homem que se apresentou como Gimaílson "a mando das Fazendas Klem", como afirmou aos fiscais. Uma das perguntas feitas no e-mail enviado à Fazendas Klem foi sobre qual a função do homem citado pelos trabalhadores na propriedade. 

 

Outro lavrador resgatado disse que a fazenda mostrada era em área plana, ao contrário daquela para a qual se dirigiram, que ficava em terreno íngreme. O relatório dos fiscais do GMóvel fala, a partir dos depoimentos e da fiscalização feita na propriedade, em banheiro sem descarga, esgoto correndo a céu aberto próximo à casa em que foram colocados, não fornecimento de ferramentas, material de proteção e de abrigo para alimentação quando estavam na lavoura. 

 

"Os trabalhadores residiam em alojamento precário na própria fazenda, com portas com rachaduras, sem estar totalmente forrado e janelas vulneráveis, instalações sanitárias em condições precárias, sem papel higiênico e material de enxugo", aponta o relatório da fiscalização, feito com base nos depoimentos e nas vistorias que fizeram na fazenda. 

 

"A moradia estava completamente suja; não eram fornecidas roupas de cama, não havia local para tomada de refeições, lavanderia para higienização das roupas e objetos de uso pessoal. As refeições preparadas pelos próprios trabalhadores eram realizadas no alojamento que não possuía condições de conservação, asseio, higiene e segurança", aponta ainda, o relatório.

 

  

Os fiscais apuraram ainda que os trabalhadores não passaram por exame médico admissional e que no período entre o início do trabalho dos lavradores na fazenda, em 21 de junho, e 6 de julho, dia do início da fiscalização, não houve pagamento de salários.

  

O coordenador nacional do Gmóvel do Ministério do Trabalho e Emprego, Maurício Krepsky, afirma que, pelas regras de atuação do grupo, não é permitido revelar de que forma a denúncia contra a Fazendas Klem chegou ao ministério. "O grupo atua a partir de denúncias e também por fiscalizações feitas sem qualquer anúncio prévio", diz. 

 

"A situação dos trabalhadores era completamente negligenciada", afirma o coordenador nacional do grupo. Por conta das condições em que os sete trabalhadores e trabalhadoras foram encontrados, as Fazendas Klem foram multadas em R$ 13 mil por lavrador resgatado.

 

Houve, ao todo, 15 autos de infração, cada um com multa que pode variar de R$ 400 a R$ 20 mil, conforme Krepsky. 

 

Situação semelhante à dos lavradores em Manhumirim voltou a ocorrer esse ano, no Rio Grande do Sul. Trabalhadores em condição análoga ao escravo foram resgatados também em vinícolas do estado.


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