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Estado de Minas SAÚDE

Paralisia infantil: baixa cobertura vacinal ameaça trazer doença de volta

Em Minas Gerais, 650 mil crianças ainda estão sem proteção contra a poliomielite, que pode deixar sequelas e até matar


30/08/2022 04:00 - atualizado 30/08/2022 06:32

 Centro de Saúde Oswaldo Cruz
Movimento no Centro de Saúde Oswaldo Cruz: até o momento, somente 34,33% das crianças esperadas foram vacinadas (foto: Fotos: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)

Menos de 30% do total de 1 milhão de crianças aguardadas para se vacinarem contra a poliomielite em Minas Gerais recebeu o imunizante. Quase um mês após o início da campanha de vacinação contra a doença, pouco mais de 350 mil crianças foram imunizadas, o que representa 34,33% do público-alvo, conforme dados da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG). Sem a adesão mínima, esperada em 95%, o estado entra em uma posição vulnerável. Apesar de a iniciativa seguir até 9 de setembro, uma das grandes preocupações de especialistas é o retorno da do- ença, erradicada há quase 30 anos no Brasil, especialmente porque no início do ano a cobertura vacinal não atingiu nem 80%. A pólio é uma doença grave, que pode levar à paralisia de membros e à morte.

Em Belo Horizonte, esse percentual é ainda menor. Até o momento, a cobertura vacinal está em 20,67% do público-alvo, estimado em 104 mil crianças. Segundo a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), já foram vacinadas mais de 21 mil crianças, com idades entre 1 a 4 anos. No fim de fevereiro deste ano, o Estado de Minas mostrou que no período de pandemia da COVID-19 a cobertura vacinal contra outras doenças caiu. Até então, Minas Gerais havia registrado cobertura vacinal contra a poliomielite de 73,7% para menores de um ano, de 66,38% para crianças de 15 meses, e de 59,67% para crianças com 4 anos.

A rotina nos postos de saúde escancara a baixa adesão à vacina. Na manhã de ontem (29/8), a reportagem do Estado de Minas percorreu centros de saúde da capital e constatou o movimento fraco. A enfermeira Renata Antônia Silva Carvalho, de 35 anos, que levou a filha Maria Manuela para vacinar no Centro de Saúde Oswaldo Cruz, no Barro Preto, Região Centro-Sul de BH, diz que até estranhou ao ver o unidade praticamente vazia. “Esperava ver outros pais, mas, pelo menos no horário em que vim, não vi outras pessoas procurando pela vacina. É o único meio que a gente tem de prevenção. Como mãe e profissional da saúde, vejo uma grande importância na vacinação, principalmente pelo risco de voltar uma doença que já foi erradicada e oferece grande risco para a vida das nossas crianças”, relata.

Maria Manuela completou 7 meses e já estava na hora de tomar mais uma dose da vacina. “Ela só não tomou antes porque pegou uma gripe e o médico recomendou esperar. Assim que ele a liberou, já a trouxemos para vacinar.” O esquema vacinal contra a poliomielite inclui as três primeiras doses aos 2, 4 e 6 meses de idade, por injeção. As famosas gotinhas (vacina oral bivalente) fazem parte da caderneta de reforço da proteção, administrada quando a criança completa 1 ano e 3 meses (15 meses) e, depois, aos 4 anos. Tranquila, a pequena Maria Manuela não demonstrou medo em tomar a vacina. “Tentamos levar a vacinação com mais tranquilidade e não reforçar associações negativas como ‘se não tomar banho, vai tomar injeção’, como era muito comum na nossa infância”, diz.

Renata com a filha Maria Manuela
Renata levou a filha Maria Manuela para tomar o imunizante e frisou: %u201CA pólio oferece grande risco para a vida das nossas crianças%u201D

ALERTA 

A doença, que afeta especialmente crianças de até 5 anos, está erradicada há quase três décadas no Brasil. Hoje, as imagens de crianças em cadeiras de rodas ou com deformidades no corpo, uma das consequências da poliomielite, parecem apenas um fantasma do passado, mas, segundo especialistas, a baixa cobertura vacinal reacende o sinal de alerta. “A doença existe, só não está próxima de nós agora. Já foi registrado um caso nos Estados Unidos. Ela vai voltar a aparecer aqui também se a gente não vacinar. É uma doença realmente muito grave, que continua nos assombrando”, afirma o infectologista Alexandre Sampaio, professor da Faculdade Santa Casa BH.

O último ano em que a cobertura no país atingiu a meta indicada para o controle da doença (95%) foi em 2015. De lá pra cá, a porcentagem de crianças vacinadas no Brasil caiu consideravelmente. No ano passado, por exemplo, a imunização contra a doença foi de apenas 67,1%. Para manter as crianças livres da doença é preciso atingir a meta de vacinação, que é de 95%, e isso não vem acontecendo já tem alguns anos. Se não tivermos uma boa cobertura, não dá para evitar a circulação”, aponta o infectologista. Em Minas Gerais, o último registro de poliomielite é de 1985. Desde aquele ano, a vacina contra a paralisia infantil tem sido a única forma de prevenção. Justamente para manter a cobertura vacinal, a imunização contra pólio faz parte do calendário de rotina do Programa Nacional de Imunizações (PNI), de forma gratuita e de ampla disponibilidade nas unidades básicas de saúde (UBS) em qualquer época do ano.

Na avaliação de Sampaio, as campanhas antivacinas, movimento que ganhou ainda mais força durante a pandemia de COVID-19, podem ter ajudado a diminuir a adesão das pessoas, porém essa não é a principal explicação para o quadro atual. Segundo ele, a falta divulgação é o que mais tem afastado as pessoas dos postos de saúde. “Vivenciamos um aumento desse movimento, mas não acho que só o sentimento antivacina justifique esse cenário. Os brasileiros sempre foram muito receptivos à vacinação e isso se deve às campanhas. A divulgação está aquém do que foi em anos anteriores. Falta engajamento comunitário e isso se consegue pela comunicação”, analisa. O infectologista avalia que é necessário intensificar a campanha e tentar ampliar mais ainda o acesso. “Levar a vacinação para as escolas, shoppings”, disse.

GRAVIDADE 

A baixa cobertura vacinal aumenta o risco de reintrodução de doenças que já haviam sido consideradas erradicadas, como foi o caso do sarampo, que não registrava casos no Brasil desde 2016. "É decepcionante termos avançado no controle dessas doenças imunopreveníveis, que são muitas, e perceber retrocesso nos últimos anos. São vacinas muito seguras. A vacinação deve ser um compromisso de todos, dos pais, dos profissionais de saúde, dos gestores públicos, de toda a sociedade”, ressalta. A poliomielite é uma doença contagiosa que, por meio do contato direto com fezes ou com secreções eliminadas pela boca de pessoas infectadas, pode contaminar crianças e adultos. Nos casos mais graves, acontecem as paralisias musculares, e os membros inferiores são os mais atingidos. “As sequelas da poliomielite normalmente são motoras e não têm cura”, explica.

Paralelamente à vacinação contra a poliomielite, está sendo realizada a campanha de multivacinação. O foco dessa campanha é recuperar a cobertura vacinal de crianças e adolescentes que ainda não receberam os imunizantes previstos no calendário nacional. Não há meta definida pelo governo federal para a Campanha Nacional de Multivacinação. Até agora, já foram aplicadas mais de 91 mil doses em todo estado, conforme dados preliminares da SES-MG. Entre as vacinas disponibilizadas na campanha estão hepatites A e B, tríplice viral e tetraviral, febre amarela e pneumonia, meningite e otite.

A campanha vai até 9 de setembro. Segundo a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), as vacinas estão disponíveis em todos os 152 centros de saúde do município. O endereço das unidades e os horários de funcionamento devem ser verificados no portal da prefeitura. As crianças devem comparecer aos pontos de vacinação acompanhadas dos pais ou responsáveis legais e apresentar, preferencialmente, o documento de identificação com foto ou certidão de nascimento, CPF, comprovante de endereço e o cartão de vacina.


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