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Estado de Minas SEGURANÇA PÚBLICA

Interdição do Ceresp Gameleira reabre discussão sobre encarceramento

Decisão de revogação da suspensão do Ceresp Gameleira na recepção de presos coloca em xeque o sistema carcerário em Minas


28/08/2022 17:15 - atualizado 28/08/2022 18:00
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Depois de cinco dias de suspensão, Ceresp Gameleira retoma a recepção de presos do sistema penitenciário (foto: Gladyston Rodrigues/EM - DA Press - Belo Horizonte/MG)

Após interdição, na terça-feira (23,) do Centro de Remanejamento do Sistema Penitenciário, Ceresp- Gameleira, região Oeste de BH, que é porta de entrada do sistema na região metropolitana, houve risco de aglomeração de pessoas presas em flagrante, em prisão preventiva em aberto, alocados em delegacias e locais inadequados quanto à  recepção, como ônibus, viaturas, celas transitórias.

A situação viola a integridade física, mental e psicológica por estarem em locais inadequados para cumprimento de prisão provisória ou de pena já estabelecida. A observação é do presidente da Comissão de Assuntos Penitenciários da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Minas Gerais (OAB-MG), Maikon Vilaça.

A determinação do juiz Daniel Dourado Pacheco de interditar o Ceresp foi motivada por "descumprimentos do governo do Estado e a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) da transferência, em até cinco dias, 373 detentos." Segundo o magistrado, a cadeia apresentava precariedade das instalações estruturais da unidade, assim como superlotação e pela falta de serviços básicos, como atendimentos médicos, odontológicos e limpeza de celas.
 
A decisão foi revogada nesse sábado (27/8) pelo desembargador Catta Preta, após solicitação feita pelo governo estadual, por meio de mandado de segurança com pedido de liminar. A decisão cita previsão da Polícia Civil de que, somente no final de semana, em torno de 250 apreendidos ficassem sem local ideal para acautelamento e provocar até mesmo a soltura de presos em flagrante. 
 
Atualmente, a unidade tem aproximadamente 1.100 pessoas, mas a Justiça já havia determinado que o máximo permitido era 727. O representante da OAB-MG defende que se retome uma conversa institucional para repensar o sistema penitenciário.

No período de restrições ocasionados pela pandemia, com riscos de alta proliferação e contaminação, o Ceresp, deveria manter, no máximo por 30 dias, a pessoa encaminhada para triagem e recambia-lo para alguma unidade prisional. Após a flexibilização, o prazo foi se alargando e há casos que ultrapassam os 70 dias, uma vez que o sistema prisional encontra-se superlotado, observa Maikon Vilaça.
 
"Não discutimos e não queremos impunidade, mas as políticas públicas não cumpridas vêm recaindo no sistema penitenciário. Há aumento de pessoas privadas de liberdade, de acautelados e a mão de obra carcerária não tem a mesma proporção geométrica, não considera aqueles afastados, licenciados, em férias ou no sistema administrativo. Uma produção de mão de obra suficiente para cuidar do sistema. Quando falo de políticas públicas, posso citar a lei de drogas, que  não diferencia traficante, do aviãozinho (aquele que vende pequenas quantidades), que fica lá até dois anos aguardando um processo, primário, e que ao final, a sentença é em regime aberto é menor que o tempo encarcerado. É uma incongruência no sistema. Devem ser corrigidas com o tempo e ter razoabilidade do sistema em geral. A prisão por sí não recupera e os números evidenciam essa necessidade de métodos alternativos de recuperação, como prestação de serviços à comunidade ou retorno pecuniário", defende o presidente da comissão da Ordem.
 
Em 2015, o Estado apresentou uma proposta à Justiça para que o Ceresp acolhesse, durante um ano, 808 presos, passando a ocupação máxima para 727 em um ano. Só que a unidade continuou apresentando superlotação, dobrando o limite de sua capacidade.
 
A Justiça afirma que o Ceresp Gameleira vem apresentando quadro frequente de superlotação e movimentação carcerária. Em documento, detalha condições precárias no interior da unidade, como carência de estrutura física, de atendimento psicossocial, de atendimento médico e odontológico, de distribuição de kits de higiene, da limpeza interna dos corredores e celas, e do sistema de prevenção e combate a incêndio. 
 
Mãe de um rapaz privado de liberdade, que não quer se identificar por temer represálias contra a família e o filho, conta que ele foi preso suspeito de golpes com cartões de crédito. Mesmo sem ser ouvido por autoridade judicial, ficou "74 dias no Ceresp, em uma cela com outros 33 detidos, sem kit de higiene, sem atendimento médico ou psicológico. Vários colegas de cela apresentando tosse contínua, e, como ele, não haviam passado por qualquer consulta médica ou de outro profissional de saúde. Sem banho de sol." Ele foi transferido recentemente para unidade prisional do estado, mas ainda não foi ouvido pela justiça.

Presos sem julgamento ou com direito a progressão 

Miriam Estefânia dos Santos, presidenta da Associação de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade e do Comitê Nacional de Prevenção e  Combate à Tortura, critica a falta de ações concretas para se evitar a superlotação. "É uma discussão que se arrasta há anos, uma situação que não se resolve e vem se tornando uma bola de neve. Não adianta interditar uma unidade e superlotar outra. Há uma política sistêmica de encarceramento no Brasil. Temos inúmeros casos de pessoas dentro do sistema que  sequer foram julgadas e poderiam estar em liberdade provisória. Alguns ficam até três anos e quando julgados são absolvidos, outros poderiam estar na rua, devido ao direito de progressão de regime. Temos casos de assistidos que estão no regime semi-aberto, com direito a estudo ou trabalho para progredir mais rápido para o aberto, desafogando o sistema, mas há uma burocracia que só permite o trabalho em regime de parceria com o estado."
 
Dados do Tribunal de Justiça (TJMG) apontam que próximo a 30% dos presos no estado de Minas Gerais são provisórios. De acordo com a Galvao&Silva Advocacia "a prisão provisória é uma das espécies de instrumentos jurídicos penais mais controversas do ramo do Direito Penal brasileiro. Isso ocorre porque trata de espécies de prisão que não exigem uma condenação definitiva para que possam ocorrer, o que a determina como uma medida excepcional."
 
Até o mês de julho 74.274 presos tinham processos no TJMG, sendo 52.626 (70,87%) já sentenciados e 21.658 (29,13%) em execução, aguardando decisão. Segundo o Conselho Nacional de Justiça, os principais motivos pelo encarceramento em Minas Gerais são por roubo simples e ou majorado (22,36%), tráfico de drogas (19,47%), furto simples ou qualificado (7,99%) e homicídio simples, privilegiado e ou qualificado (6,74%).
 
O Tribunal de Justiça não contabiliza presos que não pagam pensão alimentícia, presos militares cujos processos são de competência da Justiça Militar e da Justiça Federal. Em nota, a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública ( Sejusp) informou que "o Centro de Remanejamento Provisório de Belo Horizonte (Ceresp Gameleira) foi liberado para voltar a receber presos, a partir de uma decisão liminar concedida pela Justiça na noite desse sábado (27/8). 

O desembargador da Vara de Execução Penal de Belo Horizonte deferiu o mandado de segurança impetrado pelo Estado e cassou a decisão da 1ª Instância, que havia interditado parcialmente o local, interdição considerada inexequível na liminar. Dessa forma, restabelece-se o fluxo de recebimento de presos na unidade, classificada como porta de entrada do sistema penitenciário da região metropolitana de Belo Horizonte."


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