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Estado de Minas BATALHA DA PSIQUIATRIA

Até OAB entra no debate que polariza saúde mental na capital e no estado

Enquanto seção mineira da Ordem vê politização na polêmica sobre a internação na psiquiatria, necessidade de reforçar equipes dos Cersams é raro consenso


01/03/2022 04:00 - atualizado 01/03/2022 07:28

Ilustração mostra fios enrolados nos cérebro
(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
No debate polarizado sobre modelos de atendimento em saúde mental em Minas e em Belo Horizonte, que chegou até mesmo a ser judicializado recentemente, como mostrou o Estado de Minas em sua edição de ontem, os dois lados concordam em ao menos um ponto: a estrutura precisa ser reforçada.

Tanto os que defendem os hospitais psiquiátricos – e a reabertura do Galba Veloso, equipamento desativado pelo governo do estado – como essenciais no tratamento de crises graves e gravíssimas quanto os que comungam  com os preceitos da luta antimanicomial apontam a necessidade de contratação de efetivos para os Centros de Referência em  Saúde Mental (Cersams) e outros equipamentos da área. Nos bastidores, instituições e autoridades buscam uma saída. Prefeitura de Belo Horizonte, por exemplo, debate a questão com o Sindicato dos Médicos de Minas Gerais (Sinmed).
Para o diretor do Sinmed André Christiano dos Santos, médico da família da prefeitura, esse tipo de diálogo faz falta ao debate. Para isso, a categoria ouviu médicos ligados à saúde mental e levantou uma pauta com 22 pontos a serem discutidos com a prefeitura.

“Os médicos apontaram que há uma falta grave de psiquiatras dentro da rede. A prefeitura vem tendo dificuldades na contratação desse profissional, que é um vínculo mais precário (quando admitido sem concurso)”, explica André. A reunião ocorreu no fim do ano passado. Na ocasião, foi elaborada pauta e montada uma comissão com psiquiatras dos diversos serviços da rede e representantes do Sinmed. 
 
“Fomos recebidos pela Gerência de Saúde Mental do município e outros representantes da Secretaria Municipal de Saúde.  Reconheceram o problema e afirmaram que estavam com dificuldades para contratar psiquiatras e que pretendiam reduzir o défcit por meio de concurso público. Cobramos um redimensionamento das equipes de saúde mental do município, pois, na nossa avaliação, a quantidade de profissionais na equipe era insuficiente para atender adequadamente à demanda”, afirmou.

Segundo o sindicalista, a prefeitura informou que estava em andamento um estudo para o redimensionamento das equipes, que ficaria pronto em breve.

Quanto ao concurso público, havia a expectativa de que o resultado fosse homologado em janeiro e que os aprovados começassem a ser chamados ainda em fevereiro. “Isso não ocorreu. Infelizmente, a situação continua grave como antes, principalmente pela falta de psiquiatras na rede. O valor pago pela prefeitura é muito menor do que é oferecido na rede privada e também nas cidades vizinhas, sendo que os profissionais aqui formados não continuam na rede de BH, preferindo outros serviços”, acrescentou. 

A subsecretária de atenção à saúde da Prefeitura de BH, Taciana Malheiros, afirmou que a “abertura de diálogo é uma diretriz” da administração municipal. “Vamos avaliar algumas questões A primeira é a readequação da força de trabalho, o quantitativo de profissionais. Ampliação do profissional médico em alguns Cersams e de outras categorias (farmacêutico, psicólogo e enfermeiros). Há previsão de homologação (dos aprovados no concurso), com até 10 psiquiatras”, disse. De acordo com ela, até lá a prefeitura vai continuar contratando profissionais para a saúde mental por meio do cadastro no banco de currículos.

Diálogo

Na semana passada, a Secretaria Municipal de Saúde informou que mantém diálogo constante com o sindicato, estando sempre à disposição para esclarecimentos. “A homologação do concurso está prevista para o mês de março. Essa alteração na data deve-se à falha no processo por parte da empresa que realizou o concurso e a Secretaria Municipal de Saúde já adotou todas as medidas administrativas cabíveis”, disse em nota. 

Também na tentativa de encontrar um caminho, a Comissão de Saúde Mental da seção mineira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG) chegou a expedir uma nota, no ano passado, para apoiar o retorno dos hospitais psiquiátricos. A OAB entende que eles devem coexistir com os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), a versão estadual do Cersam.

“Quanto a essa polarização, o que venho percebendo é que ela é muito mais ideológica e partidária do que científica. Quando se pensa em termos de legislação, se pegamos a lei que regula a saúde mental no Brasil (Lei 10.216/2001), ela é clara ao estabelecer que o paciente tem direito ao melhor tratamento. Se você não entende que o paciente psiquiátrico pode apresentar diferentes níveis, você discrimina o paciente”, diz Luciana Garcia, advogada e ex-presidente da comissão desde sua criação, em 2019. A Comissão de Saúde Mental foi extinta em 31 de dezembro de 2021. “A administração pública não quis nem conversar.  Essas discussões viriam para somar. Todo mundo quer lutar por uma saúde mental boa para as pessoas”, diz.  (Com Larissa Ricci)

Modelos em debate

Na primeira reportagem da série, “A batalha da psiquiatria”, publicada na edição de ontem, o Estado de Minas mostrou argumentos opostos na discussão sobre o modelo de saúde mental adotado no estado e em Belo Horizonte. De um lado, profissionais e entidades que se opõem ao fechamento do Galba Veloso apostam nos hospitais psiquiátricos para atendimento de crises graves e gravíssimas e apontam “falhas” no esquema dos Centros de Referência em Saúde Mental (Cersams) da capital mineira, entre elas a falta de psiquiatras nos plantões noturnos e a não submissão às normas de segurança exigidas das instituições hospitalares. Do outro, grupo a favor da luta antimanicomial aposta no tratamento ao paciente em liberdade, na Rede de Atenção Psicossocial, para os quais uma reabertura do Galba seria “um retrocesso” e as redes de saúde mental de BH e Minas têm plenas condições de prestar o atendimento em todos os momentos do paciente de sofrimento mental.
 

POR DENTRO DO SERVIÇO


A Rede de Atenção Psicossocial de BH (Raps-BH) conta hoje com 16 Centros de Atenção à Saúde Mental (Cersam). São oito dedicados a pessoas com sofrimento mental, três infantojuvenis e cinco para pessoas com problemas com álcool e/ou drogas. Ainda integram a rede 34 residências terapêuticas, oito equipes de Consultório na Rua e duas Unidades de Acolhimento Transitório Adulto e Infantojuvenil, além de nove Centros de Convivência e o complexo de atenção primária nos 152 centros de saúde, que têm equipes de saúde mental.

“A rede está presente no município há 28 anos, desde 1993, quando o primeiro equipamento se instalou no Barreiro. Ao longo do tempo, ela vem sendo cada vez mais qualificada. O Cersam segue normativas do Ministério da Saúde. Os profissionais estão preparados para acolher e tratar pacientes em crise, em urgência”, diz a subsecretária Taciana Malheiros, da PBH, em posição diferente da defendida pelo Conse -lho Regional de Medicina (CRM) – que denunciou falta de psiquitras no plantão noturno, entre outras “irregularidades”, e pela OAB.

Quanto à alegação do CRM sobre a ausência de psiquiatras à noite nos Cersams, Taciana afirma que o atendimento após o horário comercial é feito pelo Serviço de Urgência Psiquiátrica (SUP) e pelo Centro para Álcool e Outras Drogas, do Bairro Manacás. O primeiro atende às regiões Centro-Sul, Nordeste, Venda Nova e Norte, e o segundo, à Pampulha, Noroeste, Barreiro e Oeste.

“A gente trabalha com a hospitalidade noturna quando o paciente precisa de um cuidado mais extenso. Médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem acompanham essas pessoas por meio da corrida de leitos (atendimento de maneira itinerante)”, afirma Taciana.

Os Cersams funcionam 24 horas, todos os dias. Durante o dia, das 7h às 19h, as unidades acolhem usuários de forma espontânea, sem limitação de vagas, além de acompanhar os já inscritos nos serviços em modalidades de Permanência Dia, Hospitalidade Noturna, ambulatório, atividades coletivas e outras ações.

Das 19h às 7h, os serviços contam com duas equipes de retaguarda noturna que dão suporte a todos os Cersams do município, e em sua totalidade têm 96 vagas para adultos e nove para o público infantojuvenil, na modalidade de tratamento em Hospitalidade Noturna. Há ainda 10 leitos em saúde mental no Hospital Metropolitano Doutor Célio de Castro para usuários dos Cersams com necessidades de cuidados clínicos e psíquicos intensivos.

A POSIÇÃO DO ESTADO

Em nota, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) informou que o fechamento do Hospital Galba Veloso aconteceu “emergencialmente, como retaguarda de leitos clínicos não COVID” para a rede SUS-BH. De acordo com o estado, os usuários do Galba foram transferidos para o Instituto Raul Soares, também ligado à Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig).

A SES-MG informa que “tem atuado na perspectiva de qualificação da assistência em saúde mental e ampliação de serviços”, seguindo as diretrizes do SUS, assim como argumenta a Prefeitura de BH. Conforme a pasta, essas normas preconizam “a territorialização, oferta de cuidado de acordo com a necessidade do usuário e manutenção e fortalecimento dos vínculos familiares”.

Há 549 leitos de saúde mental em hospital geral e 564 leitos em hospital psiquiátrico no estado atualmente. Das vagas em hospital geral, 395 são habilitadas pelo Ministério da Saúde e 154 financiadas pelo estado.


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