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Estado de Minas ENTREVISTA

Jackson Machado Pinto: 'Estamos preparados para o pior cenário possível'

Líder do Comitê de Enfrentamento à Pandemia de COVID-19 em BH, montado a pedido de Kalil, Jackson convidou três infectologistas para fazerem parte do grupo


09/01/2022 04:00 - atualizado 09/01/2022 07:17

Médico, Secretário de Saúde de Belo Horizonte
Jackson Machado (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press - 18/6/21)

Nos últimos dois anos, a Saúde precisou enfrentar obstáculos que antes eram inimagináveis. A chegada do novo coronavírus desafiou autoridades e obrigou à tomada de decisões que impactaram a sociedade. Em Belo Horizonte, quem chefiou a secretaria durante a pandemia foi Jackson Machado Pinto, que carrega consigo dois princípios para a chegada do novo ano: proteção e esperança.

 

Jackson é doutor em medicina, especialista e mestre em dermatologia. Por três mandatos, que duraram até 2010, Jackson também foi vice-presidente da Sociedade Brasileira de Dermatologia/Regional Minas Gerais. A contribuição para a saúde pública não começou em 2016, com o convite do prefeito Alexandre Kalil (PSD) – de quem ele já revelou ser um “amigo pessoal”. O dermatologista já havia atuado na Secretaria de Estado de Saúde como coordenador do Programa de Doenças Sexualmente Transmissíveis, em meados dos anos 1980.

 

Líder do Comitê de Enfrentamento à Pandemia de COVID-19 em BH, montado a pedido de Kalil, Jackson convidou três infectologistas para fazerem parte do grupo que traça as estratégias de controle da doença respiratória na capital. Em entrevista ao Estado de Minas, o secretário de Saúde confidencia as maiores dificuldades em comandar a principal pasta durante a pandemia e analisa as perspectivas para o ano de 2022 com a chegada de uma nova variante – a Ômicron –, o surto de gripe e a possibilidade de haver carnaval em fevereiro.

 

 

Em 2020, enfrentamos o início de uma pandemia que desafiou a população e as autoridades sanitárias. Em 2021, o cenário começou a melhorar a partir do avanço da vacinação. Olhando para trás, quais foram os maiores desafios da gestão de saúde em BH nesses dois anos de pandemia?

Essa é uma pergunta muito cruel. Os desafios foram muitos. Talvez o principal deles seja o desconhecimento sobre a doença, porque foi um vírus novo, não sabíamos como ia afetar as pessoas. Aprendemos, por exemplo, com o que aconteceu em Milão, que abriu a cidade precocemente e muitas pessoas morreram. Tivemos os casos de Manaus, onde pessoas morreram sem assistência médica e foram enterradas em covas coletivas. Isso era tudo que não queríamos que acontecesse em Belo Horizonte. Então, todas as medidas tomadas, e foram diversas, desde o fornecimento de equipamento de proteção para os nossos trabalhadores e para a população em geral – compramos mais de 2 milhões de máscaras para distribuir à população. Divulgamos também informações em massa para todo mundo, a imprensa nos ajudou muito na disseminação dessas informações, ensinando que estávamos aprendendo e a população de Belo Horizonte entendeu muito bem que era necessário, num determinado momento, se afastar e manter o isolamento social.

 

Houve época em que o distanciamento social em Belo Horizonte – medido pelas operadoras de telefonia celular – chegou a 60%, ou seja, as pessoas pararam mesmo de se encontrar e isso permitiu que Belo Horizonte promovesse um achatamento da curva de disseminação do vírus ou seja, muitas pessoas que poderiam ter adoecido por estar em contato com outras deixaram de adoecer, deixaram de morrer.

 

Alguns medicamentos foram testados, houve muitas fake news, disseminação de informações sem confirmação científica, como o uso da cloroquina para tratar. Os desafios foram muito grandes, as pressões foram muito grandes. De setores que achavam que poderiam ser atividades essenciais e pensavam que o fechamento das suas atividades foi intempestivo, o que não foi. Nós fechamos aquelas atividades que implicavam maior aglomeração de pessoas.

 

Mais de 64% das atividades comerciais na cidade foram mantidas. A decisão do que fechar e o que não fechar não foi tomada arbitrariamente, foi baseada em indicadores e número de pessoas que usavam transportes coletivos, em número de pessoas empregadas na determinada atividade, a massa salarial que esse número de pessoas envolveria. Houve uma decisão sanitária, mas sempre tendo a preocupação com o impacto financeiro e econômico que isso traria para a cidade.

 

Sei que não existe remédio sem efeitos colaterais. Esse teve efeitos colaterais, mas o que eu tenho dito sempre é que é muito mais importante você ter um CPF vivo, porque sem que o CPF esteja vivo, o CNPJ também não está. Então, essa opção por fazer a preservação da vida a todo custo foi talvez a decisão mais fácil de ser tomada, mas a mais difícil de ser implementada.

 

Quais desafios vamos enfrentar com a chegada das novas variantes da COVID, como a Ômicron? Corremos o risco de um novo fechamento da cidade?

Não sabemos isso. Tudo é possível. Desejamos ardentemente que não precisemos fechar a cidade de novo. É tudo que a gente não quer fazer. Se for necessário para preservar a vida, será feito. Eu duvido muito que uma população tão vacinada quanto é hoje a população de BH venha a ter um impacto muito grande dessa cepa ou de qualquer outra que venha a circular. Mesmo porque, a indústria farmacêutica é muito ágil e já está fazendo adaptações nas fórmulas da vacina para que venha contemplar cepas que venham aparecer. Eu não tenho como dizer se vamos ter uma grande circulação do vírus em 2022. Pode ser que tenhamos. Eu acredito, pelo que temos visto, é que embora essa cepa seja mais transmissível, é menos letal. É provável que ao encontrar uma população vacinada a gente não tenha grandes impactos para o sistema público de saúde.

 

O aumento nos casos de gripe desde o fim do ano tem sido uma problemática para a Saúde de BH? Já podemos afirmar que estamos em surto de H1N1 e H3N2, como no Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo?

Não na mesma proporção. Existe, sim, um aumento de casos. Nossas UPAs estão cheias de pacientes não COVID demandando internações ou enfermaria, mas estão, sim, cheias. Tudo que a gente não quer é que se some uma epidemia de gripe nas mesmas proporções do que vem acontecendo, por exemplo, no Rio de Janeiro. Essas medidas de abordagem precoce, o uso das máscaras, higienização das mãos, é muito importante para que não tenhamos uma epidemia com essa proporção. 

 

O cenário da pandemia deve permitir a realização do carnaval em 2022?

O carnaval como aconteceu em 2019, certamente não acontecerá em 2022. Até mesmo porque o prefeito já disse que não vai patrocinar eventos carnavalescos. Não podemos impedir que manifestações espontâneas aconteçam. É uma atividade cultural, tipicamente brasileira. Pode ser que alguns grupos venham a fazer alguma manifestação cultural e a Secretaria Municipal de Saúde já está se preparando para que possa prestar o atendimento que essas pessoas porventura precisem.

 

Qual a maior preocupação do ponto de vista da saúde para a realização da festa este ano?

É uma época em que aumenta o número de casos de intoxicação por álcool e outras drogas, aumenta o número de brigas, de facadas, de tiros, atropelamentos, que geram em atendimentos em saúde. Nossas equipes já estão sendo reforçadas para caso venha a acontecer alguma manifestação e essas pessoas possam ser devidamente atendidas. Tudo que a gente quer é que a população tenha todo o atendimento de que ela precisa e merece. Em Belo Horizonte, como já foi dito, não aconteceu de nenhuma pessoa procurar o serviço de saúde e morrer na rua sem atendimento.

 

É possível ter esperança de um ano mais tranquilo e saudável em 2022?

Esperança sempre existe. Mas o recado é o seguinte: a gente espera que ele seja melhor, mas do ponto de vista do nosso planejamento, é para que ele seja pior. Estamos preparados para o pior cenário possível, mas desejamos ardentemente que seja o melhor cenário possível. 


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