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Estado de Minas PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA

Projeto arquitetônico resgata imóveis históricos na Avenida Brasil

Patrimônio de BH tomba construções ligadas ao Conjunto Urbano Praça Floriano Peixoto, restauradas e inseridas em empreendimento residencial moderno


26/05/2021 06:00 - atualizado 26/05/2021 07:34

Construídos pela família italiana Gasparini no início do século 20, os imóveis têm estilo associado ao Art Déco e passam a conviver com o novo edifício, que oferece apartamentos de um e dois quartos(foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
Construídos pela família italiana Gasparini no início do século 20, os imóveis têm estilo associado ao Art Déco e passam a conviver com o novo edifício, que oferece apartamentos de um e dois quartos (foto: Leandro Couri/EM/DA Press)


Anos de abandono resultaram na degradação da pintura, reboco se esfacelando e até árvores nascendo semeadas por pássaros entre os tijolos centenários das fachadas. Do desgaste sofrido por décadas à restauração para resgate histórico, o conjunto de sete edificações da Avenida Brasil, no Bairro Santa Efigênia (Região Leste), entre os números 299 e 311, ressurge mais uma vez como um segmento da memória de uma das regiões mais antigas de Belo Horizonte. Os sinais de alerta que o abandono traz e que já resultaram no arruinamento de edificações antigas da capital mineira foram interrompidos a partir de 2018, com recursos de um projeto imobiliário que culminou com o tombamento municipal para a sua proteção, na última quarta-feira (19/5).
 
O dossiê de tombamento englobou edifícios da Avenida Brasil números 299, 301, 303, 305, 307, 309 e 311, pertencentes ao Conjunto Urbano Praça Floriano Peixoto e Adjacências. As construções originais foram erguidas pela família italiana Gasparini, que chegou ao Brasil em 1896 e veio se instalar, anos depois, no sobrado da esquina da Avenida Brasil com Rua Padre Marinho, atual número 311.
 
“A data precisa da construção não pôde ser verificada, mas há registros do seu início em 1902. Além desse sobrado, a família construiu outros imóveis na região, alguns já demolidos e outros objetos do dossiê em análise”, observa a socióloga e professora da PUC Minas Luciana Teixeira de Andrade, uma das responsáveis pela análise do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Belo Horizonte (CDPCM-BH).
 
Como mostra o dossiê, desde a sua chegada até os dias atuais, a família Gasparini se dedicou à construção civil. “Uma marca da maioria das suas edificações era o pavimento superior, destinado à moradia, e o inferior ao comércio”, aponta a avaliação da socióloga. Um conceito semelhante foi mantido pelas construtoras Somattos e Patrimar, que adquiriram as edificações históricas, as restauraram e inseriram em um empreendimento habitacional moderno, chamado Home Residence, com 24 andares e situado na Rua Padre Marinho. As construções terão mantidas as suas funções comerciais e todo o projeto, segundo as empresas, buscou harmonizar o novo e o antigo.

Entre eles os imóveis, um boulevard convida a um passeio 'pelo tempo'(foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
Entre eles os imóveis, um boulevard convida a um passeio 'pelo tempo' (foto: Leandro Couri/EM/DA Press)

 
O primeiro imóvel em análise, em estilo associado ao art déco, é uma edificação geminada de dois pavimentos, térreo e superior, que compõem hoje os números 299 (térreo), 301 (pavimento superior), 303 (térreo) e 305 (pavimento superior). “A fachada da edificação preserva praticamente todos os detalhes da composição original, tendo sido restaurada e reestruturada em conformidade com projeto previamente analisado e aprovado pelo órgão gestor do Patrimônio Cultural em 2018/2019, como contrapartida para a aprovação do empreendimento localizado em lote adjacente, na porção posterior do conjunto em análise no dossiê”, diz o relatório do CDPCM-BH.
 
Ao lado dos primeiros edifícios, no meio do lote, fica um prédio de três pavimentos também filiado ao estilo art déco, com os números 307 e 309. Já o sobrado de tijolos aparentes localizado na esquina da Avenida Brasil com a Rua Padre Marinho tem as fachadas principais no alinhamento do lote, dois degraus acima do nível do passeio para acesso no número 311.

Harmonia


O processo de restauro não foi fácil devido ao estado de degradação pelo qual as construções passaram por anos, sem obras significativas. “Quando recebemos as estruturas, a condição era péssima, praticamente de abandono”, destaca a coordenadora de projetos da Somattos, Martha Leão. Tanto os ambientes externos quanto os cômodos necessitavam de intervenções para voltar a exibir as características originais ou o mais próximo dessas condições.
 
“No início do processo de restauro encontramos muita coisa quebrada, algumas que nem mais eram fabricadas. As esquadrias estavam avariadas, o teto tinha aberturas, o telhado estava com falhas e telhas quebradas, os pisos tinham buracos, as portas não funcionavam, as luminárias também tiveram de ser recompostas de acordo com o projeto original aprovado pelo CDPCM-BH. Mantivemos as entradas e até as luminárias originais ou muito próximas do que seriam para assim conservar o padrão original”, descreve Leão.
 
A preocupação em conservar as características do projeto dos Gasparini sustentou todas as ações e tudo precisava ser aprovado e acompanhado pelo CDPCM-BH. “Mantivemos toda a composição original possível, e, na parte onde não foi possível, procuramos materiais próximos ao original ou que tivessem confiabilidade entre moderno e antigo, mantendo a tendência da edificação, ainda que tendo uma estrutura moderna, mas com padrão harmônico para a época”, descreve a coordenadora de projetos da Somattos. Durante o processo, foram restauradas muitas peças originais, como o piso hexagonal vermelho, as janelas de duas ou três folhas com venezianas de vidro, inúmeras portas, fechaduras e as cores das fachadas.
 

 

Bulevar entre dois tempos


 
O comerciante Geraldo Figueiredo mistura alegria e nostalgia diante do número 311 da Avenida Brasil, onde trabalhou desde os 17 anos de idade(foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
O comerciante Geraldo Figueiredo mistura alegria e nostalgia diante do número 311 da Avenida Brasil, onde trabalhou desde os 17 anos de idade (foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
Foi aos 17 anos que o comerciante Geraldo Martins Figueiredo, hoje com 77, pisou pela primeira vez no sobrado de número 311 da Avenida Brasil. O jovem queria se iniciar na profissão de manutenção de veículos e recebeu a primeira oportunidade de emprego de Luiz Carlos Pimentel de Melo, então proprietário da loja Rei das Baterias. “Minha história inteira se passou ali. De empregado, cresci e me tornei proprietário do negócio, dando um novo nome: Geraldo Baterias”, lembra.
 
Ver o conjunto restaurado é um misto de alegria, nostalgia, mas também de pesar. “Quando o empreendimento comprou o edifício, nós tivemos de sair de lá. Queria ter continuado. Aliás, não queria ter saído nunca. Mas agora não temos mais condições de voltar. Consegui, pelo menos, trazer a minha loja de baterias para a rua ao lado, a Padre Marinho”, conta.
 
O quarteirão restaurado era agitado, com muitos estabelecimentos que ainda habitam a memória do comerciante Geraldo Figueiredo. “A vida toda aquele quarteirão da Avenida Brasil foi movimentado. Na minha época, já era de muito comércio, com alfaiataria, uma sapataria, a Selma Calçados, que era muito conhecida. O Bar e Restaurante Palmeiras também era muito conhecido, frequentado por famílias e pelos trabalhadores. Ali se bebia cerveja e discutia-se política e futebol comendo linguiças, torresmos e pratos mais rústicos, de boteco mesmo. Era animado”, afirma.
 
Para tentar trazer de volta a presença das pessoas de uma forma tão intensa quanto nos primórdios, um dos destaques da integração proposta pelo novo empreendimento foi a abertura de um bulevar entre a Avenida Brasil e a Rua Padre Marinho. A passagem entre as três edificações tombadas e o novo edifício residencial Home Residence permite à população transitar entre as vias que permeiam os edifícios históricos e o mais mo- derno. O local tem jardins e projeta sombras para tornar a passagem mais agradável.

Uso misto


O empreendimento já foi até reconhecido, em 2020,  ao ser considerado o melhor projeto arquitetônico do Brasil na categoria “uso misto”, em uma das premiações de maior prestígio do mundo, o International Property Awards. “Buscamos uma simbiose, com equilíbrio de usos e arquitetura, um prédio que envolveu parte técnica e cultural, muito bacana, que nos deixou muito satisfeitos”, disse a coordenadora de projetos da Somattos, Martha Leão.
 
A construção residencial conta com apartamentos de um e dois quartos, de 40 ou 73 metros quadrados (m²). Há espaços de convivência e vaga para abastecimento de carros elétricos, lavanderia e bicicletário compartilhados já equipados com cinco bicicletas do condomínio, bem como um rooftop de lazer no 24º andar com vista panorâmica da cidade e piscina climatizada. 


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