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Estado de Minas TRATCOV

Após lançamento de app para prescrição de ivermectina, médicos acionam CFM

Carta aberta pede que órgão se manifeste a favor de terapias eficazes e da vacina; para infectologistas da UFMG, app do governo federal é 'arma genocida'


14/01/2021 18:19 - atualizado 15/01/2021 08:52

Aplicativo do MS estimula a prescrição de hidroxicloroquina, cloroquina, ivermectina, azitromicina e doxiciclina, sem eficácia comprovada contra COVID-19(foto: Ministério da Saúde/Divulgação)
Aplicativo do MS estimula a prescrição de hidroxicloroquina, cloroquina, ivermectina, azitromicina e doxiciclina, sem eficácia comprovada contra COVID-19 (foto: Ministério da Saúde/Divulgação)
Horas depois do anúncio do TratCOV, aplicativo lançado nesta quinta-feira (14/01) pelo Ministério da Saúde e que estimula a prescrição de remédios sem eficácia contra a COVID-19, ex-dirigentes do Conselho Federal  de Medicina (CFM) pedem que a entidade se manifeste sobre a condução da pandemia pelo governo federal. 

Onde está o Conselho Federal de Medicina? Onde está a entidade máxima da categoria médica no Brasil? Até agora sabemos o endereço, mas não sabemos a sua posição frente a essa tragédia sanitária e humana que assola em especial o nosso país”, diz a carta aberta divulgada no fim da tarde desta quinta-feira, assinada por cinco ex-presidentes e 14 ex-conselheiros da instituição.

O TratCOV foi lançado nesta quinta-feira (14/01) em Manaus (AM) pelo ministro Eduardo Pazzuelo, mesmo dia em que a capital do Amazonas começa a enfrentar novo colapso na rede de atendimento, com falta oxigênio aos internados por complicações da COVID-19.

Restrita ao uso de profissionais de saúde, a plataforma funciona como um auxiliar virtual de prescrição de cinco medicamentos sem eficiência comprovada no combate ao novo coronavírus: hidroxicloroquina, cloroquina, ivermectina, azitromicina e doxiciclina. Segundo a pasta, o tratamento muda conforme os dados apresentados pelo paciente. Mais de 340 médicos de Manaus foram habilitados para usar o app.

O documento dirigido ao CFM pede que o órgão responda a iniciativa do governo, orientando a categoria médica brasileira “quanto ao adequado comportamento ético a ser adotado durante a pandemia,  evitando o uso de terapêuticas sem respaldo científico". 

Outros pontos mencionados pelo texto incluem posicionamento “público e enfático” a favor da vacinação para todos e da continuidade da adoção dos protocolos sanitários de prevenção à COVID-19. “Frente a essa eloquente omissão do nosso principal órgão representativo é que nós conclamamos o CFM a que se manifeste em defesa da vida da nossa gente”, diz a carta. 

“Arma genocida”

Lançamento do aplicativo ocorreu no mesmo dia em que profissionais de saúde denunciaram colapso em hospitais de de Manaus (AM).(foto: Michael DANTAS/AFP)
Lançamento do aplicativo ocorreu no mesmo dia em que profissionais de saúde denunciaram colapso em hospitais de de Manaus (AM). (foto: Michael DANTAS/AFP)
Os infectologistas Carlos Starling e Unaí Tupinambás, membros do comitê de enfrentamento à COVID-19 da prefeitura de Belo Horizonte, se juntam ao coro dos colegas e classificam o silêncio do CFM como inadmissível, sobretudo após o anúncio do governo federal. 

“Eu estou realmente muito preocupado. Alguém tem que parar essa gestão despreparada que recorre ao charlatanismo para enfrentar esse momento tão crítico. Nós precisamos é de vacina, de seringa, adquirir vacina pra ontem! Não dá pra assistir a essa tragédia calado”, comenta Tupinambás.

Carlos Starling alerta para os riscos da prescrição de fármacos sem comprovação científica pela população. “Veja bem, não são apenas remédios que não tratam os pacientes. Eles podem ajudar a agravar o quadro. A pessoa usa, por exemplo, um corticoide no início dos sintomas da doença, como recomendam os charlatões. Mas sabe o que acontece? Ele pode reduzir a imunidade, porque esse é um efeito comum de corticoides. Com isso, um quadro que poderia ser leve pode se agravar”, explica o especialista. 

Sobre a azitromicina e a doxiciclina – dois antibióticos – o médico explica que a prescrição das substâncias contribui para a propagação de ‘superbactérias”. “É ridículo prescrever antibiótico para uma doença que não é bacteriana, é viral. Menos de 2% dos casos de COVID são associados a infecções bacterianas. Logo, receitar antibiótico contribui apenas para selecionar bactérias resistentes, que depois serão difíceis de se combater”, avalia.

"Minha conclusão é a de que esse aplicativo é uma arma genocida, parte de uma política tão cruel, quanto cínica, pois deixa as pessoas morrerem fingindo que as está tratando", complementa.



Unaí Tupinambás acrescenta que outro risco oferecido pelo uso dos medicamentos é que, ao utilizá-los, os pacientes experimentam uma falsa sensação de imunidade ao vírus. “A promessa mentirosa é a de que essas drogas protegem o indivíduo ou barram a evolução da infecção. Os adeptos do tratamento então deixam de procurar o serviço de saúde no início dos sintomas, pois creem que o tratamento vai resolver. O quadro, nesse intervalo, pode ser agravar e, quando o paciente finalmente for ao hospital, pode ser tarde”, avisa o profissional.

Estudos pouco conclusivos

Na França, os políticos eurocéticos Nicolas Dupont-Aignan, François Asselineau e Florian Philippot solicitaram na semana passada ao ministro da Saúde, Olivier Véran, informações sobre possíveis tratamentos para a covid-19, citando hidroxicloroquina, vitamina D e ivermectina.

“A maioria dos estudos clínicos (publicados) recentemente sobre o assunto são inconclusivos, ou são pré-publicações não validadas por colegas, ou, quando são publicados, são estudos com vieses metodológicos tais que os resultados são de difícil interpretação e não permitem tirar conclusões", resume a Sociedade Francesa de Farmacologia e Terapêutica.

A Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos, sua contraparte sul-africana (SAHPRA) e as autoridades de saúde mexicanas também declararam publicamente que a ivermectina não é considerada um tratamento anticovid, devido à falta de dados científicos confiáveis e robustos.

"Para ter 100% de certeza da eficácia de uma droga, precisamos de resultados de maiores ensaios clínicos randomizados" do que foi feito até agora, disse o professor Kim Woo-joo, professor do departamento de doenças infecciosas no Hospital Universitário da Coreia, em Seul. (com agências)



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