
Belo Horizonte acaba de completar 121 anos e começa a sofrer de “memória fraca”, mal causado, principalmente, pelo furto das placas de identificação de monumentos públicos: bustos de personagens da história e esculturas desaparecem sem deixar vestígios, deixando moradores e visitantes perdidos ou com cara de ponto de interrogação. O caso mais recente ocorreu no adro da Igreja Nossa Senhora da Boa Viagem – Santuário Arquidiocesano de Adoração Perpétua, na Região Centro-Sul. Segundo a administradora da paróquia, Graça Malveira, foi levada a placa de bronze, datada de 1943, do tempo em que Juscelino Kubitschek (1902-1976) era prefeito da capital e Benedito Valadares (1892-1973), o governador.
“Arrancaram tudo, até parte do reboco. Quebraram os parafusos”, mostra a administradora, explicando que fez o boletim de ocorrência e comunicará hoje o fato ao Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG), responsável pelo tombamento do “prédio e da praça que o circunda” em 1977. O pilar de alvenaria do lado esquerdo de quem olha para a Rua Sergipe, também está vazio. “Esse furto é mais antigo, não tivemos mais notícia da peça. É uma tristeza grande para todos nós, pois se trata de um bem protegido”, afirma Graça. O templo tem ainda elementos artísticos – incluindo a imagem, altar, pia, chafariz e outras peças do século 18 – sob proteção do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
As placas desaparecidas ficavam onde um dia existiu a sacristia da Igreja Boa Viagem, na época de Curral del-Rey, o arraial colonial varrido do mapa para construção da capital, inaugurada em 12 de dezembro de 1897. Em um espaço, cercado de muro de alvenaria e grade, está a réplica do lavabo, em pedra-sabão, que ficou durante anos no Museu Histórico Abílio Barreto. A peça original, datada de 1793 e atribuída por alguns especialistas a Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814) pode ser vista pelo público do lado direito da também chamada catedral provisória.

Em 2017, a Prefeitura de Belo Horizonte, via Guarda Municipal, registrou 363 ocorrências de danos ao patrimônio público de praças. No ano passado, o número cresceu: 386. Em nota, a PBH informa que os danos se referem a depredação parcial ou total de monumentos, bancos e demais estruturas nos espaços. “A Guarda Municipal atua no combate a esse tipo de vandalismo realizando rondas preventivas em viaturas em toda a capital, durante 24 horas por dia. O monitoramento de imagens captadas por câmeras, no Centro Integrado de Operações (COP-BH), reforça este patrulhamento e possibilita a intervenção imediata do efetivo da Guarda nas áreas que contam com tal equipamento”, afirmam as autoridades em nota.
A PBH informa ainda que a recolocação das placas nos monumentos envolve vários órgãos municipais e que será analisada a maneira mais eficaz de resolver a questão.

Já na Avenida Augusto de Lima, esquina com Rua da Bahia, no Centro, há um personagem sem placa que causa confusão – e quem sabe, a partir desta reportagem, a questão seja esclarecida de uma vez. Em outubro, durante a Semana de Moda, um grupo de empresários, estilistas, consultores de marketing e outros profissionais do setor plantou muda de ipê no canteiro e depois “vestiu” o busto de bronze do poeta e jornalista Joaquim Mendes de Oliveira (1879-1918). A turma garantiu que ligava o nome à pessoa. Quem passa lá, pode ainda ver a gravata vermelha balançando ao vento. Mas uma pesquisa feita em 2015, pela Belotur, indicou o diplomata e advogado José Sette Câmara (1920-2002), mineiro de Alfenas, como “ocupante” do trono. A ideia de prestar a homenagem Sette Câmara, na Praça Afonso Arinos, foi efetivada pela da Lei 812, de 9 de dezembro de 1959. “Sem placa, como vamos saber?”, diz um homem que passa apressado.
Já na recém-restaurada Praça da Liberdade, na Centro-Sul, está de volta a placa identificando o imperador Pedro II. O material desapareceu em setembro de 2010, conforme denunciou o Estado de Minas após comunicado da Associação dos Amigos da Praça da Liberdade (Apraliber). Sem cerimônia, os vândalos levaram até mesmo “as porcas dos parafusos que sustentavam o bronze, deixando só a marca do metal”, conforme representantes da entidade. Na verdade, o ato de arrancar o material se repetia pela segunda vez. Na primeira, foi deixado na grama da praça tombada pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha).
Também na Praça Hugo Werneck, entre as avenidas Alfredo Balena e Francisco Sales, na Região Hospitalar, foram recolocados o nome e outras informações sobre o médico Hugo Werneck (1878-1935), natural do Rio de Janeiro (RJ) e um dos fundadores da Santa Casa de Belo Horizonte. Em agosto de 2015, quando o EM mostrou o descuido com os monumentos, a Belotur listou mais de 50 peças em bronze de figuras ilustres, além de dezenas de esculturas, monumentos, obeliscos e outras homenagens cidade afora. O monumento foi erguido em 19 de março de 1940 por iniciativa do Sindicato dos Médicos de BH.
Homenagens de BH
1923
Em 14 de agosto, é erguido, no Bairro Santa Efigênia (Região Hospital), em Belo Horizonte, o busto em homenagem ao médico Cícero Ferreira, por iniciativa dos estudantes de medicina
1940
» Em 19 de março, é inaugurado o busto em bronze do médico Hugo Werneck, numa homenagem do Sindicato dos Médicos de Belo Horizonte a um dos fundadores da Santa Casa
1942
» Em 22 de novembro, é inaugurado o busto do industrial Victório Marçolla. Hoje a peça está no canteiro central da Avenida Afonso Pena, entre a Avenida Getúlio Vargas e Rua Professor Moraes
1959
» Em 22 de abril, é inaugurado, no Centro de BH, o busto do ex-governador de Minas Augusto de Lima, em comemoração ao seu centenário de nascimento
1959
» Em 9 de dezembro, é sancionada a Lei 812/59, para homenagear o diplomata e advogado José Rodrigues Sette Câmara com um busto na Praça Afonso Arinos
Antes...

Em agosto de 2010, foi furtada a placa de bronze, medindo 60cm de altura x 40cm de largura, do monumento em honra ao imperador dom Pedro II. Os vândalos levaram até mesmo “as porcas dos parafusos que sustentavam o bronze, deixando só a marca do metal”, conforme moradores. O material já havia sido arrancado antes. Na primeira vez, foi deixado na grama
...depois

Quem passa pela Praça da Liberdade, aberta ao público desde o início de dezembro, já pode ver a identificação do imperador dom Pedro II. A peça fica mais próxima do Palácio da Liberdade, perto da fonte das ninfas. Na tarde de ontem, enquanto operários retiravam a decoração de Natal, algumas pessoas chegavam mais perto do monumento a fim de contemplar o busto em bronze.
