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Estado de Minas MONTANHAS DE HISTÓRIAS

Hospitalidade ajuda na jornada entre Lapinha da Serra e Parque do Tabuleiro

Rede de ajuda e serviços facilita a jornada de quem faz a travessia entre Lapinha da Serra e o Parque do Tabuleiro, multiplica seus encantos e dá acesso à cultura local


26/08/2018 06:00 - atualizado 03/05/2021 14:51

A pacata Lapinha da Serra, ponto final da travessia do EM, enfeitada para festa. Rural, o povoado se espalha entre lagoas ao sopé da Serra do Breu (foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
A pacata Lapinha da Serra, ponto final da travessia do EM, enfeitada para festa. Rural, o povoado se espalha entre lagoas ao sopé da Serra do Breu (foto: Leandro Couri/EM/DA Press)

Conceição do Mato Dentro e Santana do Riacho – O cheiro de café forte, daqueles torrados com grãos cultivados em pés no quintal e passados na mesma hora, suaviza a paisagem dura do cerrado fechado, tornando-a mais amistosa. E não é só impressão. Mais alguns passos adiante e o perfume típico das fazendas da roça se intensifica. Vem da velha cozinha de alpendre do vaqueiro Silvestre Costa, o senhor Celi, de 51 anos, que prepara o café da manhã logo cedo em seu fogão a lenha, na localidade conhecida como Capão Redondo. “Aqui é pouso de apoio a muita gente. Quem vem fazer a travessia liga para pedir abrigo, alimento, uma prosa boa. Vem gente de todo o Brasil e até de fora. E mesmo quem não avisa para combinar pode ter certeza de que um gole de café quentinho vai conseguir aqui comigo”, afirma. A propriedade rural onde o vaqueiro vive é um dos sete sítios e chácaras estratégicos para a travessia entre o povoado de Lapinha da Serra, em Santana do Riacho, e o Parque Municipal Natural do Tabuleiro, em Conceição do Mato Dentro. Essa rede de solidariedade e serviços acaba se tornando parte do encanto e da imersão na cultura sertaneja propiciada por essa travessia.


São geralmente duas paradas para pernoite em três dias de caminhada pelos 27 quilômetros de travessia. O pouso acaba ficando por conta do planejamento de cada visitante, mas mesmo quem acaba se perdendo ou chegando num outro ponto acaba contando com um apoio e orientação. Uma ajuda muito importante para quem não quer levar muito peso na mochila e ampliar o esforço necessário para vencer as montanhas e vales dessa trilha. Um esforço considerável, com cerca de mil metros de ganho de elevação – ou seja, a diferença entre o ponto mais baixo da caminhada e o mais alto – e 1,3 mil de perda com as descidas – que representa a conta inversa, do mais alto para o mais baixo.

A fazenda de José Ferreira da Silva, de 77, é uma das mais procuradas, por ser também uma das mais antigas propriedades a ofertar estrutura para os aventureiros. A casa dele é avistada de longe, no alto de uma colina. Atrás da casa branca, de janelas de madeira, uma plantação de capim se emenda com um barracão. Passando as cercas antigas, algumas de madeira já apodrecida, outras de tramas de arame farpado, chega-se a um curral aberto, onde algumas vacas mascavam capim no cocho. A recepção, contudo, fica por conta de quatro cães vira-latas, que aparecem correndo de trás da casa latindo para avisar da chegada de mais forasteiros, mas sem representar qualquer ameaça.

Ver galeria . 8 Fotos O povoado original de Lapinha da Serra, pertencente ao município de Santana do Riacho, que tinha cerca de 300 habitantes, chega a reunir 5 mil pessoas em celebrações, como a festa de São JoãoLeandro Couri/EM/D.A. Press
O povoado original de Lapinha da Serra, pertencente ao município de Santana do Riacho, que tinha cerca de 300 habitantes, chega a reunir 5 mil pessoas em celebrações, como a festa de São João (foto: Leandro Couri/EM/D.A. Press )


No primeiro contato com a gente estranha que se aproxima, o senhor José Ferreira já trata de desfazer as formalidades. “Todo mundo aqui me conhece como seu Zé da Olinta, minha mãe. Pode me chamar assim”, disse. Além de ajudar com informações e recursos, seu Zé também gosta de uma boa conversa na porta de casa, ou mesmo dentro dela se a pessoa não estiver com pressa. Suas terras, dentro do parque, foram herança de família e ele revela isso sem temor de que um dia esse conflito seja resolvido com seu despejo, algo que já ocorreu em outras unidades de conservação. “De primeiro era o meu sogro que mexia aqui (nessas terras). A minha dona, que era a filha dele, mexia aqui também. Aí eu fiquei aqui, fui comprando algumas terras de um e de outro. E fui fechando também algumas cercas, que não eram de ninguém, ninguém veio brigar comigo. Porque, do governo, não viriam aqui brigar, né? Então eu fiquei aqui, ninguém procurou nada aqui comigo”, disse.

Sempre disponível para ajudar aventureiros, Zé da Olinta gosta de uma prosa. 'Não vim para o turismo, foi o turismo que veio para mim', brinca (foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
Sempre disponível para ajudar aventureiros, Zé da Olinta gosta de uma prosa. 'Não vim para o turismo, foi o turismo que veio para mim', brinca (foto: Leandro Couri/EM/DA Press)


Ele confessa que se alegra com o movimento de gente atravessando a montanha. “De primeiro, quase não passava gente aqui. Agora, vêm pessoas de tudo quanto é canto. Eu não vim para o turismo, foi o turismo que veio para mim. Aí faço comida para eles, banho quente, café, alguma vez costumam ficar em quartos aqui de dentro de casa também”, disse. Segundo ele, os pratos que mais fazem sucesso são as comidas caipiras. “Nada muito complicado não, porque não tenho como. Mas sai uma salada, um ovo, uma carne. Uma galinha. Não é muita coisa não, porque para se chegar a um lugar desse não é fácil não. Só de helicóptero”, brinca.

'Feitiço' do povo do lugar


A chegada a Lapinha da Serra, do alto da Serra do Breu, é impressionante. O povoado se espalha entre duas lagoas compridas e o sopé da serra oposta. Do alto já se vislumbra o pacato ambiente rural, com pessoas cavalgando animais no pelo, navegando em caiaques ou simplesmente perambulando pelas ruas de chão de terra. Ao se descer a montanha que antecede a comunidade, já se observam várias placas com indicações de cachoeiras, algumas delas muito próximas, como a do Poço Escuro, outras mais exigentes. Ou seja, há locais para todos os gostos e disposição de visitantes. Alguns festejos costumam atrair mais turistas e por isso é bom deixar seu lugar reservado numa pousada ou camping. Os preços na vila também são mais salgados que em muitos comércios da capital, sobretudo devido à dificuldade logística de serem abastecidos. Santana do Riacho, a sede do município, fica a 12 quilômetros, numa estrada de terra que pode piorar durante as chuvas.

À frente de pousada em Lapinha da Serra, João Elias Neto completa o aconchego com delícias da culinária. 'Eu mesmo faço bolos e pães', conta (foto: Leandro Couri/EM/DA Press)
À frente de pousada em Lapinha da Serra, João Elias Neto completa o aconchego com delícias da culinária. 'Eu mesmo faço bolos e pães', conta (foto: Leandro Couri/EM/DA Press)


"Mesmo quem não avisa para combinar pode ter certeza de que um gole de café quentinho vai conseguir aqui comigo"

Silvestre Costa, de 51 anos,vaqueiro de Capão Redondo

Receptividade quando se tem uma vasta oferta de camas sobrando é algo bonito. Mas e quando sua pousada está lotada devido à maior festa do povoado? É nessas horas que pessoas realmente hospitaleiras estendem suas mãos aos viajantes, mostrando um pouco da solidariedade de Lapinha da Serra. Exemplo disso é João Elias Neto, dono da Pousada Cipó Brasil. Quando a reportagem chegou da travessia, no fim da tarde, e encontrou quase todas as pousadas repletas de turistas, João abriu uma exceção para os viajantes estafados. O estabelecimento é muito aconchegante e funciona há três anos. Atrai muitos casais e atletas também interessados nas belezas da Lapinha. “O clima aqui é muito aconchegante e gosto de focar também na culinária. Eu mesmo faço bolos e pães. Nos fins de semana, procuro criar noites temáticas, com culinária italiana ou espanhola”, afirma o proprietário, que também dá ótimas dicas de passeios para explorar a região, outra de suas paixões.

O que começou como turismo acaba conquistando o coração de muitos, que adquirem propriedades na Lapinha da Serra e passam a se tornar frequentadores assíduos. Como o funcionário público Paulo Henrique Vale, de 42 anos, e sua mulher, Rita Araújo Vale, de 40, que compraram uma casa e sempre passeiam com as filhas gêmeas, Gabriela e Luana, de 6. “Conhecemos a Lapinha desde 2002. Temos uma casinha aqui e costumamos vir com bastante frequência, seja quando tem festas seja para aproveitar as férias das meninas”, disse Paulo Henrique. “O que mais nos tocou foi a simplicidade da vida aqui, a cultura do lugar. E a paisagem, que é linda”, afirma Rita.

Ver galeria . 11 Fotos Trilha para a travessia entre Tabuleiro e Lapinha da Serra é uma das mais tradicionais da Região SudesteLeandro Couri/EM/D.A. Press
Trilha para a travessia entre Tabuleiro e Lapinha da Serra é uma das mais tradicionais da Região Sudeste (foto: Leandro Couri/EM/D.A. Press )


Cuidados para a travessia


Detalhes que devem ser observados, principalmente pelos menos experientes

Precaução // Motivo
Contate os pontos de apoio // Com isso você garante o pouso e não tem de dormir no frio do mato
Cuidado com a água // Pastilhas de cloro ou tintura de iodo ajudam a purificar. Vimos um cavalo morto num córrego onde se coleta água
Contrate um guia ou use GPS // Não dá para confiar na sinalização, que apesar de boa pode confundir
Use calçados adequados // Botas de cano médio ou alto previnem torções nas montanhas
Observe os horários // Procure levantar acampamento antes das 17h. A noite cai rápido nos montes
Evite os pastos // Muitos deles são infestados de carrapatos
Nunca vá sozinho // Recomendações de segurança são para pelo menos três componentes
Leve fogareiro // É proibido fazer fogueira. Todo cuidado é pouco para evitar incêndios
Carregue seu lixo de volta // Tenha sacolas e recipientes para lixo e excrementos
Não esqueça o celular // Além de poder fazer contato em alguns pontos, o GPS pode ajudar

 

(A LOJA ROTA PERDIDA/ROTA EXTREMA - www.rotaperdida.com.br - forneceu parte dos equipamentos usados nas expedições) 


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