(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas

Além da ação do tempo e descaso, chuvas castigam construções históricas de Minas

Já castigados pela ação do tempo e pela falta de manutenção, templos e outros imóveis históricos do estado ameaçam sucumbir à chegada da estação chuvosa


postado em 20/11/2016 06:00 / atualizado em 20/11/2016 15:01

Interditada há quatro anos, Igreja de Nossa Senhora do Rosário, em Itabira, precisa de escoras para evitar desabamento do telhado(foto: BETO NOVAES/EM/D.A PRESS)
Interditada há quatro anos, Igreja de Nossa Senhora do Rosário, em Itabira, precisa de escoras para evitar desabamento do telhado (foto: BETO NOVAES/EM/D.A PRESS)

Itabira
– Infiltrações, goteiras, madeiramento podre, buracos no telhado e paredes ameaçando desabar podem levar ao chão joias arquitetônicas do fim do século 18 ao início do 20. As chuvas chegaram a Minas e ameaçam seriamente construções erguidas em nome da fé, como templos barrocos, entre eles a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, em Itabira, na Região Central, e casarões, alguns do tempo das Vilas do Ouro, que abrigaram as famílias e depois se transformaram em museus, sede de instituições e outros espaços importantes para a vida cultural das cidades. Degradados pela falta de prevenção, pelo descaso ou devido à escassez de recursos, monumentos cheios de histórias exibem cicatrizes profundas e demandam medidas emergenciais para não ruir, incluindo escoras nas laterais, lonas plásticas no telhado e outras saídas paliativas.

Conforme levantamento do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), há muitas construções, a maioria tombada e com procedimentos na Justiça, necessitadas de cuidados urgentes para não cair ou se deteriorar ainda mais (veja quadro na página 18). “É preciso pensar na prevenção, prestar atenção à primeira telha quebrada, ficar de olho na goteira inicial”, alerta o coordenador das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas Gerais (CPPC), Marcos Paulo de Souza Miranda. “A conservação preventiva é fundamental, pois as restaurações são caras e demoradas”, ressalta.

Um dos locais onde a ameaça é séria é Itabira, na Região Central, onde o templo católico pioneiro da cidade, no Bairro Penha, foi interditado há quatro anos por determinação do Corpo de Bombeiros e Defesa Civil Municipal. Na terça-feira, ganhou, do lado direito, duas toras de seis metros de comprimento cada uma, com o objetivo de escorar o telhado. Sob proteção do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) desde 1949, a Igreja ou Ermida de Nossa Senhora do Rosário, datada de 1770, preocupa o pároco da Catedral de Nossa Senhora do Rosário, padre Márcio Soares. “Tememos muito pelo período chuvoso”, diz o religioso, mostrando parte da parede interna da nave sem o reboco e com os tijolos de adobe e vigas carcomidas aparentes.

No próximo mês, adianta o padre, a paróquia vai iniciar uma campanha a fim de sensibilizar comunidade e autoridades, em especial a prefeitura local, para conseguir a importância de R$ 100 mil e executar o serviço imediato. “O conserto da cobertura é urgente. Temos aqui uma equipe de engenheiros e a recomendação, autorizada pelo Iphan, foi fazer a escora para o telhado não desabar”, conta padre Márcio. Ele lembra que está sendo desenvolvido um projeto de restauro completo do templo, incluindo a parte elétrica, elementos artísticos, piso e outras áreas. A estimativa é de gastos de R$ 2 milhões para dar conta de todos os setores, embora a prioridade seja a cobertura que protege o forro, enaltecido nos versos de Pintura de forro, do livro Boitempo, do poeta maior da terra, Carlos Drummond de Andrade (1902-1987).

Padre Márcio Soares:
Padre Márcio Soares: "Já passou da hora desta obra ser feita" (foto: BETO NOVAES/EM/D.A. PRESS)

Conservação é negligenciada


Itabira – As construções mineiras dos tempos coloniais, de pau a pique ou de adobe e com muita madeira, são as mais vulneráveis ao colapso no período de chuva. Essa rica fatia do patrimônio arquitetônico engloba, principalmente, as igrejas, como a de Nossa Senhora do Rosário, de Itabira, na Região Central, interditada há quatro anos, bem como capelas e casarões. “Já alertamos várias vezes aos gestores municipais e também aos bispos e padres das paróquias sobre os riscos, lembrando que é fundamental a prevenção e conservação dos bens culturais. Há omissão de todas as partes”, critica o coordenador das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas Gerais (CPPC), Marcos Paulo de Souza Miranda.

Segundo o coordenador da CPPC, não adianta ficar só pensando na futura restauração para a construção histórica ficar mais bonita. “As pessoas vão deixando de lado até não haver mais jeito. A lógica precisa ser invertida: é preciso conservar, trocar uma telha quebrada, limpar as calhas, enfim, fazer o serviço de urgência. Além disso, a obra de restauro, principalmente nas igrejas antigas, é cara e muito demorada.”

Marcos Paulo critica também o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) das Cidades Históricas, que privilegiou apenas restauração em detrimento da preservação. “A pedra de toque é a conservação preventiva, por isso o PAC deveria contemplar também esse aspecto, e não apenas o restauro.” Em todas as regiões de Minas, conforme o Ministério Público de Minas Gerais, há prédios públicos e privados em situação de penúria, com as coberturas desmoronando, paredes ruindo e pisos com buracos.

URGÊNCIA Em Itabira, a comunidade quer se unir para salvar um dos seus bens mais valiosos. O assunto mobiliza a população e se reflete na imprensa local, como em publicações recentes do jornal O Trem Itabirano. “Já passou da hora de esta obra ser feita. Agora temos que executá-la de qualquer jeito. Na verdade, precisamos fazer a Igreja de Nossa Senhora do Rosário voltar a funcionar o mais rápido possível”, alerta padre Márcio Soares, pároco da Catedral de Nossa Senhora do Rosário. “Na manhã de quinta-feira, ele mostrou o interior do templo ao Estado de Minas e chamou a atenção para a beleza do forro da capela-mor, atribuído ao mineiro Manuel da Costa Ataíde, o Mestre Ataíde (1762-1830). Nele está a imagem de Nossa Senhora do Rosário, padroeira de Itabira, tendo aos pés a figura de um dragão. A pintura inspirou o itabirano Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) – “que certamente deve ter vindo muito a esta igreja”, acredita padre Márcio. Lembrando da infância, ele escreveu: “Olha o dragão na Igreja do Rosário/Amarelo dragão envolto em chamas/Não perturba os ofícios/Deixa-se queimar, maçã na boca/Olhos no alto”.

Integrante do Museu do Território – Caminhos Drummondianos, criado em dezembro de 2000 e agregando igrejas, casarões, museu e outros pontos de relevância de Itabira, a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, vinculada à Diocese de Itabira, não abriga mais as missas, casamentos, batizados e outras cerimônias católicas. “Esta igreja sempre foi muito frequentada, hoje não tem mais nada. O último restauro ocorreu há uns 16 anos”, lamenta o padre.

Para os moradores, a situação só traz desalento. Casada há 34 anos com José Miguel Caetano, a dona de casa Joana D’Arc Souza Caetano explica que foi rainha do Rosário numa das festas em louvor a Nossa Senhora, e se casou no templo agora fechado. “Muita gente, que passava aí apenas para rezar, me pergunta quando a igreja vai reabrir, quando vão arrumá-la”, diz Joana D’Arc, também ansiosa pela resposta. Ela e José Miguel, pais de três filhas, atuam também como zeladores.

A superintendência do Iphan em BH informa que autorizou o arquiteto Fernando Santi, de Itabira, a acompanhar os serviços emergenciais. Ele explica que está trabalhando por enquanto como voluntário e que monitora a igreja. Segundo Santi, os problemas decorrem de infiltração no telhado, e, ao que tudo indica, podem derivar de uma restauração malfeita há anos. As intervenções futuras preveem dois pilares para segurar o telhado e outro de concreto, dentro da parede. O Estado de Minas entrou em contato com a Prefeitura de Itabira, mas não obteve resposta sobre uma possível participação no restauro do templo.

Patrimônio ameaçado

Igrejas, capelas, casarões, museus e sedes de entidades sofrem com problema na cobertura, o que aumenta a degradação no período chuvoso. Mas há muitos outras sérias questões que podem levar ao colapso, se providências urgentes não forem tomadas. Veja alguns exemplos


» Igreja de Nossa Senhora do Rosário em Itabira, na Região Central
» Matriz de Santo Antônio no distrito de Glaura, em Ouro Preto, na Região Central
» Matriz do Santíssimo Sacramento em Jequitibá, na Região Central
» Igrejas de Nossa Senhora da Conceição e de Nossa Senhora do Rosário no distrito de Acuruí, em Itabirito, na Região Central
» Igreja de Nossa Senhora do Rosário em Brejo do Amparo, em Januária, no Norte de Minas
» Igreja de Nossa Senhora da Conceição em Berilo, no Vale do Jequitinhonha
» Museu Histórico Aurélio Dolabella, Casa da Cultura, em Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte
» Sobradão no Centro de Minas Novas, no Vale do Jequitinhonha
» Casarão (antiga Casa dos Conselhos) ao lado da Matriz do Pilar em São João del-Rei, na Região do Campo das Vertentes
» Prédio da União Operária Beneficente em Jequitinhonha, no Vale do Jequitinhonha
» Hotel Glória no Centro de Ponte Nova, na Zona da Mata


Fonte: Coordenadoria das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio
Cultural e Turístico de Minas Gerais (CPPC)/MPMG


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)