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Estado de Minas EXTREMOS GERAIS

Polêmica, vaquejada é uma das grandes atrações da Região Norte de Minas

Cultura pastoril ancestral é referência para a população e se revela nos costumes da Região Norte, onde a vaquejada, questionada por defensores dos animais, é das grandes atrações


postado em 13/11/2016 11:00 / atualizado em 13/11/2016 18:04

(foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
(foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
No Norte, a história de Minas foi escrita cercando bois e percorrendo em selas os caminhos das comitivas de gado. Em pistas de vaquejada e arenas de tourada circense, vaqueiros e artistas itinerantes mantêm a tradição, que ilustra a ligação cultural com o Nordeste. Marca também de costumes colocados em xeque pela legislação e pelo olhar sobretudo das populações menos familiarizadas com essa realidade.

No sertão mineiro, a palavra “catrumano” teria sido trazida por viajantes europeus dos séculos 18 e 19, para se referir aos nativos do Norte como “quatro patas” ou “quatro mãos”, diante do apego impressionante que mantinham por suas montarias. O termo ilustra a cultura da sociedade pastoril que surgiu nos currais do São Francisco, estabelecida décadas antes da descoberta do ouro nas zonas mineradoras.

Buscando “o lugar do Norte”, que se ressente por crer que nunca teve reconhecida sua importância histórica na formação do mineiro, o Movimento Catrumano nasce “de um incômodo cívico, psicológico e emocional”, e da necessidade de “construir um poder simbólico para o Norte de Minas”, como explica o antropólogo João Batista de Almeida Costa, professor da Universidade Estadual de Montes Claros e um dos integrantes da iniciativa. Ele aponta que na formação cultural predominante em Minas prevaleceu a ideologia do ouro e do poder, em detrimento da cultura dos sertões, do gado.

A sociedade pastoril, afirma, mesmo quando revelada na maestria de Guimarães Rosa, aparece como romance e não como história. “O Norte de Minas é fundamental na constituição de Minas Gerais. É a conjunção das duas sociedades, pastoril e mineradora, que dá forma à sociedade mineira”, diz o pesquisador. No entanto, ainda hoje, uma visão de separação e exclusão permanece sobre a região, sustenta. “A gente é jogado para a Bahia”, observa o pesquisador.

A cidade mais sábia do mundo

Os mantimentos do Norte, garantidos pela pecuária, tornaram possível a existência das áreas mineradoras nascentes ao Sul do estado, afirma o professor. Nos primeiros anos da mineração, a fome esvaziava periodicamente as minas de ouro. Somente no início do século 18, quando foi feito o abastecimento pelo Norte, é que a mineração se firmou. “Mas parece que os mineiros têm vergonha de ter sido alimentados por nós”, questiona João Batista.


Desde 2005, integrantes do Movimento Catrumano celebram, em 8 de dezembro, o Dia dos Gerais. A data foi oficializada em 2011, e nesse dia a cidade de Matias Cardoso, a primeira ocupação documentada no atual território mineiro, se torna a capital simbólica de Minas.

Tombos de vaqueiros também fazem sucesso entre os fãs da prática e já viraram até DVD(foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
Tombos de vaqueiros também fazem sucesso entre os fãs da prática e já viraram até DVD (foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
BOLÃO DE VAQUEJADA Questionada por decisões judiciais e por defensores dos animais, a vaquejada é uma prática cara em várias cidades norte-mineiras. “É um esporte que faz parte da cultura do Norte de Minas. Veio do Nordeste e acabou ficando por meio dos filhos, netos e das gerações que vão tocando o costume”, define o fazendeiro Péricles Antônio Marinho da Mata, de 43 anos, que corre no 2º Bolão de Vaquejada da Fazenda Bom Sucesso, em Juvenília. O bolão, segundo ele, é uma espécie de amistoso, dando a oportunidade para testar vaqueiros e animais. “Os animais que passarem melhor estão preparados para ir para as vaquejadas”, completa.

As duplas consistem em “puxador” e “esteira”, e têm como objetivo derrubar o boi, solto por uma pequena porteira em uma pista de cerca de 160 metros. Na faixa de pontuação demarcada com cal, o animal deve ser derrubado. A competição prossegue por eliminação, e não é raro que entre madrugada adentro.

Proprietária do Parque de Vaquejada Bom Sucesso, a advogada Roseni Nogueira lembra as dificuldades encontradas na atual ordenação jurídica, que entende haver maus-tratos contra os animais na prática. Ela defende que se trata de “um esporte meio radical, sertanejo”. Fazendo pequena justiça aos bois, um radialista da região filma e vende gravações editadas das vaquejadas. As mais procuradas, segundo ele, são coletâneas das quedas dos vaqueiros, vendidas a R$ 15 em bancas de rua pelo Norte de Minas.

NOTAS DO PEDAL

Presença feminina
Inspirada e incentivada pelo avô, a vaqueira Brenda Stefany Nunes, de 17 anos, é presença feminina constante em vaquejadas do Norte de Minas, boa parte das vezes sendo a única mulher a correr. Acostumada ao apoio e aos aplausos do público feminino, na 24ª Vaquejada Nacional de Miravânia ela contava também com um fã-clube mirim, que vestido a caráter aguardava sua vez na pista.“Eu já andei no cavalo dela”, informava, orgulhosa, uma das três garotas de chapéu, botas, luvas e esporas cor-de-rosa. Morando em fazenda de Manga, a jovem vaqueira monta em velocidade e derruba boi pelo rabo desde cedo. Em competições, está desde os 14 anos. Afirma que ama o que faz e que só tem que agradecer, “cada fim de semana um lugar diferente, novas amizades, uma nova família”.
A vaqueira Brenda Stefany Nunes(foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
A vaqueira Brenda Stefany Nunes (foto: Túlio Santos/EM/DA Press)


Artista de estrada

Nascido numa barraca de circo, filho de artistas em turnê pelo Rio de Janeiro, Milton Magalhães Lacerda foi registrado dias depois como mineiro, de passagem pela cidade de Rodeiro, Zona da Mata. Com 47 anos e tendo rodado as cinco regiões do Brasil, ele conta que começou aos 13 e nunca conseguiu ficar muito tempo fora das arenas. Um tapete com a inscrição “Lar, doce lar” dá as boas-vindas na escada do ônibus adaptado onde mora, com quarto, banheiro, cozinha, tevê e internet. Em frente ao espelho, ele dá vida ao palhaço Mulambo, criado há 25 anos, quando a família achou melhor aposentar o pai, o palhaço Furreca. O trabalho exige capacidade física, técnica e coragem no trato com animais. Na trupe, cada um dos 10 integrantes se desdobra em funções que vão da montagem à bilheteria. Mulambo, que já toreou nas maiores festas de rodeio do país, critica a falta de apoio das autoridades e diz que o circo de tourada está acabando. “Tenho a alegria de levar a alegria por onde eu passo”, conclui, sorrindo, antes de partir para a Bahia.

Palhaço Mulambo(foto: Túlio Santos/EM D.A Press)
Palhaço Mulambo (foto: Túlio Santos/EM D.A Press)


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