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Estado de Minas

Perto do Natal, mais de 100 pessoas esperam mudança para casas alugadas em Mariana

A sete dias da data-limite defendida pelo MP, Samarco informa ter instalado 260 famílias, mas 131 vítimas do desastre aguardam em hotéis de Mariana mudança para casas alugadas. Para os atingidos, entrar no clima de festas ainda é um desafio


postado em 18/12/2015 06:00 / atualizado em 18/12/2015 09:45

Alenir e a filha Ana Clara, que pretende levar enfeite natalino para a casa em que vai morar (foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
Alenir e a filha Ana Clara, que pretende levar enfeite natalino para a casa em que vai morar (foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
Mariana – Faltando uma semana para a comemoração do Natal, entre os atingidos pelo maior desastre socioambiental da história do país, a árvore que simboliza a data ainda é figura rara. Timidamente, se faz notar apenas na entrada do Centro de Convenções de Mariana, na Região Central do estado. Nas casas que já foram alugadas pela Samarco, nos hotéis ou nas moradias de parentes, onde se distribuem ao todo 398 famílias das comunidades arrasadas pela lama da Barragem do Fundão, é difícil encontrar enfeites natalinos ou símbolos que represente a celebração pelo nascimento de Jesus. Ocupados pelas mudanças de hotéis para imóveis alugados e ainda abalados pela tragédia que virou a vida pelo avesso, os moradores têm dificuldade para entrar no clima das comemorações de fim de ano. Em meio à indefinição, chamam a atenção o Papai Noel voluntário do Centro de Convenções, que ajuda a organizar a dinâmica das doações, e o bom velhinho de brinquedo, que uma das famílias que perderam tudo na tragédia pretende guardar para sempre.

Ao todo, 131 pessoas, de 28 famílias, ainda esperam a oportunidade de trocar o quarto de hotel por algo que possam chamar de lar. Segundo a Samarco, 260 famílias foram alocadas em casas alugadas pela empresa e outras 110 permanecem em moradias de parentes. A companhia diz que tem feito todos os esforços para instalar os atingidos pelo desastre o mais rápido possível, mas o Ministério Público quer que esse trabalho termine, impreterivelmente, até dia 24, para que todos passem a noite de Natal em uma casa alugada, o que torna a tarefa uma corrida contra o calendário. Depois que a empresa se recusou a assinar um compromisso que previa essa e outras determinações, o promotor Guilherme de Sá Meneghin entrou com uma ação civil pública no Fórum de Mariana, acionando a própria mineradora e suas controladoras, a Vale a BHP Billiton, para que garantam uma série de direitos às vítimas.

A sete dias da data-limite, enquanto permanece o impasse judicial há moradores que sonham com uma casa como presente de Natal. Essa é a expectativa da auxiliar de serviços gerais Vera Lúcia Aleixo Silva, de 58 anos. Moradora de Gesteira, distrito do município de Barra Longa, ela está morando com o marido, o filho e a nora na casa de um cunhado, na vizinha Mariana. Até agora, não há nenhuma movimentação para a celebração natalina, principalmente pela dificuldade de preparar algo em uma casa que não é dela. “Se saísse a minha casa, com certeza seria um belo presente. Mas o Natal já passou para nós. Não temos motivo para comemorar. Eu tinha árvore de Natal em casa e ajudava a montar o presépio da igreja. Nasci e me criei em Gesteira, mas depois do que passei, não quero mais voltar”, contou, enquanto aguardava o transporte dos donativos que tinha acabado de pegar no Centro de Convenções.

Apesar do clima difícil e do desânimo em relação ao Natal, a lavradora Alenir Maria Alves, de 38, que ainda está em hotel, espera conseguir alegrar a pequena Ana Clara, de 9, caçula de duas filhas. Morando há 19 anos em Bento Rodrigues, subdistrito de Mariana arrasado pela lama, ela estava acostumada a juntar a família todo ano e a ajudar a menina na montagem da pequena árvore de Natal, enfeitada anualmente com acessórios que hoje estão debaixo da lama.

Sem eles, Ana Clara encontrou em um boneco de Papai Noel, resgatado pela mãe em meio a doações, um novo símbolo do Natal de agora em diante. “Quero guardar ele para sempre”, diz a criança. “O Natal para mim já acabou. O que a gente tenta é levar as crianças para se divertir”, afirma. Sem perceber, a mãe também acabou se apegando ao boneco. “Pegamos no meio de doações e combinamos que a última de cinco famílias na pousada que estou levaria o boneco. Sobrou para mim. Vou mandar fazer uma cadeira para ele ficar no terraço da casa que a Samarco vai alugar para minha família”, afirma.

EM CASA Quem já conseguiu a moradia começa a se adaptar à nova rotina, mas, mesmo assim, entrar no clima de festas tem se revelado um desafio. Jéssica Xavier, de 23, até queria enfeitar a casa onde está morando depois que precisou abandonar o lar destruído em Bento Rodrigues. “Mas está difícil pensar em qualquer outra coisa que não seja reorganizar a vida. Antes, Natal no Bento era ótimo, a gente era uma comunidade. Agora, cada um foi para um canto.”

O pedreiro Fernando dos Santos sabe que este Natal será diferente, mas não perde a esperança, nem o divino espírito de compartilhar. Moradores há 25 dias de uma casa alugada no Bairro Dom Oscar, em Mariana, Fernando, a mulher e o filho pretendem fazer uma ceia “como qualquer família brasileira”. “Vai ser tudo normal. Aqui na nossa rua, há 10 famílias de Bento Rodrigues, que estavam em hotel e já estão em casa”, explicou. O vizinho Antônio Geraldo dos Santos, de 32, solteiro, mora com os pais e também pretende se juntar a outros amigos para celebrar o nascimento de Jesus. “Não temos muito costume de fazer festa, a casa não tem decoração de Natal, mas vamos fazer um churrasco”, adianta. (Colaborou Gustavo Werneck)

"Peguei este gorro e comecei a ajudar, pois sou amigo do povo. Muitas vezes, as pessoas ficam nervosas com a situação e acabam se estressando na fila das doações" - Jefeson Geraldo Inácio, vigilante (foto: Túlio Santos/EM/DA Press)

Os papais noéis de Mariana

 

Se a maioria nem teve tempo de pensar em algo para o Natal, há entre os envolvidos na tragédia de Mariana quem creia que a data é uma oportunidade de ser solidário e começar a reescrever as histórias dos atingidos. Uma desses papais noéis é o vigilante Jefeson Geraldo Inácio, de 28 anos, que viu em um gorro encontrado no meio das doações, no Centro de Convenções, a possibilidade de amenizar o sofrimento dos atingidos, quase todos pessoas conhecidas, já que ele também morava em Bento Rodrigues. “Peguei este gorro e comecei a ajudar, pois sou amigo do povo. Muitas vezes, as pessoas ficam nervosas com a situação e acabam se estressando na fila das doações”, afirma. Além de colaborar na organização, Jefeson faz a alegria das crianças, como a pequena Agatha, de 6 meses, e já é considerado o Papai Noel oficial dos voluntários. “Pelo menos temos um pouco de alegria neste momento triste”, diz a mãe da menina, Priscila Dias, de 20, que também perdeu tudo em Bento Rodrigues.

Outro que não se abate e não desiste de fazer valer o espírito de Natal é o encarregado de obras Antônio Florêncio Lopes, de 40 anos, já alojado em uma casa em Mariana. Ele ocupa com a mulher um dos três andares de um sobrado que também tem como moradores a sogra e o cunhado, nos outros dois pavimentos. Antônio espera encontrar uma turma de Bento Rodrigues, depois de amanhã, em um almoço promovido por uma rádio local. “Quero conversar com as pessoas para combinar o que podemos fazer no Natal: uma ceia no dia 24 ou um almoço no dia 25”, planeja. Ele conta que foi procurado por uma clínica de acupuntura de Belo Horizonte para receber doação de 200 cestas básicas. “Já consegui distribuir mais de 100 cestas. Estou entregando uma por família”, completa.


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