
Celso ficou chocado com o que viu, definindo a imagem da destruição como impressionante. Trata-se de um vale, onde a lama passou carregando um trecho inteiro de mata que ficava nas margens. “Eu costumava passar de moto pela Estrada Real para chegar a Bento Rodrigues. Sempre ia ao Bar da Sandra, que ficava ao lado igreja, para tomar cerveja gelada e comer coxinha”, recorda Celso, que voltou ao lugar pela primeira vez depois da tragédia.
Do outro lado do rio, outro motociclista tampouco conseguiu passar. Era o motorista Alberto Melo, de 43, morador de Mariana, que sempre ia de moto nos fins de semana a Bento Rodrigues. De tão assustado com a destruição, ele levou a mulher na garupa para mostrar no que se transformou o lugar. “Somente conseguimos chegar porque passamos por uma trilha de moto, em que carro não passa”, gritou o motorista, do outro lado de onde antes ficava a ponte. O casal disse ter visto Bento Rodrigues de longe, já que havia muitas máquinas trabalhando no lugar, e presenciado o pouso de um helicóptero do Corpo de Bombeiros. “Não sobrou nada”, disse Alberto. Embaixo de onde antes era a ponte, há um penhasco. A cachoeira que corria entre as pedras virou lama pura.
O Instituto Estrada Real divulgou nota alertando turistas sobre a interdição da rota, que é do século 18. “Devido aos fatos recentes ocorridos em Bento Rodrigues, subdistrito de Mariana, com o rompimento da barragem da Samarco, trechos do Caminho dos Diamantes que passam pela região estão interrompidos. A estrada que liga Santa Rita Durão, Bento Rodrigues, Camargos e Mariana está interditada”, diz o informativo.
MEMORIAL Em meio à demora para reconstrução dos caminhos e dos próprios povoados destruídos pela lama, a Prefeitura de Mariana anunciou a intenção de transformar o subdistrito de Bento Rodrigues, o primeiro a ser atingido pela avalanche de lama e o mais destruído, em um memorial. Para isso, o prefeito Duarte Júnior aproveitou a viagem que fez na semana passada à França, onde participou da 21ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-21), para pedir apoio à Unesco. “Bento Rodrigues não pode ser esquecido. Queremos que a Unesco nos ajude e que o subdistrito passe a ser um memorial, onde a tragédia não seja esquecida. As pessoas vão olhar para o futuro, viver o presente, mas elas não podem esquecer o passado. Não vamos esquecer o nosso passado”, disse o prefeito.
A iniciativa ocorre em um momento em que Mariana luta para que o turismo, sua segunda maior fonte de arrecadação, não aumente a lista de setores atingidos pela maior tragédia socioambiental da história brasileira. Ontem, a primeira capital mineira recebeu o apoio do Sindicato das Empresas de Turismo no Estado de Minas Gerais (Sindetur-MG). Em nota, a entidade chama a atenção para o fato de que, apesar de ter subdistritos devastados pela onda de lama, a sede de Mariana não foi afetada e o patrimônio artístico e histórico está intacto. “As visitas e os passeios estão ocorrendo normalmente e, neste momento, é muito importante para a cidade voltar os seus olhos para o turismo, já que a atividade mineradora está parcialmente paralisada”, explica o texto, assinado pelo presidente José Eugênio Aguiar.
Dez dias após a tragédia, o prefeito Duarte Júnior revelou que cerca de 80% da arrecadação da cidade vem da atividade mineradora na unidade de Germano, onde ocorreu o rompimento. Segundo a prefeitura, após o desastre cada vez mais turistas vêm cancelando visitas à cidade, o que piora a situação. “Venha nos visitar e conhecer nossos atrativos. Contribua com a cidade neste momento tão difícil. Afinal, turismo é também uma forma de solidariedade”, diz comunicado da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo. (Colaboraram Rodrigo Melo e Paulo Henrique Lobato)