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Estado de Minas

Mineiros de Ouro apresenta: magia da transformação

Catadora de material reciclável desde os 7 anos, mulher cria cooperativa, que a ajuda a criar as filhas com dignidade e ainda gera renda e emprego a outras famílias que vivem do lixo


postado em 19/10/2013 06:00 / atualizado em 19/10/2013 07:03

Madalena repassa premiada experiência adquirida nos lixões a quem precisa de trabalho(foto: Luiz Ribeiro/em/D.A Press)
Madalena repassa premiada experiência adquirida nos lixões a quem precisa de trabalho (foto: Luiz Ribeiro/em/D.A Press)

Itaúna – Todo mês, pelo menos 530 toneladas de lixo chegam à Usina de Reciclagem de Itaúna, no Centro-Oeste de Minas. O material, antes jogado em lixões de forma inadequada, ganhou novo destino e se transforma em fonte de emprego e renda. A mudança começou em 1999, pelas mãos de Madalena Duarte Rodrigues. Com a ajuda de catadores e sindicalistas, ela fundou a Cooperativa dos Catadores de Materiais Recicláveis de Itaúna (Coopert), hoje responsável pela coleta seletiva na cidade.

Filha de dona de casa e de trabalhador rural, Madalena, hoje com 52 anos, começou a trabalhar em meio aos resíduos ainda criança. Aos 7 anos, decidiu, com as duas irmãs, de 8 e 10, que era hora de ajudar em casa. O pai tinha que sustentar 15 filhos. Para ter mais conforto, Madalena passou a distribuir o tempo entre a escola e o lixão. “Ficava estudando até as 11h. Das 12h as 19h, ficava no lixão. Quando recebia o dinheiro, comprávamos gás de cozinha, leite, pão e outras coisas de comer para a família.”

Conta que a mãe não gostava de ver as filhas pequenas no lixão e constantemente pedia que elas parassem de ir. “Mas a vida era muito apertada e precisávamos de dinheiro”. A ideia de trabalhar em meio aos detritos surgiu quando ela e as irmãs passaram a observar duas catadoras e pensaram: por que não fazer o mesmo para ajudar nas despesas? “Víamos a dona Mariinha e dona Bárbara sair de manhã e voltar à tarde. Carregavam material reciclável até na cabeça e vendiam para um atravessador. Um dia, decidimos fazer a mesma coisa.”

No lixão, Madalena amadureceu antes do tempo. Ela se lembra da convivência, na infância e adolescência, com usuários de droga e animais peçonhentos. Até os 16 anos, o único emprego que teve foi de catadora, até que conseguiu trabalho como babá. Ainda assim, não abandonou o lixão e nas horas vagas – incluindo fins de semana e feriados – ganhava algum dinheiro com a venda de papelão, plástico e vidros. “Mesmo casada, não deixei de trabalhar como catadora. A experiência mais traumática que tive foi na infância, quando um copo de vidro de liquidificador caiu no pé da minha irmã e fez um corte profundo. Saiu muito sangue e percebemos que ali era um lugar perigoso.”

USINA Em meados da década de 1990, Madalena assistiu na TV a uma matéria sobre a Associação dos Catadores de Papel, Papelão e Material Reaproveitável de Belo Horizonte (Asmare). Ela, que sonhava “humanizar” o trabalho no lixão, percebeu que era preciso criar uma cooperativa para organizar o serviço e garantir os direitos dos catadores. Em 1999, quando Itaúna passou por uma crise financeira, que o projeto deslanchou. “Houve desemprego na época e o Sindicato dos Metalúrgicos nos procurou para ajudar no projeto da cooperativa, que havia saído do papel mas ainda não estava estruturado. Montamos a usina de reciclagem e muita gente que estava sem emprego conseguiu se restabelecer trabalhando conosco. Quando a crise passou, alguns voltaram para a indústria. Outros continuaram.”

Hoje, 86 pessoas trabalham na Coopert e o salário médio é de cerca de R$ 2,5 mil. Madalena conta que das quase 530 toneladas recolhidas ao mês, 121 vão para o aterro. O restante é comercializado e o lucro dividido entre os cooperados. “Depois de pagarmos as contas, rateamos o restante entre os cooperados, levando em conta as horas trabalhadas. Antes da cooperativa, trabalhávamos sem perspectiva. Hoje, todos têm condição de ter casa e garantir um bom estudo aos filhos.”

Madalena sente orgulho em contar que as duas filhas estudam e uma delas cursa pedagogia. Nenhuma frequentou o lixão ou trabalhou com reciclagem. “Consegui dar às minhas filhas um futuro melhor, graças ao lixo. Nunca precisaram trabalhar como eu. Puderam estudar e estão encaminhadas na vida. De todas as minhas vitórias, essa é a mais importante.”

Além de fundadora da Coopert, ela é coordenadora do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), cofundadora e membro da Rede Cataunidos e representante do Brasil na Rede Latino-Americana. Já foi premiada e homenageada em várias oportunidades, inclusive no Chile e na Colômbia. Recentemente, foi indicada ao Prêmio Betinho – Atitude Cidadã 2013.

Emocionada, se diz realizada ao fazer a diferença na vida de pessoas que não tinham expectativa e que hoje estão empregadas. “Nunca imaginei fazer tudo isso. Queria melhorar a minha vida e a de todos que trabalhavam comigo. Lembro que em 1999 quando, graças ao apoio da Asmare, conseguimos fazer um curso de capacitação na Faculdade Milton Campos, teve catador que chorou porque pela primeira vez entrava em uma universidade. Hoje, geramos emprego, renda e ajudamos a preservar o meio ambiente.”


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