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Estado de Minas ESPECIAL ONTEM E HOJE

Sociedade de Conceição do Mato Dentro luta para se reconhecer

Palco de reportagem emblemática em 1966, Conceição do Mato Dentro é, quase meio século depois, uma cidade que não se desapega do passado nem se acostuma às mudanças do presente. Progresso altera padrões de comportamento e cria uma sociedade diferente


postado em 06/04/2012 06:48 / atualizado em 06/04/2012 08:36

Na área central da cidade, calmaria de outros tempos deu lugar a movimento de automóveis, muitos a serviço de mineradora(foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
Na área central da cidade, calmaria de outros tempos deu lugar a movimento de automóveis, muitos a serviço de mineradora (foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
Os saltos dos sapatos vacilam entre as pedras do calçamento pé de moleque da avenida, mas as moças não param de andar de um lado para o outro, aos cochichos. De pé no passeio, Paulinho da Moureirinha, Tião e outros rapazes observam, gracejam, fazem pose. De vez em quando, o desfile abre caminho para o jipe de algum motorista de praça, ancestral do profissional que veio a ser conhecido como taxista. Estamos em meados da década de 1960 e as janelas do charmoso Éden Clube já estão iluminadas para mais um baile de domingo. A lua avança no céu de Conceição do Mato Dentro, cidadezinha distante 175 quilômetros de Belo Horizonte.

Mais de quatro décadas depois, os agora aposentados Paulo da Silva Nascimento, de 70 anos, e Sebastião de Oliveira Filho, de 60, olham o vaivém da mesma avenida. A paisagem mudou. O tráfego de automóveis quase não para. O ronco de uma moto atrapalha a conversa do casal de namorados sentado num banco. As luzes do desativado Éden Clube estão apagadas. A mesma lua avança, indiferente ao saudosismo de Paulo: “Ah, era mil vezes melhor. Antes, era o perfume das moças. Agora, é a fumaça dos carros.”

E pensar que em 1966, quando o jornalista José Carlos Marão esteve no pequeno município da Região Central mineira, avistou apenas três carros de passeio. A ideia da reportagem “Nossa cidade”, escrita pelo paulista Marão e publicada em maio daquele ano na edição nº 2 da revista Realidade, era mostrar a vida de uma cidadezinha do interior do Brasil. O lugar a ser visitado precisava ser representativo: nem no Norte, nem no Sul; nem litoral, nem sertão; não muito grande, mas maior que um povoado. Conceição foi a escolha do mensário de circulação nacional publicado pela editora Abril até 1976 e que se tornou referência pela excelência de suas reportagens.

É difícil acreditar que a cidade descrita na revista é a mesma visitada quase 50 anos mais tarde pela equipe do Estado de Minas. Como dezenas de outras cidades mineiras, Conceição enfrenta as dores do crescimento. Vizinhos ainda conversam sentados na frente de casa, mas o jeito típico de cidade pequena desbota aos poucos. Às vezes, parece um filme com erros de continuidade temporal, uma película antiga em que elementos contemporâneos são inseridos de forma nada sutil.

Em 1966, o repórter constatou: quem chegava a Conceição dava logo com a Avenida Bias Fortes – até hoje sucintamente conhecida apenas como “a Avenida”. Seguindo direto, “depois de passar pelo correio, a matriz, a Farmácia Guerra”, virava “à esquerda da loja do seu Rajão” e chegava “ao largo do mercado, que com a Igreja do Rosário é o subcentro da cidade”.

Meio século depois, já não é possível repetir o percurso à risca. Agora, a agência dos Correios fica depois da matriz, fechada em 2005 para uma reforma jamais iniciada. O relógio do templo deteriorado marca sempre a mesma hora: 4h58. Mas ninguém sabe ao certo quando os ponteiros empacaram. Já a farmácia foi fechada em 1999, após a morte de Silvério Costa Guerra, o seu Guerra.

A loja do seu Rajão deixou de existir em 1988, também com a morte do proprietário, o português Carlos Custódio Rajão. Os filhos logo venderam o prédio azul de esquina a um antigo empregado e amigo do falecido, José dos Santos Lages. E o ponto comercial reabriu, rebatizado Loja Zé Lages. Continua a negociar quase tudo: perfumes, calçados, louças, mochilas, tesouras, ferros de passar, relógios, artigos de cama, mesa e banho, mais dois ou três etcéteras. Só não vende mais tecidos. Hoje o povo só quer saber de roupa pronta.

Aos 73 anos, Zé Lages continua ali, atrás do balcão, ao lado de uma balança antiga. Hoje, pena para conquistar a “turma jovem“, que “quer comprar nessas lojinhas novas, que têm um manequim bonito...” Mas o pessoal mais velho continua a frequentar o ponto, onde sempre encontra boa prosa. Zé Lages gosta de contar histórias, que narra com os olhos azuis estreitados pelo sorriso quase ininterrupto. Na infância, ele morava na roça e ia à cidade para cumprir tarefas a mando dos pais. Como não sabia onde ficava, saía perguntando e seguindo quem indicava o caminho. Tanto a cena se repetiu que veio o apelido: Zé Rabinho.

Zé Lages vai se enfiando por outro enredo quando entra na loja senhora elegante, os óculos escuros sobre o cabelo preto. “Ô, dona Célia“, cumprimenta. E emenda: “A gente se conhece há muitos anos, desde o tempo do clube, né?“ É a deixa para Maria Célia Costa, de 74 anos, contar seus casos. “O melhor de Conceição era quando eu transitava lá pro Éden“, garante. E ela tem do que se gabar.

Na adolescência, Célia era uma morena admirada no footing, em um trecho entre a avenida e o Éden Clube. O termo em inglês definia os momentos de passeio, especialmente nas noites de feriado e domingos, quando moças e rapazes se paqueravam. Tudo com muito respeito, por meio de olhares. Após duas ou três voltas na rua, era comum que a mocinha, percebendo o interesse, parasse diante do Banco do Brasil. A única agência da época – hoje há duas concorrentes, além da casa lotérica – era o ponto onde as amigas deixavam a jovem sozinha, para encorajar o pretendente a se aproximar.

Depois do footing, parte da turma se aprontava para dançar no Éden: gente malvestida era barrada na porta. E não adiantava ser sócio ou ter comprado o bilhete. Homens adotavam terno e sapato, brilhando de engraxado. As mulheres paravam no salão de beleza de Ilda Ribeiro de Miranda, citada no texto de Realidade. Ela não se lembrava da reportagem, mas há de ser mesmo ela, “porque aqui só há três Ildas e só uma tinha salão“.

Era fácil assim saber de quem se estava falando há mais de 40 anos, época em que todos pareciam se conhecer em Conceição. Quem não lembrava o nome do sujeito já tinha visto o rosto ou sabia onde morava, e que era filho dessa, irmão daquele. “A gente ficava sabendo das fofocas. Todas. Num minuto, ficava conhecendo todo mundo e a vida de todo mundo”, relata Ilda, a do salão, aos 79 anos.
As fofocas não têm mais o mesmo alcance. A população atual – 18 mil habitantes, segundo o Censo 2010 do IBGE – diminuiu, se comparada a 1970, quando havia 20,6 mil pessoas. No entanto, naquela época, 34% dos habitantes (7 mil ) viviam em zona urbana, frente aos 68% (12,3 mil) atuais.

Os números ajudam a explicar por que, na sede do município, os jovens não podem dizer que conhecem todo mundo. A outra explicação vem do fato de que Conceição tem recebido muitos rostos estranhos, oriundos de diversos estados do país. São atraídos pelas obras da multinacional Anglo American, uma das maiores mineradoras do mundo. A exploração do minério de ferro entranhado no município deve ser iniciada no segundo semestre de 2013 e se prolongar por 40 anos.

O empreendimento emprega cerca de 4,2 mil trabalhadores, distribuídos pelos quadros da Anglo e de 25 terceirizadas. Eles ajudam a mudar rapidamente o cotidiano. Há pouco mais de um ano, as ruas ainda tomadas pela neblina da madrugada despertavam por volta das 6h da manhã, com a abertura das padarias. Hoje, antes do canto do galo há trabalhadores uniformizados pelas calçadas, seguindo para os canteiros de obras.

Não há semáforos, nem faixas de pedestres, mas é preciso ter cuidado com o tráfego intenso durante o dia, especialmente nas avenidas Bias Fortes e JK. Os automóveis disputam espaço com cavalos que, montados ou não, vêm de fazendas e sítios das redondezas. No fim da tarde, a poeira sobe com o retorno das camionetes estampadas com as marcas das empresas. Os ônibus descarregam os trabalhadores na avenida, antes de seguir para a garagem.


Corrida do minério

Hotéis e pousadas chegam a reservar todos os quartos para as terceirizadas. Uma casa simples, de quatro cômodos, antes alugada por um salário mínimo, agora custa até R$ 4 mil. Os comerciantes estão animados. João de Matos Seabra, o João Biá, de 80 anos, dono de mercearia no Centro, conta que os lucros, desde o começo das obras, aumentaram 60%. No dia anterior, João Biá havia negociado R$ 4 mil em queijos. E, no meio daquela tarde de quinta-feira, tirou um maço grosso de notas do bolso: já tinha vendido mais R$ 2 mil.

Na entrada da cidade, foi inaugurado, em 2010, o Point Boa Praça. Para os moradores, é “o shopping”. É um empreendimento de grande porte, com supermercado de 4 mil metros quadrados e 11 lojas. “A gente viu que a cidade ia crescer. Muito dinheiro está circulando por aqui. Para o comércio, a mineração está sendo uma maravilha“, avalia Daniel Costa, proprietário do centro de compras. “Ganhamos um milionário por semana”, estima o tenente Roger Vinícius Silva, há cinco anos comandante do pelotão da Polícia Militar da cidade. Ele se refere aos lavradores que recebem uma fortuna pelas terras vendidas para abrir caminho à mineração.

No entanto, nem todos os novos ricos estão satisfeitos, e o tenente sabe disso. Em julho de 2008, ele deteve o produtor rural Sebastião Pimenta, que impedia a entrada de trabalhadores de uma terceirizada na propriedade legada por seu pai aos 12 filhos, em um distrito do município. Um dos herdeiros havia vendido uma porção do terreno, mas os limites dos lotes eram nebulosos, segundo o lavrador. Até hoje, aos 49 anos, ele alega que os operários queriam invadir terra pertencente a ele, à mãe e aos dois irmãos com que morava.

Mas em dezembro daquele ano de 2008, os quatro parentes venderam por mais de R$ 2 milhões uma área avaliada em cerca de R$ 400 mil antes da mineração. De início, recusavam, “mas era pressão demais”, define Sebastião, conhecido como Tião Muletas. Ele conta que operários despejavam, próximo à sua casa, esgoto em um córrego usado para lavar roupa e como bebedouro para o gado. “Também começaram a jogar na água um químico: ela ficou branca, depois escureceu“, descreve. Os trabalhadores faziam ameaças, diz o lavrador: “Minha mãe chorava demais, tinha medo que matassem a gente”. Atualmente, os quatro moram em uma casa na periferia e estão se desfazendo das cabeças de gado.

Reclamações de produtores rurais insatisfeitos continuam a chegar à prefeitura. “Lá (nas áreas atingidas pelo empreendimento da Anglo), o bicho tá pegando“ resume o prefeito Reinaldo César de Lima Guimarães (PMDB). Antes de assumir o cargo, ele foi advogado de lavradores. “A Anglo prometia uma coisa e fazia outra. Tem gente que recebeu 30% (do valor da venda do terreno) há um ano e ainda não recebeu o restante“, denuncia, engrossando o coro que envolve também queixas sobre danos à natureza, feitas por lavradores e organizações não governamentais. A multinacional rebate as críticas. “Todas as condicionantes foram consideradas cumpridas pela Superintendência Regional de Meio Ambiente. Estamos em dia”, afirma José Centeno, gerente geral de desenvolvimento sustentável da Anglo.

A cidade que encolheu

O território atual de Conceição do Mato Dentro foi fixado em dezembro de 1962, quando três distritos se tornaram municípios independentes: Congonhas do Norte, Santo Antônio do Rio Abaixo e São Sebastião do Rio Preto. Por isso, a população de Conceição apresenta uma drástica diferença entre os censos do IBGE de 1960 (35,5 mil habitantes) e 1970 (20,6 mil). Em 2010, o mais recente levantamento registrou um total de 18 mil habitantes.

Forasteiros e filhos de Conceição

As mudanças que chegaram com a mineração não se resumem à economia. Na cidade, que não tem mendicância, os índices de violência continuam baixos, mas as apreensões de drogas, principalmente maconha e crack, aumentaram substancialmente desde 2010, segundo a Polícia Militar. “O número de pessoas cresceu e a demanda por drogas também“, explica o tenente Roger. Ainda assim, ele é favorável à chegada dos forasteiros. “A mineração oxigena Conceição. Outras culturas, outros sotaques. Você escuta muito o pessoal usar a expressão 'filho de Conceição'. Já ouvi defenderem que os policiais sejam 'filhos de Conceição'. Isso é muito provinciano. Não é porque é daqui que é melhor“, opina.

Nem todos concordam. “Aqui, não há mais o que se chama paz. Hoje, você não pode confiar mais em ninguém, precisa trancar a porta de casa“, ressente-se Rosilene Rialva Ferreira, de 48 anos. “Vem gente de todo estado. Eles mesmos fazem questão de mostrar que são peões“, diz. A mãe de Rosilene, Hilda Fabiano Ferreira, administra o Hotel Ubaldina, situado na avenida, e lamenta que as jovens da cidade se atraiam por “esses homens mal-educados“. “Umas mocinhas ficam doidas atrás deles, estão muito assanhadas. As mães não estão tendo pulso para mantê-las por perto“, critica Hilda.

Pelo visto, não há mais na cidade o problema da escassez de companhia. Há 40 anos, as moças reclamavam de haver poucos pretendentes. Rapazes iam embora para estudar ou trabalhar, principalmente em Belo Horizonte, enquanto elas se formavam na escola normal e ficavam lecionando. Em 1970, a sede de Conceição, parte que normalmente se chama de “Cidade“, tinha 5,2 mil moradores, sendo 2,38 mil homens e 2,87 mil mulheres. A diferença numérica (cerca de 500) parece ser pequena, mas naquele universo representava 10% mais população feminina.

Era uma época em que “moça direita” só saía de casa acompanhada, e não ficava na rua depois das 10h da noite. Os namoros costumavam progredir lentamente. De início, era só conversa e mãos dadas. Abraços e beijos surgiam quando o casal estava junto havia algum tempo. E os pais, quando aprovavam o relacionamento, vigiavam para que as etapas se sucedessem sem atropelo.

As coisas mudaram… A reportagem de Realidade informou que em 1966 a farmácia mais famosa da cidade, a do seu Guerra, vendia 60 caixas de pílulas anticoncepcionais por mês. Hoje, a movimentada Drogaria Vitally, localizada na Avenida, vende cerca de 25 caixas por dia, descontadas as 15 caixas de pílulas do dia seguinte. Preservativos também têm boa saída: são 10 pacotes diários. Não há dúvida: há mais sexo em Conceição. Ou, pelo menos, mais pessoas fazendo sexo com proteção.

O Canela Roxa


Nem tudo em Conceição mudou como o comportamento sexual. Assim como hoje, as opções de lazer de antigamente costumavam não misturar pessoas de diferentes classes sociais. Se o Éden Clube promovia os encontros do society de Conceição, um prédio em esquina vizinha, onde está instalada a loja Gouveia Móveis, sediava as festas de quem tinha pouco dinheiro sobrando. Era o baile do “canela roxa”, cujos frequentadores tinham, quase todos, pele escura.

Zé Lages, branco de olhos azuis, foi algumas vezes ao “canela roxa”. “Era o pessoal da periferia, e a gente acabava indo se misturar lá no meio”, ri. Lá, bastava pagar para entrar. No Éden, a seleção era rigorosa. “A pessoa de cor não passava pela porta”, diz Zé Lages, relembrando distinção impensável para os padrões modernos. Acontecia de ter ingresso à venda e o bilheteiro dizer que não havia mais, quando quem queria comprar não se adequava. O taxista José Marino Ferreira, o Candixa, de 65 anos, foi outro que viu negros serem barrados no Éden. “Dava bate-boca, mas o porteiro não deixava”, relata.

Os habitués do “canela roxa”, extinto há uns 30 anos, moravam em bairros até hoje habitados por gente simples. Nesses subúrbios, a exemplo do que acontece nas grandes metrópoles, parece haver mais crianças do que no resto da cidade, talvez por elas brincarem mais nas ruas. Em uma tarde de quarta, os amigos Marlon, Ronald, Dalton e Ramon desciam uma ladeira sentados em um carrinho de madeira. As rodas traseiras vieram de uma cadeira de rodas. Pedaços de sandália de borracha, presos com pregos, revestiam o encosto do banco. Marlon, de 12 anos, já ia lá embaixo, no final da ladeira, quando o carrinho virou. Voltou enfezado, limpando com a camisa o sangue que escorria pelos arranhões. “Ô Marlinho, mostra pra minha mãe, não. Senão ela briga com nós”, pediu um dos garotos.

Perto dali, no pé de um dos barrancos, em uma manhã de domingo, sete meninos tomavam banho no Olaria, córrego que seguramente era menos sujo no anos 1960. Quatro deles moram em uma casa baixa de quatro cômodos e teto de amianto. Na sala, há televisão a cabo, aparelhos de DVD e som. Mas para chegar à cozinha é preciso descer escada tosca de madeira.

É retrato de muitas das casas da periferia de Conceição. Uma comunidade que cresceu desde a visita da Realidade, em grande parte inflada por gente que veio dos distritos, onde trabalhava na roça ou fazia bicos diversos.

Aula de realidade

A revista Realidade, apesar de publicada por apenas uma década, tornou-se modelo de excelência para os jornalistas brasileiros. Até hoje, é tema de livros e trabalhos acadêmicos. Inspirada no new journalism norte-americano – cultivado por Truman Capote, Gay Talese, Tom Wolfe e outros autores –, apresentava reportagens de apuração extensa e texto enriquecido com recursos da literatura, como descrições pormenorizadas e reprodução de diálogos.

Realidade não tinha completado um ano quando o repórter José Carlos Marão esteve em Conceição do Mato Dentro. A reportagem “Nossa cidade“ retratou os principais personagens e hábitos do lugar. O texto foi reproduzido na coletânea Realidade Re-vista (editora Realejo, 436 páginas), organizada por Marão e José Hamilton Ribeiro. No livro, afirma-se, erroneamente, que o trabalho foi publicado em outubro de 1966, na edição n° 6 do mensário. Na verdade, saiu em maio daquele ano, na edição nº 2.

A viagem foi feita “no finzinho de 1965 ou comecinho de 1966“, segundo Marão. A principal razão para a escolha da cidade foi o fato de nela ter nascido José Aparecido de Oliveira, falecido em 2007. “Era um nome muito importante em Minas“, justifica Marão, em entrevista ao Estado de Minas.

O forasteiro foi bem recebido e chegou a fazer amizades. Porém, a publicação da reportagem acabou frustrando muita gente. “Zé Aparecido gostou muito, mas a população queria me execrar. O próprio Zé Aparecido me convidou para jantar na casa dele e me contou que o pessoal estava revoltado“, conta Marão.

O comerciante José Lages dos Santos, de 73 anos, era o distribuidor de Realidade em Conceição. “Essa edição vendeu muito, muito! Todo mundo queria“, comenta. “Muita gente achou bom, porque estava fazendo publicidade da cidade, mas muitos não gostaram, porque era publicidade negativa, né? Não falou nada sobre as coisas positivas, como os monumentos históricos, os filhos ilustres“, explica. Marão se defende: “O pessoal do interior está muito ligado aos filhos ilustres, mas o objetivo era fazer uma matéria que retratasse a população da cidade. Esse objetivo foi cumprido“.

O professor aposentado Antonio Magno, hoje com 68 anos, ainda guarda rancor. “A Realidade foi muito errada. Só denegriu Conceição. Fizeram besteira. Anota aí: besteira!“, queixa-se. A reportagem menciona Magno uma única vez, ao revelar que a briga dele com a então namorada vinha sendo o principal assunto da cidade. Informado da reação, Marão se disse surpreso: “Não passou pela minha cabeça que falar de um namoro rompido pudesse ser tão grave. Mas, pensado bem, eu invadi a privacidade do personagem. Tenho que fazer uma autocrítica, mas é muito tarde para isso”.

O jornalista reconhece outra falha: na reportagem, considerou apenas o cotidiano da “alta sociedade“. Por isso, antes da conversa com o Estado de Minas, nunca tinha ouvido falar no baile do “canela roxa“, frequentado por gente de renda mais baixa. “Pra você ver: nessa aí eu bobeei. Talvez porque todos os meus informantes fossem dessa tal sociedade – uma classe média que, mais ou menos, ditava os costumes.”


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