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Estado de Minas

Falsificação de carteira de estudante e boleto de universidade vira rotina na internet

As fraudes são para facilitar meia-entrada em teatros e cinemas e outros eventos. Crime fica impune


14/09/2011 06:20 - atualizado 14/09/2011 07:22

Fila para compra de ingressos no Cinemark do Shopping Pátio Savassi
Fila para compra de ingressos no Cinemark do Shopping Pátio Savassi (foto: Marcos Vieira/Estado de Minas - 15/02/2005 )

Os apelos para a falsificação estão em toda parte, sem qualquer cerimônia ou medo de punição. Na internet, anúncios atraem os interessados e escancaram o esquema de fraude na emissão de carteiras de estudantes. Também no boca a boca pela capital e interior, circula até a indicação de programas de computador para a confecção de documentos ilegais. Tudo isso para tirar proveito da meia-entrada em shows, teatros, cinemas e outros eventos culturais de Minas. Com a vista grossa de entidades estudantis, quem paga a conta – ou melhor, os preços exorbitantes dos ingressos – também está na fila das bilheterias, mas sem direito ao desconto.

Nos principais shows promovidos este ano em Belo Horizonte, a exemplo de Avril Lavigne, Ozzy Osbourne, Roxette e Erasure, nada menos que 40% do público era composto de beneficiados pela meia-entrada, segundo produtores culturais. Nas mais de 60 salas de cinema da capital, uma média de 75% das poltronas são ocupadas via carteira estudantil, de acordo com o Sindicato das Empresas Cinematográficas de Minas Gerais. Nessas plateias, alunos regularmente matriculados nas escolas de nível fundamental e médio ou nas universidades dividem espaço com os que burlam a lei e apresentam documentos falsificados para ganhar o desconto de 50% no valor do ingresso.

Com vergonha de mostrar o rosto e revelar a identidade, mas não de dar detalhes do esquema de falsificação, o publicitário C.S.L., de 29 anos, conta que viu na internet um anúncio para baixar no próprio computador um sistema de emissão de boletos bancários com o timbre de uma universidade e os dados pessoais do interessado na carteira de estudante. “Basta imprimir esse boleto com nome e número de documento e apresentá-lo no guichê do cinema ou na portaria de um show para ter direito à meia-entrada. A cada seis meses renovo o meu. Sei que não estou sendo muito honesto, mas não vejo outra opção, pois os ingressos dos grandes espetáculos são caríssimos e eu não teria condição de pagar o preço integral”, conta o publicitário.

A técnica em contabilidade L.G., de 32, também confessa que usufrui dos benefícios da meia-entrada mesmo estando há mais de uma década longe das salas de aula. Adepta do sistema de emissão de boletos de uma faculdade pela internet, ela conta que usa o documento para conseguir a carteira de estudante original. “Uma amiga me mostrou o site no início do ano e acabei não resistindo. Mas fiquei com medo de os funcionários da bilheteria do cinema desconfiarem que o documento era falso, porque ele é muito ‘rústico’. Por isso, levo o boleto no escritório de uma união estudantil no Centro de BH e consigo a carteirinha legítima. Vejo filmes toda semana e, de vez em quando, assisto a shows e nunca tive problemas.”

Mas, muitas vezes, não é preciso nem fraudar boletos ou comprovantes de matrícula para ter acesso a carteiras. Em escolas de idioma ou cursos pré-vestibulares, pessoas sem qualquer vínculo estudantil conseguem ter acesso a formulários com carimbo das instituições de ensino. “Minha irmã mandou fazer na escola de inglês dela uma carteirinha com todos os meus dados, pagando apenas R$ 5. Como ela tem validade até 2013, achei que compensava”, conta a comerciante J.F., de 26.

Preços altos

Na avaliação do diretor do Sindicato das Empresas Cinematográficas de Minas Gerais, Lúcio Otoni, o público com acesso à meia-entrada tem crescido nos últimos anos, o que leva as salas de exibição a aumentarem os preços para compensar os descontos. “Com a emissão descontrolada de carteirinhas, cerca de 75% dos ingressos são vendidos hoje pela metade do valor. Se não tivesse tanta gente nessa condição, os preços poderiam ser mais acessíveis para todos. Mas a empresa precisa de um faturamento mínimo para pagar as despesas”, defende Lúcio.

Diretora executiva da Nó de Rosa, empresa responsável por pelo menos oito grandes shows na capital este ano, a produtora cultural Márcia Ribeiro critica a meia-entrada “O governo me obriga a conceder um benefício aos estudantes sem me oferecer, em contrapartida, nenhum subsídio. Considero isso uma ingerência no meu negócio. A lei é absurda e a indústria da falsificação apenas exacerba essa aberração”, diz. Questionada sobre os altos preços dos espetáculos, Márcia argumenta que o cálculo do valor do ingresso não é feito com base no percentual de estudantes que deve participar. “Não não temos conhecimento sobre esse dado antes da venda dos tíquetes. O preço é calculado com base nos custos do evento e da capacidade de pessoas do local,” diz.

Falsificação dá até 5 anos de cadeia

De tão corriqueira e usual, a falsificação da carteira de estudantes foi banalizada e nem é vista por muitos como crime. Mas o advogado criminalista e conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Minas Gerais, Sérgio Leonardo, alerta que a confecção e o uso configuram três crimes e o autor pode ser preso em flagrante e responder a inquérito. Segundo ele, pode ficar caracterizado o desrespeito aos artigos 298, 299 e 304 do Código Penal, que tratam de falsidade ideológica, falsificação e uso de documento particular, com pena de um a cinco anos de reclusão. “O benefício aos estudantes deveria ficar restrito a eles, que precisam do estímulo cultural e presumivelmente não têm renda para pagar o ingresso integral”, diz o advogado.
A adulteração de documentos ganha força com a vista grossa de entidades como a União Brasileira dos Estudantes Nacionais (Uben), autorizada pela Lei Estadual nº 11.052, de 23/3/1993, a confeccionar o documento e citada em anúncios na internet. “Nunca tivemos registros de documentos falsos. Exigimos que a pessoa comprove ser mesmo estudante e, em caso de dúvida, ligamos para as escolas ou universidades”, diz o fundador da Uben, Aloísio Machado.

Carteira falsa encomendada pela internet



Anúncios oferecendo carteira a quem não estuda são encontrados facilmente na rede, inclusive para BH, como o seguinte:

“Carteirinha de estudante com declaração escolar para não estudantes / Belo Horizonte / não perca tempo. Ligue agora e peça sua carteirinha de estudante. Mesmo que você não seja um estudante fazemos sua declaração estudantil e sua carteira de estudante. Tudo de forma legal e segura para você. Você poderá pagar meia entrada em cinemas, jogos esportivo (sic), jogos de futebol, shows e muitos outros. Pense na economia que você faria. Carteirinha autenticada pela Uben – União Brasileira dos Estudantes Nacionais. Ligue agora: XXXXXXX Não perca tempo.”


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