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Mineira brilha alto no carnaval carioca

Maria Helena Cadar realizou o sonho de desfilar como destaque em escola de samba do Rio de Janeiro


postado em 03/03/2019 05:09

(foto: rodrigo clemente/em/d. apress)
(foto: rodrigo clemente/em/d. apress)



Nem tudo são flores na vida de uma foliã. A empresária Maria Helena Salum Cadar teve uma vida difícil. Perdeu o pai quando tinha 13 anos, e com a mesma idade sua filha Alessandra morreu vítima de um aneurisma. Porém, Maria Helena decidiu viver. Como ela mesmo definiu, a escolha era em mal sofrer ou bem sofrer e fez a segunda opção, ao lado do marido, Emir Cadar, seu grande amor, e do filho Emirzinho. Cheia de vida e alegria, conta sobre a vida de forma inabalável, segurança que afirma vir de Deus e de sua fé.

 

Seus pais são árabes?
Meu pai, Bady Salum é de família árabe, libanesa, e se casou com uma brasileira, Neusa Junqueira. Sou a primogênita de cinco irmãos. Meu nasceu no Brasil, mas a família árabe é muito grande e muito unida, com tradições muito arraigadas e é também uma família muito amorosa.

Com essa mistura, vocês foram criados mais dentro da cultura libanesa ou brasileira?
Nossa criação foi um pouco misturada, mas a essência da educação foi bem síria. Todo sábado à noite íamos na casa da minha tia mais velha, Rosinha Cadar, que era a “mãezona” de meu pai. Mas não tive aquela parte da educação de aprender a cozinhar desde cedo. Nossa educação foi muito rígida, e enérgica. Meu pai cobrava estudo de todos nós, passou todos os princípios e não deixava a gente ir na casa de amigos, ficávamos fechados dentro de casa, e como éramos cinco, com diferença de idade de um ano e dois meses entre cada um, ou seja, todos na mesma faixa etária, brincávamos entre nós mesmos. Isso formou nosso caráter reto, nos ensinou a saber a hora da alegria e a hora de ter o pé no chão.

A família era muito alegre e festeira?
Sim, tanto a da minha mãe quanto a do meu pai. A do meu pai então, era enorme e gostava de comemorar todas as datas importantes, carnaval, festa junina, Natal, semana santa, por sinal, os árabes dão um valor absurdo à Páscoa, que é o renascimento de Cristo. Até o futebol é festa. A família é toda atleticana. Sempre nos encontramos para celebrar. E também chorar juntos. O sentimento é à flor da pele, e por ser muito unida, sempre sentimos muito a perda de qualquer parente. Vivíamos intensamente.

Então era festa sempre?
A casa da tia Rosinha era uma alegria, uma festa todo dia. Em época de carnaval, a casa dela virava quase um atelier, todo mundo fazendo e bordando fantasias. Íamos em todas as matinês. Quando tinha 13 anos, Emir nos levou , pela primeira vez, no baile noturno de carnaval da Sociedade Mineira dos Engenheiros. Fomos mamãe, papai e eu. Achei o máximo. Pensei que ia abafar. Cheguei lá, o Emir grudou do meu lado e não deixou ninguém olhar para a minha cara. Fui no baile e fiquei com o primo (risos).

Como foi sua adolescência?
Não tive adolescência. Pulei da infância para a vida adulta. Perdi meu pai quando tinha 13 para 14 anos. Ele era engenheiro do Banco Hipotecário, foi receber uma obra para o banco e teve um acidente. Faleceu aos 46 anos de idade. Mamãe ficou com 38 anos e cinco filhos pequenos. Ela era muito delicada, não tinha muito iniciativa, chorava muito. Sua morte me fez fazer ficar adulta antes da hora, porque passei a ser o braço direito dela.

Como começou a namorar o Emir?
Ele é o filho mais novo da minha tia Rosinha. Trabalhou com meu pai logo que se formou em engenharia. Por serem primos eram muito unidos, e o fato de trabalharem juntos solidificou mais ainda a amizade. Depois que papai morreu, Emir teve um carinho muito grande conosco. Ia lá em casa todos os dias saber se precisávamos de alguma coisa. Até aos sábados à noite, passava lá com as namoradas – porque ele era muito namorador, namorou meia Belo Horizonte. Isso nos aproximou mais e em abril do ano seguinte, antes de completar um ano da morte do meu pai, começamos a namorar. Tia Rosinha tinha se transformado em uma segunda mãe para a minha mãe, e passou a ser a minha sogra. Acho que a morte do papai nos aproximou mais, porque o Emir é um homem extremamente sensível, sentimental, em palavras e atitudes. Fomos criados muito juntos.

Quando se casaram?
Depois de dois anos e pouco de namoro e noivado. Comecei a namorar com 15, fiz 18 em fevereiro e fiquei noiva, e me casei em abril, assim que nossa casa ficou pronta. Emir foi quem a construiu, na Pampulha, uma casa para cinco filhos, mas tivemos só dois, Alessandra e Emir Filho. A diferença entre eles é de 10 meses de 20 dias. Fiquei 18 meses grávida (risos). Tudo foi muito rápido na minha vida. Dia 16 de abril faremos 48 anos de casados.

Ele foi seu primeiro namorado?
Foi meu primeiro e único namorado. Amo o Emir mais do que tudo e todos. Só não o amo mais do que a Deus. Mas, já disse isso para a minha mãe e para meus filhos. Porque foi com ele que construi meu núcleo familiar.

Como entrou o amor pelo carnaval na sua vida?
É de nascença. Nasci em um sábado de carnaval. Minha mãe sempre amou carnaval e no dia em que ela saiu do hospital comigo, meu pai pediu ao táxi que desse uma volta no Centro para que ela visse a cidade enfeitada. Desde pequena sou carnavalesca. Minha mãe comprava fantasia para todos os filhos na Gurilândia, loja que tinha na Rua São Paulo. A família da minha mãe era ligada em carnaval e a do meu pai era ligada o triplo. Meu sogro era presidente da União Síria, então todos nós íamos nas matinês de dia e os adultos nos bailes à noite. Era aquela farra.

E depois que teve seus filhos, como fazia?
Levava os meninos na matinê e depois ia com o Emir nos bailes. A vida toda. E sempre fantasiei os meninos. Íamos para o carnaval em Araxá. Alessandra já ganhou concurso de fantasia lá. Sempre gostei do carnaval do Rio de Janeiro e Emir também. Meu pai adorava desfile de escola de samba. Em 1987, fizemos uma férias muito movimentada, viajamos muito e passaríamos o carnaval em Araxá. Fui em uma costureira e pedi ela para fazer as fantasias de Alessandra, uma mais lunática e outra de cigana.

Ela ganhou?
Infelizmente, ela não participou do carnaval nesse ano. Uma semana antes ela queria ir a um show. Faríamos um almoço na fazenda para receber um casal de fora da cidade, e o motorista foi buscá-la na fazenda para levá-la na casa da amiga, com quem iria ao show. Quando estava aprontando, teve um mal-estar. Os pais da colega a levaram ao médico e nos chamaram. Fizeram vários exames, mas não decobriram nada. Fomos para casa, e meu irmão, que é médico foi passar a noite conosco. Infelizmente, de manhã cedinho ela faleceu, vítima de um aneurisma cerebral. Uma menina que fazia balé clássico, sapateado, jazz, jogava tênis e era da equipe de natação do Sirio Libanês. Foi uma comoção na família e na cidade.

Como ficou diante disso?
Entrei em desespero. Por seis meses não dormi sozinha na minha casa. A família fez rodízio. Foi uma semana antes do carnaval, há 32 anos. Naquele dia minha vida mudou. Durante dois anos tive medo de sair. Achava que só dentro da minha casa estava segura. Nunca fui a um psicólogo nem a um psiquiatra, mas tive uma ajuda maravilhosa, meu psicólogo chama Deus, e o tratamento foi feito por duas letras que são as que me seguram até  hoje, – fé, – duas letrinhas mágicas que eu falo para todo mundo porque a minha fé é inabalável. E com tudo isso que nos aconteceu, eu e Emir nos agarramos ainda mais.

O amor de vocês é especial.
Sim. Coisa de alma gêmea mesmo. Todos da família sempre souberam que éramos eu, Emir e os meninos. Sempre falei com minha mãe que eu a adorava, mas mais ainda o Emir, porque ele me tirou de casa para formar um cerne que é um tronco de uma só pessoa feito por duas pessoas, e os filhos são os frutos que são do mundo. Hora nenhuma eu perguntei para Deus o por quê da morte de minha filha, tive o amadurecimento de entender que ela era minha irmã em Cristo, foi um empréstimo que Ele me deu e do mesmo jeito que me deu, Ele tinha o direito de pegar de volta. Achava que eu era dona e entendi que não era. Nunca briguei com Deus, porque Ele me ajudou tanto que não podia. Tudo que eu perguntava Ele respondia. Hoje, sou uma pessoa altamente espiritualizada. Essa minha fé me alicerçou na vida. E o amor entre o Emir e eu, em vez de diminuir, aumentou muito mais.


Como venceu a dor da perda?
Como disse, foi Deus. Não fizemos da morte dela uma dor, e sim uma paz e uma luz dentro da nossa casa. Você tem uma opção de vida ou mal sofrer ou bem sofrer, sofrer você vai, então escolha a maneira, nós escolhemos sofrer com alegria, porque tínhamos um filho que não tinha culpa de nada, tinha uma vida pela frente e precisava de nós para alicerçá-lo para alçar seus voos.

O que mudou na vida de vocês depois da partida da Alessandra?
Tudo. Com sete dias que ela tinha falecido tive uma intuição de dar tudo que era dela. Tirei tudo e dei para o Caminhos para Jesus. Deixei três ou quatro peças no armário. Nasceu ali uma outra Maria Helena. Não saía, só ía ao cemitério e na casa da minha sogra. Minha mãe tinha se mudado para minha casa, onde ficou por um ano. Na semana santa, Emir e eu fomos tocados e percebemos a necessidade de ajudar os outros. Ele era presidente da Associação Brasileira de Criadores do Cavalo Campolina e começamos a pedir aos amigos tudo o que tinham sobrando em suas casas. Minha casa virou um depósito. Próximo do inverno, os amigos daqui e de outros estados queriam depositar dinheiro para ajudar. Emir decidiu abrir uma fundação com o nome da nossa filha e nasceu assim o Centro Assistencial Alessandra Salum Cadar, no dia de seu aniversário, 6 de junho de 1987. Por 25 anos trabalhei incessantemente ajudando as entidades mais pobres de Belo Horizonte. Eu troquei um sorriso por 1.800 sorrisos, por mês.

Qual o trabalho da fundação?
Doávamos material escolar, alimentos, material de limpeza, roupas, cobertores, colchões, equipamentos ortopédicos, cadeiras de roda, e ainda oferecíamos terapia ocupacional para crianças e idosos. Mudamos nossos valores, passei a ser uma pessoa alicerçada nas minhas pernas.

Como retomou a vida?
Dois anos depois da morte da Alessandra, uma de suas amigas, filha do Lúcio e da Maria Lúcia Vasconcelos, fez 15 anos e convidou o Emirzinho para dançar a valsa. Eu não queria ir, mas Lúcio nos questionou, que quando nosso filho fosse chamado para dançar a valsa estaria sozinho. Foi a sacudida que tomamos e percebemos que precisávamos retomar a vida. O filho nos chamou para a vida.

E o desfile de carnaval?
Disse para o Emir que carnaval fazia parte da minha vida. Se eu morresse não estaria realizada porque faltava realizar um sonho: sair em uma escola de samba no Rio. Já tínhamso assistido a um desfile há alguns anos, mas queria sair. O Maninho, patrono do Salgueiro, que também era criador de cavalo campolina, chamou um grupo de criadores para sair em uma ala do Salgueiro, formamos um grupo e fomos. Isso foi em 1989, dois anos depois da morte de Alessandra, e continuei saindo em alas e na diretoria por alguns anos.

Quando virou destaque?
Em 2004, fomos jantar no Rio com o Maninho antes do ensaio da escola. No jantar ele perguntou se eu não tinha o sonho de sair como destaque. Claro que eu tinha, acho que todo mundo que sai em escola tem esse sonho. No ensaio ele falou com o Emir, e depois mandaram me chamar. Fez o convite para sair como destaque ainda naquele ano. Faltavam 25 dias para o carnaval. Olhei para o Emir, porque ele é meu ar, meu sol, minha vida, minha luz. A mulher do Maninho era destaque, e seria rainha de bateria, a primeira da história do Salgueiro, e precisavam de alguém para substituí-la como destaque. Transformaram o biquíni dela em um vestido para mim. Este ano será o 16º ano como destaque no Salgueiro. Na hora do convite eu perdi a cor e a voz e olhei para o Emir. Não faço nada sem ele. E ele ficou rindo. Fiquei em transe nesses 24 dias. A família toda foi para o desfile.

Como foi no dia?
Foi mágico. Chegando ao hotel, tinha uma corbeile com um cartão maravilhoso do Emir me incentivando, porque eu era o destaque da vida dele. Estava vivendo um conto de fadas. Me deu um frio na barriga enorme. Deu em 2004 e vai dar em 2019, porque cada ano é uma história, é um momento. A vida não repete.

Dá medo de cair lá de cima?
Dá. Já passei por diversas situações difíceis nesses anos todos. Inclusive, há três anos, fiquei pendurada por 40 minutos, sem ir para trás nem pra frente. Mandaram eu subir antes da hora, aí eu fiquei pendurada, com as perninhas para trás. Este ano já sei que vou ter que atravessar um buraco de um metro e meio, em uma tábua de 30 centímetros, engatinhando. Eu não penso, eu vou. Porque não adianta fazer planos, porque Deus faz outros. Você faz um castelo de areia, e na hora em que a onda vem e leva tudo, você olha para a areia e não vê mais nada. Então o que vai fazer amanhã? Se eu acordar, eu vejo. Não faço muitos planos. Tenho uma direção sem plano fixo.

A fantasia pesa muito?
Sim, mas eu avisto no alto do carro.

Onde vai sair este ano?
No quarto carro, vestida de Iemanjá. A fantasia é branca e prata. O desfile será no domingo e seremos a quarta escola a desfilar. A última prova da roupa será na sexta-feira, às 18h. O carnavelesco é o Alex de Souza, e quem faz minha roupa é o ateliê de Belizário Cunha, no Rio de Janeiro. Ele faz desde a minha primeira roupa, em 2004. A alegria que tenho dentro de mim é meu combustível. O apoio do Emir é fundamental, sem ele não seria possível desfilar, porque faço três a quatro viagens ao Rio de Janeiro para provar a roupa. Disse para o estilista que não sou global e não vendo imagem. Sou esposa, mãe, avó e empresária e ele entendeu, com isso, sempre as melhores roupas da escola são minhas porque eu venho vestida. É uma fantasia de acordo com a minha personalidade.

Como surgiu a ideia de guardar as fantasias?
Normalmente, as fantasias dos destaques são demanchadas de um ano para o outro, para aproveitar o material na roupa do ano seguinte. Afinal, é tudo muito caro. Eles pintam ou descolorem plumas, etc. Quando disseram isso para o Emir, ele não permitiu. Disse que minha fantasia viria para Belo Horizonte, completa. Como não tinha onde guardar, ele construiu um galpão no estacionamento da construtora, comprou um manequim e colocou a fantasia. Fez isso ano a ano. O galpão ficou pequeno e ele construiu outro. E ficam todas expostas. Já ganhei prêmio de melhor destaque com as fantasias por três anos. É gratificante e uma emoção única.


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