A discussão sobre o fim da abordagem de questões supostamente ideológicas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) começou antes mesmo do início do governo Jair Bolsonaro. Passado menos de um mês da gestão, o assunto toma ares concretos. Ontem, o novo presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Marcus Vinícius Rodrigues, causou frisson no meio educacional ao afirmar que poderá passar pente-fino na prova antes de ser aplicada. Entre educadores, o momento é de perplexidade e de desconfiança quanto ao futuro da maior avaliação do país.
''Vamos fazer com que o banco de questões tenha postura não ideológica''
Marcus Vinícius Rodrigues, novo presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep)
E a ideia é ir além. Rodrigues pretende revisar o banco de questões do Enem, o arquivo de onde são tiradas as questões das provas. “Vamos fazer com que o banco de questões tenha postura não ideológica, fazer com que esse banco priorize o que realmente é necessário medir, o conhecimento”. Nos primeiros minutos do discurso de posse, Rodrigues ainda agradeceu a Deus por sua indicação ao cargo, citou família, pátria e criticou “ideologias e crenças” inadequadas nas escolas, que, segundo ele, teriam “origens em interpretações superficiais de pseudointelectuais ou de um oportunismo pseudopartidário”. “Precisamos de uma nova escola, com novos paradigmas, que resgatem novos valores e tenham como diretrizes o respeito à família e à pátria”, disse. De acordo com ele, esses são os principais objetivos do Inep.
Depois, em entrevista, ele afirmou que pretende melhorar a qualidade, a confiança nos sistemas usados pelo instituto e reduzir custos. “Não é preciso necessariamente ter alto custo para realizar um bom trabalho. Podemos ter excelentes exames e itens com custo menor, otimizar nossas estruturas e processos, a parte tecnológica, com integração maior o que tornará mais eficaz”, afirmou
Fontes ligadas ao Enem, próximas ao Ministério da Educação, ouvidas pelo Estado de Minas se dizem preocupadas com a operação do exame, que envolve milhões de jovens e suas famílias. “O processo de elaboração não apenas da prova, mas das questões, é complicado e longo. Isso é feito com um mínimo de dois anos de antecedência. Não há tempo hábil para entrar com um número grande de outras questões para uma prova que será aplicada no fim deste ano. Não é viável”, disse uma das fontes, que pediu anonimato. “Como cidadão fico preocupado e, do ponto de vista técnico e educacional me questiono como eles vão resolver os problemas técnicos que se colocam na tomada de uma decisão como essa. Será que essas pessoas têm ideia de que essas atitudes geram problemas não triviais de serem resolvidos?”, questiona. (Com agências)
Sisu tem prazo
Não é bolsa de valores, mas o sobe e desce dos “ativos” até faz pensar no ambiente símbolo da economia. Nesse caso, os “ativos”, também números, podem ser o limite a garantir a realização de um sonho: entrar no ensino superior. Trata-se das notas de corte do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e de sua divulgação, que na primeira edição do programa este ano ganhou ares de montanha-russa. Antes publicada uma única vez ao dia, as mínimas de cada curso foram informadas ao longo da semana em cinco períodos e, desde ontem, uma vez novamente. A justificativa do Ministério da Educação é melhorar o acesso ao sistema. Por causa de lentidão e panes, prazo de inscrições foi prorrogado para 23h59 de domingo. A divulgação do resultado está mantida para segunda-feira.
O MEC garante que o sistema funciona de forma estável e que a lentidão foi resultado do grande volume de acessos simultâneos. Pela primeira vez foi testada a divulgação à 0h, 7h, 12h, 17h30 e 20h. No sistema anterior, a divulgação se limitava à meia-noite, a partir do segundo dia de inscrição. Mas, desde ontem, o critério antigo voltou a ser adotado para não prejudicar os estudantes que ainda não fizeram a inscrição e melhorar o acesso por causa do alto tráfego de pessoas tentando entrar no sistema.
Diretor-executivo do Colégio Arnaldo, Geraldo Júnio dos Santos diz que vários horários de divulgação são interessantes, pois dão oportunidade ao candidato de reposicionar a régua e ir atrás da graduação fazendo ajustes de curso ou localidade. “O aluno pode ver, naquela região, como estão as moradias, repúblicas, se a família está disposta a custear, se vai ficar mesmo em BH ou o contrário: gente do interior que quer estudar na UFMG, diz.
Mas cinco diferentes reposicionamentos podem gerar ansiedade em quem espera o resultado final. “A cada cinco horas a pessoa pensa diferente e isso não ajuda o candidato. É como se ele olhasse a bolsa de valores a cada cinco minutos para ver se o valor do papel subiu ou desceu”, compara Geraldo Júnio. Mas, nesse último dia, diz o educador, assim que divulgada a última nota mínima para o curso pretendido, conferir se está tudo certo com a opção de curso e universidade feitas. Isso nos casos de quem tem mais opções de graduações ou instituições.