
Em outros tempos, a profissão era sinônimo de respeito e valorização. Alegria dos pais era ver o filho se tornar professor, status tão importante quanto ser doutor – médico, advogado, engenheiro. Em tempos atuais, não faltam olhos atônitos diante de um interlocutor que expresse a vontade de liderar uma sala de aula. Para os pais modernos, haja coração diante de notícia como essa. Mas como seria o mundo sem alguém com o dom da arte de ensinar? Tentando mudar um quadro de ares críticos, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação (MEC), está estimulando projetos de melhoria do ensino e da qualidade na formação inicial de professores, por meio do Programa de Licenciaturas Internacionais. A ideia é promover o intercâmbio de estudantes de graduação em licenciaturas nas áreas de química, física, matemática, biologia, português, artes e educação física com a Universidade de Coimbra, em Portugal.
Os estudantes vão continuar o curso na modalidade sanduíche – uma parte no Brasil e outra no exterior. O programa paga bolsas e passagens aéreas para os alunos e diárias para professores em missão a Portugal. Quando se formarem, terão direito a receber o diploma dos dois países, aumentando também os horizontes do mercado de trabalho. Um dos responsáveis pelo projeto na Capes, José Guilherme Moreira, vice-diretor do Instituto de Ciências Exatas da UFMG (Icex), ressalta que outro objetivo é diminuir a evasão nos cursos de licenciatura. Muitos alunos começam as aulas e desistem no caminho. “O professor no Brasil é muito mal remunerado e as péssimas condições de trabalho não atraem novos profissionais. Vários alunos que se formaram comigo queriam ser professores, mas não são por causa dessas questões. Esse programa é um estímulo e dá vantagens para o aluno acabar o curso e continuar na profissão”, relata.
Na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a redução ano a ano dos inscritos nos vestibulares para licenciatura, ano a ano, dá a ideia do problema. Segundo a instituição, no curso de física houve redução de 59,3% entre os vestibulares de 2006 e 2011 – de 233 candidatos para 95. Nas ciências biológicas, a queda foi ainda maior: de 62,9% em cinco anos. Em geografia e química, a diminuição foi de 55,3% e 60,1%, respectivamente. Dados mostram que, em matemática e história, o desinteresse também superou os 55%.
Ponte
Este é o segundo ano do Programa de Licenciaturas Internacionais. A UFMG vai participar pela primeira vez, enviando 19 estudantes de física, biologia e artes. Entre os contemplados, está o aluno Rubens Silva, de 25 anos, do 4º período de física. Ele embarca hoje para Coimbra e, na bagagem, leva muita disposição. E não tem dúvida quanto ao futuro: “Não tenho grandes expectativas quanto à questão financeira, mas penso em ser professor, pois gosto de ensinar. Atuo na área há algum tempo e me apaixonei por passar conhecimento aos outros”. Durante um ano, ele deu aulas de física no curso de Educação de Jovens e Adultos (EJA), ministrados por alunos da UFMG nas dependências do Colégio Técnico (Coltec).
A evasão na turma de Rubens é nítida. De 40, restam 30 ainda. O jovem acredita que, até o fim do curso, metade terá desistido. Por mais que tenha um diploma válido em Portugal, os estudantes têm a obrigação de voltar ao Brasil e ficar por aqui, pelo menos o tempo de estudos no exterior: dois anos. Rubens não pensa diferente: “Vamos buscar uma ponte com as melhores universidades e as riquezas da física, já que se trata de uma universidade antiga, com tradição de ensino. É uma experiência necessária para o Brasil, que é carente nessa área e precisa de pessoas capacitadas e que se aventurem no empenho de dar aula.”
Plínio Salgado Borges, de 22, também deixa BH hoje. Outros alunos vão na segunda-feira. “O Brasil vê a ciência de um jeito mais restrito e, em Coimbra, é como se tivéssemos um curso de bacharel, com matérias pedagógicas. E a licenciatura é essencial para a universidade, pois muitos professores não têm essa formação e, por isso, não têm didática em sala de aula”, relata. Nessa segunda-feira, foi dia de se despedir dos amigos e fazer os últimos planos.
Estados Unidos
A Capes divulgou nessa segunda-feira, no Diário Oficial da União, a primeira chamada do programa Ciência sem Fronteiras, que prevê a oferta de bolsas de estudos, na modalidade graduação-sanduíche, nos Estados Unidos. Os primeiros estudantes embarcarão em janeiro. Para se inscrever, os candidatos devem ser brasileiros, apresentar bom rendimento acadêmico, ter concluído no mínimo 40% e no máximo 80% do currículo previsto para o curso de graduação no início da viagem. Por fim, comprovar nota mínima de 79 pontos no exame de proficiência Toefl-Ibet Test. Os alunos participantes receberão auxílio financeiro por um ano, pagamento das taxas escolares norte-americanas, além de passagens aéreas e ida e volta. Informações: www.capes.gov.br.
