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Estado de Minas LIÇÃO DE DESENVOLVIMENTO

Sem apoio do poder público, famílias fazem esforço solitário para educar os filhos

Na expectativa de um futuro com emprego e renda melhor


postado em 13/12/2012 00:12 / atualizado em 14/12/2012 10:35

Talita e Jean percorrem 3 km até alcançar o ônibus que os levará à escola, jornada vencida pela determinação de chegar à universidade(foto: SOLON QUEIROZ/ESP.EM)
Talita e Jean percorrem 3 km até alcançar o ônibus que os levará à escola, jornada vencida pela determinação de chegar à universidade (foto: SOLON QUEIROZ/ESP.EM)
 

Porteirinha (MG), Crato (CE) e Caruaru (PE) – Talita Maria de Jesus, de 16 anos, tem o firme propósito de se formar advogada, desejo que só aumenta a dedicação aos estudos, ainda no primeiro ano do ensino médio. Mas a vida não é fácil para a garota, que mora em Canafístula, povoado de Porteirinha, no Norte de Minas Gerais. Para assistir às aulas, ela percorre, de bicicleta, 3 quilômetros de ladeiras de terra que chegam à comunidade Olhos D’Água. Lá, entra num ônibus, que roda por mais 10km até a Escola Estadual Miguel José da Cunha, na sede do município. “Saio de casa às 11h15 e chego à escola à uma da tarde. O cansaço dificulta a concentração, mas a vontade de estudar é maior”, diz Talita. A jornada diária para aprender só termina às 19h.

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O árduo trajeto é feito na companhia de Jean Nunes de Souza, da mesma idade. “Além de estudar, ajudo meu pai no plantio da roça e na lida com o gado. Não desisto do estudo”, afirma. A importância da educação para o desenvolvimento do Brasil é a quinta e última reportagem da série O Brasil de Gonzaga, que o EM publica desde domingo, em referência ao centenário de nascimento do sanfoneiro. O Rei do Baião (1912–1989) completaria 100 anos hoje. Sua carreira foi marcada por vários sucessos que falaram dos problemas sociais e econômicos do sertão e dos sertanejos e anteciparam, na sensibilidade de Gonzagão, o crescimento que o país teria. Um deles é ABC do sertão, cujos primeiros versos estão estampados no alto desta página.

Longe de Porteirinha, no agreste pernambucano, Jeferson Henrique Melo da Silva, de 9 anos, também quer ter um futuro melhor. “Quando crescer, desejo ter duas profissões. Vou ser psicólogo, para ajudar as pessoas. E advogado, para defender o povo”, diz. A vida dele também não é fácil. Morador de Alecrim, povoado que pertence a Caruaru, o garoto estuda na Escola Municipal Helena Martins Gomes, instituição que tem apenas uma sala de aula, e segue o conceito de salas multiseriadas – alunos do 1º ao 5º anos ocupam o mesmo espaço físico e dividem a atenção de uma única professora. “Trata-se do projeto
Escola Ativa”, explica a dedicada educadora Eliane Maria da Silva. Os alunos têm de 6 a 12 anos.

Escolas de Pernambuco também comemoram centenário de Luiz Gonzaga. Veja




O ideal, reconhece a professora, é que cada série tenha o próprio educador. Por outro lado, defende o projeto Escola Ativa como única forma de muitos alunos do sertão nordestino terem acesso ao ensino. A educação melhorou em todo o país nas últimas décadas, mas ainda há muito o que avançar. De acordo com o IBGE, 59,06% da população a partir de 10 anos no Nordeste não têm instrução ou não passaram do ensino fundamental incompleto, representando 26,114 milhões de pessoas. O resultado perde largamente para a média nacional, também bastante alta, de 50,24% nesse grupo (81,386 milhões de brasileiros). Em Minas, o percentual também é alto (52,7%), correspondendo a 8,901 milhões de homens e mulheres. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) referente a 2010.

Uma boa notícia é que cresceu no Nordeste a participação de crianças na escola desde 2007. Da creche ao pré-escolar, 4,229 milhões de nordestinos estavam frequentando as aulas no ano passado, ainda de acordo com o IBGE, o que significa 24,7% do total. Cinco anos atrás, o percentual era de 22,75%. Algum esforço na melhora da educação também pôde ser observado na década. Aumentou 11,6% o número de pessoas alfabetizadas com mais de cinco anos na região, de 74% do total em 2001 para 82,6% em 2011, enquanto entre as não alfabetizadas a queda foi de 33%, de quase 26% para 17,4% da população no ano passado.

O Brasil, na prática, conseguiu universalizar o ensino básico na população infantil. No entanto, as taxas de frequência na escola ainda são mais baixas entre os mais pobres e nas regiões Norte e Nordeste, o que compromete o futuro do desenvolvimento socioeconômico sustentável no país, alerta Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). A organização reúne as maiores corporações do setor produtivo, que detêm 40% de toda a produção de bens e serviços do país, medida pelo Produto Interno Bruto (PIB), e mantêm mais de 600 mil empregos diretos.

Ouça a música ABC do Sertão


“É preciso investir em todos os níveis de ensino: do fundamental à universidade e também nos cursos técnicos. As parcerias com o setor privado podem ser ainda mais estreitas e facilitar a inserção no mercado de trabalho, ajudando a alavancar o desenvolvimento econômico”, afirma. Para Marina Grossi, o grande desafio do Brasil ainda é melhorar o conteúdo e o serviço nas escolas. “A falta de qualidade na educação poderá contribuir para acirrar as desigualdades entre as diferentes regiões do país e a sociedade terá menor poder e influência nas tomadas de decisão”, afirma.

OXENTE

(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A/Press)
(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A/Press)
A FALTA QUE ELA FAZ

MAMONAS (MG) E FLORES (PE) – A longa estiagem deste ano parece ter secado até as lágrimas de Manoel Alves de Souza, de 48 anos. Morador da área rural de Mamonas, ele perdeu toda a plantação. Não vingou sequer um pé de milho, feijão ou cana. Analfabeto, ele reconhece que a educação lhe faz falta: “Não tenho leitura nenhuma. Se fosse mais jovem e tivesse estudo, não estaria neste sofrimento”. Na área rural de Flores, João Alves de Lima (foto), de 73, também sofre com a seca e a falta de estudo. “Precisei vender 10 vacas para comprar ração para o restante do rebanho”. (PHL e LR)

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