ilustração 'Refundar o país, demarcar territórios'

A ilustração "Refundar o país, demarcar territórios", de Matheus Ribs, é encartada no livro

Matheus Ribs/Divulgação

Para os yanomami, a terra é um ser vivo que guarda elementos essenciais à vida, mas também nocivos aos seres humanos. Na perspectiva yanomami, quando Omama criou as florestas, ele enterrou o petróleo e o minério justamente por serem “coisas maléficas”. 

“Ele decidiu escondê-las sob o chão da floresta para que não nos deixassem doentes. Quis que ninguém pudesse tirá-las da terra, para nos proteger. Por isso devem ser mantidas onde ele as deixou enterradas desde sempre”, escreveu Davi Kopenawa, para quem a floresta é “a carne e a pele de nossa terra”.

Os quilombolas, por sua vez, enxergam a terra como parte de sua origem. “Não dizemos ‘aquela terra é minha’, e sim ‘somos daquela terra’”, costuma dizer o escritor e líder quilombola da comunidade Saco do Curtume (Piauí), Antônio Bispo dos Santos.

Entretanto, o pensamento desses dois povos - que foram essenciais para a formação da identidade brasileira - a respeito da terra não se refletiu na maneira como os brasileiros se relacionam com ela nos dias de hoje, fortemente marcada pela exploração.

É com o intuito de apresentar as diferentes formas de pensamento afro-indígenas a respeito da terra que os editores da revista “Piseagrama”, Fernanda Regaldo, Felipe Carnevalli, Paula Lobato, Renata Marquez e Wellington Cançado organizaram o livro “Terra: Antologia afro-indígena”, que tem pré-lançamento nesta quarta (18/10), em Belo Horizonte.

O livro reúne 25 ensaios publicados na revista desde sua primeira edição, em 2011. Todos relacionando a terra com as cidades, política, clima e o corpo humano.

"Para todos eles (os autores), a questão da terra é central. E a forma de se relacionar com a terra e com o território é muito distinta do que a gente tem no nosso universo urbano, da branquitude. É a perspectiva de uma conexão com a terra"

Fernanda Regaldo, editora


Outro mundo

“Quando foi criada, a ‘Piseagrama’ era mais focada em questões de cidades e urbanismo. Aos poucos, ela foi tomando outro rumo, indo em direção das vozes indígenas e quilombolas, no intuito de trazer questões urgentes para pensarmos outro mundo”, diz Fernanda Regaldo.

“Resolvemos fazer esse livro porque nos demos conta de que tínhamos publicado muitos ensaios relevantes que poderiam ser reunidos como uma antologia afro-indígena”, afirma.

Foram selecionados textos de quem pertence a comunidades que sobreviveram a séculos de exploração, como o os já citados Kopenawa e Antônio Bispo, além de outros autores, como os indígenas Creuza Prumkwyj Krahô, Célia Xakriabá e Glicéria Tupinambá.

“Para todos eles, a questão da terra é central. E a forma de se relacionar com a terra e com o território é muito distinta do que a gente tem no nosso universo urbano, da branquitude”, avalia Regaldo. “É a perspectiva de uma conexão com a terra, com aquilo que a gente entende como natureza, com a não objetificação da natureza.”

“TERRA: ANTOLOGIA AFRO-INDÍGENA”
• Organização: Revista Piseagrama 
(Fernanda Regaldo, Felipe Carnevalli, Paula Lobato, Renata Marquez e Wellington Cançado)
• Coedição: Editora UBU (368 págs.)
• R$ 89,90
• Lançamento nesta quarta (18/10), às 19h, na Ocupação Maria do Arraial (Rua da Bahia, 1.065, Centro). Entrada franca. Exemplares à venda também no site da Piseagrama.