Drica Moraes em cena do longa-metragem Pérola

Drica Moraes interpreta Pérola, a protagonista cuja relação com a família é descrita por meio das memórias do filho, depois de sua morte

Marcinho Nunes/Divulgação

Carlos Drummond de Andrade escreveu sobre a memória, este peculiar fenômeno que evoca o passado e preenche o vazio que todos sentimos por algum tipo de perda: “Amar o perdido deixa confundido este coração”. 


Segundo longa-metragem dirigido por Murilo Benício, que estreou na função em “O beijo no asfalto” (2017), “Pérola” é uma adaptação de peça autobiográfica homônima de Mauro Rasi (1949-2003).

Numa espécie de evocação aos versos de Drummond, o filme aborda a relação entre Mauro (Leonardo Fernandes) e sua mãe, a efusiva Pérola (Drica Moraes), a partir de lembranças do filho. As memórias, no entanto, vêm à tona depois que Pérola morre. 
 
 

Seguindo uma linha temporal psicológica, na qual são intercaladas cenas do presente seguidas por lembranças antigas de Mauro, o filme começa com o personagem relembrando o momento em que a família compra uma casa em Bauru (SP), quando ele ainda era criança, em algum momento não especificado da década de 1950.

Mansão à la Almodóvar

Pérola já mostra sua personalidade afável e calorosa nas primeiras cenas, quando leva as irmãs para conhecer sua “mansão”, como ela se refere ao local. Ciceroneando as convidadas, não poupa beijos e abraços nos filhos – Mauro tem uma irmã mais nova – e no marido (interpretado por Rodolfo Vaz).

“A casa é muito importante nessa narrativa”, afirma Leonardo. “Num campo metafórico, ela é uma extensão da própria Pérola. Afinal, Pérola é uma mulher afável, alto astral e colorida. Isso se reflete no ambiente todo”, diz, lembrando que Benício se valeu de cores quentes e fortes - muito inspirado em Almodóvar, diga-se.

“Pérola” é esse retrato de uma mulher comum, pincelado por um filho em luto. No entanto, como ocorre em situações em que a morte serve de expiação para os erros cometidos em vida, a matriarca é apresentada como alguém cujos defeitos são insignificantes diante da própria bondade.

É claro que conflitos entre mãe e filho não são esquecidos por Mauro. As resoluções finais, contudo, deixam ao espectador a impressão de que, apesar dos entreveros, Pérola não se importa em se sacrificar em benefício de quem ama.

Traços da personalidade de Pérola menos admiráveis são apenas insinuados. Sua relação com a bebida, por exemplo – a frase “desce uma caipirinha” vira bordão, de tão repetida –, é apenas veladamente indicativa de alcoolismo. 

Outro aspecto superficialmente abordado é sua relação com a mãe, acolhida pela família num quartinho de casa. A mãe de Pérola, que sequer aparece no filme, não recebe atenção da filha. Pelo contrário, sempre que se lembra da mãe, Pérola espera que a velha morra logo para que ela possa comprar as casinhas vizinhas que pertencem à mulher.

“A impressão que me dá é que essa mãe fechada em um dos cômodos da casa representa algo dentro da própria Pérola que ela não quer olhar. Talvez a própria questão com a bebida, não sei”, diz Leonardo. “Porque existe uma questão mal resolvida ali.”

“Pérola”, no entanto, não é piegas. Transitando bem entre o humor e o drama, o filme possibilita ao público identificar-se com a família retratada, seja com a protagonista, com Mauro ou com os demais personagens secundários, todos típicos de uma tradicional família de classe média.

Trata-se de uma bela homenagem feita por Rasi, que, ao final da obra, volta involuntariamente a Drummond, sugerindo que “as coisas findas, muito mais que lindas, essas ficarão”.

Mineiros no elenco

Embora a trama de “Pérola” seja ambientada na cidade de Bauru, interior de São Paulo, o filme conta com diversos mineiros no elenco. Além de Leonardo Fernandes no papel de Mauro Rasi, atuam no longa Rodolfo Vaz, Gillray Coutinho e Lavínia Pannunzio. 

“PÉROLA”

(Brasil, 2023, 91min.) Direção: Murilo Benício. Com Drica Moraes, Leonardo Fernandes, Rodolfo Vaz, Valentina Bandeira. Estreia nesta quinta (28/9), no UNA Cine Belas Artes, Cineart Cidade.