Atriz Sarah Snook entrega celular ao ator Jeremy Strong, observada por Kieran Culkin, em cena da série Succession

Depois de 38 episódios, hoje será traçado o futuro dos irmãos Shiv (Sarah Snook), Roman (Kieran Culkin) e Kendall Roy (Jeremy Strong)

HBO/Divulgação

Finais de grandes séries costumam arregimentar os fãs no antes (com as teorias do que poderá ocorrer) e no depois (com as críticas, positivas ou negativas). São como eventos, só que acontecem dentro de casa e reverberam, na hora da exibição e nos dias posteriores, nas conversas com os amigos e no buzz nas redes sociais. Foi assim com “Breaking bad” (em 2013, com final supercelebrado) e com “Game of thrones” (em 2019, com encerramento bastante contestado).

A bola da vez, que poderá fazer deste domingo (28/5) também um evento em nível global, é o final de “Succession”, exibido no Brasil, a partir das 22h, na HBO.

Um dos herdeiros de Logan Roy (Brian Cox) – Kendall (Jeremy Strong), Shiv (Sarah Snook) ou Roman (Kieran Culkin) – vai finalmente assumir o posto deixado pelo pai à frente da Waystar Royco (e basicamente a razão de ser da série)? Ou o conglomerado de mídia acabará nas garras da GoJo, a big tech norueguesa comandada por Lukas Matsson (Alexander Skarsgard)?

'Succession' conseguiu o que não é tão fácil no mundo de hoje: ela se alimentou muito pelo boca a boca

Vana Medeiros, roteirista


Prestígio globalizado

Depois de 38 episódios das quatro temporadas, não há nenhuma dica clara sobre o que o futuro reserva para a Waystar Royco e o famigerado clã que a controla. Mas é fato que “Succession” chega a seu final como uma das produções do gênero de maior prestígio do mundo.

Há quem aponte a série criada por Jesse Armstrong como divisor de águas. Coisa, por sinal, que já aconteceu com outras produções, cada qual em seu tempo: “Os Sopranos”, “The wire” (ambas da HBO e realizadas na primeira década deste século) e “Breaking bad” (2008-2013).

Em essência, o drama “Succession” acompanha uma das mais poderosas famílias do mundo e sua incansável (e suja, para não dizer imunda) briga pelo poder. Shakespeare (“Ricardo III”), a “Bíblia” (com a parábola do filho pródigo) e também a vida real (com destaque para o magnata da mídia Rupert Murdoch) estão entre as inspirações da trama, com roteiro impecável e grandes interpretações.

“'Succession' conseguiu o que não é tão fácil no mundo de hoje: ela se alimentou muito pelo boca a boca”, comenta a roteirista Vana Medeiros, coautora do livro “Guia das séries” (Évora, 2014) e diretora de produção do Série Lab Festival. “Hoje em dia, com tantas opções, o marketing é meio o que decide a que as pessoas vão assistir.”

Ela própria é fruto desse boca a boca. Só começou a acompanhar a produção depois da segunda temporada. “Não há um roteirista hoje no Brasil que não a assista, pois é uma aula de roteiro”, diz Vana. Para ela, o final, na quarta temporada, ocorre no momento certo. Houve gente que achou que a série poderia continuar.

“Uma das vitórias (que os criadores) podem conquistar na indústria é a possibilidade de determinar o fim da história. No Brasil, estamos sempre apostando, nunca sabemos até onde se vai. Nos Estados Unidos, onde alguns criadores têm um pouco mais de poder, existe o benefício de poder prever começo, meio e fim de uma história”, completa Vana. Ela acredita que a ambiguidade dos personagens é também um dos pontos fortes da história.
 
 

Autor do recém-lançado “Como analisar filmes e séries na era do streaming” (Summus Editorial), Leonardo Moura afirma que não se deve ficar no senso comum ao analisar um produto audiovisual. “Se olho para uma série, tenho de ser capaz de fazer associações, ver o mundo a partir dali.”

Em “Succession”, ele diz, essas associações poderiam ser feitas em questões tratadas na história, como a concentração de poder, o estilo de vida dos super-ricos, a crise dos grupos tradicionais de mídia, a ascensão das big techs e a manipulação das eleições.

“Você vê que apesar do sucesso, o patriarca não se estruturou para fazer o sucessor. A figura central, muito forte, não conseguiu fazer o movimento de transferência para os filhos e, aparentemente, os infantiliza. Agora, é todo mundo filho da puta. Você não consegue se apoiar em nenhum personagem”, acrescenta Moura.
 

('Succession') Deverá permanecer, tanto pelo que diz sobre o mundo de hoje, como pelos perigos que aponta quanto ao amanhã

Robledo Milani, editor do site Papo de Cinema



Editor-chefe do site Papo de Cinema, Robledo Milani afirma que o tema de “Succession” não poderia ser mais distante do espectador comum. “Mas, paradoxalmente, também é próximo, pois fala de pessoas falhas, inseguras, tão acostumadas às artimanhas e aos jogos que, na maioria dos casos, chegam a se esquecer de si mesmas e de suas reais intenções.”
 
Para o jornalista, independentemente do desfecho, a série traz uma história “que deverá permanecer, tanto pelo que diz sobre o mundo de hoje, como pelos perigos que aponta quanto ao amanhã. Afinal, o que se salva não é tanto o destino para onde caminham, mas a jornada percorrida, do que se mostraram capazes (ou não) de fazer para alcançar seus objetivos.”

Editor do site Ligado em Série, Bruno Carvalho afirma que “Succession” é um ponto fora da curva no streaming desde a estreia, cinco anos atrás, “pelo nível praticamente impecável de todos os seus aspectos produtivos – dos criativos aos técnicos”. Carvalho apoia a decisão de terminar a série em seu auge. “Isso mostra comprometimento tanto com o público quanto com a qualidade da atração.”

“SUCCESSION”

• O último episódio da série será exibido neste domingo (28/5), às 22h, na HBO e HBO Max

Ator Brian Cox está sentado em cadeira, diante de grande mesa, e olha para trás

Brian Cox, que faz o papel do patriarca Logan Roy, causou polêmica ao considerar "prematura" a morte de seu personagem

HBO/Divulgação

Polêmicas na vida real

Antes do início da quarta temporada, o ator britânico Brian Cox, grande intérprete de Shakespeare, afirmou considerar “muito irritante” o trabalho de seu colega de elenco, o americano Jeremy Strong.  Este é adepto do polêmico “Método de interpretação para o ator” (do inglês “method acting”), basicamente uma técnica de atuação criada nos EUA em que o intérprete se aproxima ao máximo dos pensamentos e emoções exibidos por seu personagem.

De acordo com Fox, Strong agiria no set como o próprio Kendall Roy. O próprio admitiu ter se isolado dos colegas de elenco e até se recusado a ensaiar, “para que toda cena desse a impressão de que eu estava encontrando um urso no bosque”.

“É mesmo um choque cultural. Não tolero toda essa merda americana, todo aquele lance de 'eu penso, logo eu sinto'. Faça apenas o trabalho, não se identifique”, disse Cox.
 
O método extremado – Strong escolheu o vestuário de Kendell e usou as roupas durante todo o período em que gravou a série, mesmo quando não estava no set – pode ter rendido dissabores com seus pares, mas lhe valeu prestígio no meio.

Ele ganhou o Emmy de melhor ator em drama e participou de filmes de grandes nomes, de “Os 7 de Chicago” (2020), de Aaron Sorkin, a “Armageddon time” (2022), de James Gray.

Na semana passada, Cox voltou à carga. Em entrevista à BBC, afirmou que foi prematura a morte de Logan no terceiro dos 10 episódios da quarta temporada. “Eu estava bem com isso, mas me senti um pouco rejeitado. Todo o trabalho que fiz e finalmente vou, você sabe, acabar como uma orelha no tapete de um avião.”

Mesmo considerando que o personagem poderia ter seguido por mais alguns episódios, o ator disse que a morte de Logan foi tratada “de uma maneira brilhante”. O episódio da morte de Logan, que surpreendeu o público, é considerado o melhor de toda a série e também o mais assistido. Até hoje, ao menos.