poeta pablo neruda caminha pela praia em isla negra

Pablo Neruda caminha pela praia em Isla Negra, em foto de 1958. Investigação canadense não determina se autor de "Canto geral" foi envenenado

Sergio Larrain/O Cruzeiro/Arquivo EM - 1958

A teoria do envenenamento de Pablo Neruda circula no Chile há mais de uma década. Mas os cientistas de um laboratório canadense que analisaram seus restos mortais não conseguiram determinar se a bactéria encontrada em seu corpo matou o poeta chileno.

Peritos científicos entregaram um relatório à juíza chilena Paola Plaza, responsável pelo caso, que irá revisar as conclusões dos especialistas antes de emitir uma decisão. Embora tenham detectado a presença da bactéria do botulismo nos restos mortais de Neruda, os cientistas não podem confirmar se ela foi introduzida intencionalmente em seu corpo.

“A bactéria Clostridium botulinum estava lá no momento de sua morte, mas ainda não sabemos por quê. Só sabemos que não deveria estar lá”, disseram à reportagem Hendrik e Debi Poinar, da Universidade McMaster, no Canadá, em troca de mensagens de texto.

Os cientistas confirmaram à reportagem as declarações publicadas em um artigo na quarta-feira (15/2) pela Universidade McMaster, que afirma que até agora "não foi possível concluir se a cepa de C.botulinum encontrada nos restos mortais de Neruda o matou, nem se foi usada intencionalmente para matá-lo".

Os pesquisadores fazem parte do painel internacional de especialistas científicos convocado pela Justiça chilena para averiguar a causa da morte de Neruda, ocorrida em 23 de setembro de 1973.

Novas pesquisas

Hendrik e Debi Poinar sustentaram que, a pedido dos tribunais chilenos, trabalharam durante quatro anos para determinar a presença e relevância da bactéria no corpo de Neruda quando ele morreu em uma clínica, em Santiago.

Os pesquisadores alegaram ter recuperado DNA suficiente de um dente de Neruda, mas, devido à degradação, só conseguiram reconstruir um terço do genoma da Clostridium botulinum em questão. Eles afirmaram, no entanto, que o trabalho pode ser concluído no futuro sem a necessidade de uma nova exumação caso o tribunal autorize o procedimento.

Segundo a versão oficial, Pablo Neruda, de 69 anos e conhecido militante comunista, morreu em uma clínica de Santiago, em 23 de setembro de 1973, em decorrência de um câncer de próstata. Sua morte ocorreu 12 dias após o golpe militar que derrubou o governo de Salvador Allende e impôs uma ditadura chefiada por Augusto Pinochet.

Manuel Araya, ex-motorista do poeta pablo Neruda

Manuel Araya, ex-motorista de Neruda, afirmou em coletiva, na última quinta-feira, que o poeta não estava doente o suficiente para ser internado em uma clínica, em 1973

MARTIN BERNETTI/AFP

Motorista

A investigação judicial sobre as causas da morte de Neruda começou em 2012, depois que seu ex-motorista Manuel Araya disse à imprensa, em 2011, que o poeta poderia ter sido envenenado pela ditadura de Pinochet, que deixou mais de 3.200 mortos e cerca de 38 mil torturados, segundo dados oficiais.

Araya confirmou na quinta-feira (16/2), em conferência de imprensa, que Neruda não estava doente o suficiente para ser internado em uma clínica em 19 de setembro de 1973, mas que se tratava de uma estratégia para que o poeta fosse para o exílio no México.

"Foi por segurança. Em 14 de setembro, havia tanques perto da casa de Pablo Neruda, em Isla Negra. Os militares cercaram nossa casa. Então, o problema foi como tiramos Pablo Neruda de casa", relatou Manuel Araya.

Depois de anos de perícia e estudos científicos, em 2017, um grupo de especialistas chilenos e estrangeiros garantiu que o autor do "Canto geral" não morreu de câncer, embora o painel não pudesse determinar a causa da morte.

Por esse motivo, foram solicitados estudos a laboratórios da Dinamarca e do Canadá, alguns dos mais avançados na área, para tentar esclarecer a morte de Neruda.