Vista da sede do Supremo Tribunal Federal

Vista da sede do Supremo Tribunal Federal, em Brasília, através de vidro quebrado por radicais bolsonaristas no Palácio do Planalto

MAURO PIMENTEL / AFP


Governo ainda contabiliza os danos ao patrimônio artístico provocados pelos atos terroristas de domingo. Ministra da Cultura assegura que irá trabalhar pela “reconstrução de tudo que foi violado”

A ministra da Cultura, Margareth Menezes, se reuniu ontem (9/1) com técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para dar início ao processo de restauro das obras danificadas por golpistas durante a invasão a Brasília.

Margareth publicou em seu perfil no Twitter mensagens de repúdio aos golpistas. "É urgente avaliarmos os danos e começar a recuperação e restauro de todo patrimônio que foi brutal e absurdamente arrasado. Um quadro de Di Cavalcanti destruído a facadas revela tamanha ignorância e violência desses atos abomináveis", escreveu.
 

A cantora afirmou que Marlova Noleto, diretora e representante da sede brasileira da Unesco, se pôs à disposição para ajudar com a reforma e recuperação de tudo que foi depredado durante a invasão desse domingo (8/1).

O analista de infraestrutura Maurício Goulart e os técnicos do Iphan vão trabalhar juntos com um grupo de especialistas e restauradores de obras de arte, disse Margareth.

"Brasília é patrimônio histórico material e imaterial do Brasil e vamos trabalhar unidos para a reconstrução de tudo que foi violado", publicou a ministra no Twitter.

Relógio Balthazar Martinot

Relógio Balthazar Martinot

TWITTER/REPRODUÇÃO

Relógio

Os golpistas danificaram um relógio trazido ao Brasil em 1808 por D. João VI, com máquina de Balthazar Martinot e ebanesteria de Charles Boulle, dois franceses que circularam pela corte de Luís XIV e trabalharam para o Rei Sol.

Outra obra danificada foi "Araguaia" (1977), vitral de Marianne Peretti que ficava no Salão Verde da Câmara dos Deputados. Artista franco-brasileira, Peretti (1927-2022) é considerada uma das mais importantes vitralistas do país. Foi também a única mulher a integrar a equipe de criação de artistas na construção de Brasília.

A obra "Bailarina" (1920), de Victor Brecheret (1894-1955), foi arrancada do pedestal por golpistas e deixada no chão na Câmara dos Deputados, próxima da sala de reuniões das lideranças, também depredada. Considerado o introdutor do Modernismo na escultura brasileira, Brecheret (1894-1955) nasceu em Farnese, na Itália, e chegou ao Brasil em 1904, onde se instalou em São Paulo.

No Planalto, a obra "Bandeira do Brasil" (1995), de Jorge Eduardo, foi encontrada boiando na água que inundou o térreo do palácio. No terceiro andar, as esculturas "O flautista" (década de 1950), de Bruno Giorgi (1905-1993), e "Galhos e sombras", de Frans Krajcberg (1921-2017), também foram vandalizadas. Na obra do artista polonês naturalizado brasileiro, galhos que compõem o trabalho foram quebrados e jogados longe.

Há também imagens da obra "Vênus apocalíptica", da argentina Marta Minujín, de 79 anos, um dos principais nomes da arte contemporânea no país vizinho, jogada no chão, do lado de fora do edifício.

No STF, a cadeira da presidente Rosa Weber, criada pelo designer Jorge Zalszupin (1922-2020), foi arrancada. Além disso, um crucifixo foi danificado e a escultura "A justiça" (1961), do belo-horizontino Alfredo Ceschiatti (1918-1989), foi pichada com os dizeres “perdeu, mané”. A frase é uma referência a uma resposta dada pelo ministro do STF Luís Carlos Barroso a um bolsonarista, após ser hostilizado, em novembro de 2022, em Nova York.

Segundo um funcionário do Congresso, os golpistas incendiaram uma lanchonete. Atrás dela, fica o painel “Muro escultórico” (1976), do artista Athos Bulcão (1918-2008), que também sofreu com a ação dos vândalos.

O diretor de curadoria dos palácios presidenciais, Rogério Carvalho, avalia que a maioria das obras podem ser restauradas, com exceção do relógio Balthazar Martinot.

As edificações da Praça dos Três Poderes foram tombadas, em 2007 pelo Iphan. Brasília, cidade planejada ainda na década de 1950 durante o governo de Juscelino Kubitschek, também foi inscrita pela Unesco, em 1987, na lista do patrimônio mundial.

Logo após o ataque, diversas autoridades e instituições ligadas à proteção dos monumentos públicos se manifestaram.

Atentado

Em nota, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU) classificou a invasão como um atentado grave contra "o primeiro conjunto urbano do século 20 reconhecido como patrimônio mundial pela Organização das Nações Unidas".

Para José Nascimento, ex-presidente do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), o Iphan deve avaliar todo o prejuízo após a invasão.

"São crimes de dano ao patrimônio público", diz ele. "O Iphan pode fazer a imediata avaliação do que foi danificado e, então, cabe à Polícia Federal prender os terroristas." De acordo com a presidente da Comissão de Direito Urbanístico da OAB-SP, Lilian Pires, os invasores podem ser enquadrados em ao menos dois crimes – depredação do patrimônio público e depredação de patrimônio tombado. 

Marcos Olender, diretor de projetos do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios, o Icomos, afirmou ser difícil mensurar o valor das obras danificadas. "Não existe realmente um valor para essas obras de arte que foram danificadas", afirma. "O que aconteceu foi muito grave." (Com Folhapress)
 
AS OBRAS DANIFICADAS: 

• Palácio do Planalto

Tela de Di Cavalcanti

Relógio Balthazar Martinot   

Tela “Bandeira do Brasil”, de Jorge Eduardo

Escultura “O flautista”, de Bruno Giorgi

Escultura “Galhos e sombras”, de Frans Krajcberg
Escultura 'Vênus apocalíptica'

Escultura "Vênus apocalíptica"

REPRODUÇÃO

Escultura "Vênus apocalíptica", de Marta Minujín  

• Câmara dos Deputados
Vitral 'Araguaia'

Vitral 'Araguaia'

REPRODUÇÃO

Vitral “Araguaia”, de Marianne Peretti  
Escultura 'Bailarina'

Escultura "Bailarina"


Escultura “Bailarina”, de Victor Brecheret  

• STF

Cadeira do designer Jorge Zalszupin

Escultura “A justiça”,  de Alfredo Ceschiatti