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Estado de Minas FILME

Com olhar dos indígenas, "The territory" mostra drama das invasões de terra

Exibido pela National Geographic e com gravações finais produzidas e dirigidas pelos índios uru-eu-wau-wau, documentário mostra a realidade vivida na Amazônia


24/08/2022 04:00 - atualizado 23/08/2022 22:00

Incêndio nas terras dos uru-eu-wau-wau, na Amazônia, com arvores totalmente carbonizadas
Incêndios criminosos provocados por grileiros e madeireiros nas terras dos uru-eu-wau-wau fazem parte do cotidiano da tribo, que luta para preservar a área (foto: National Geographic/reprodução)

Quando a COVID-19 chegou à Amazônia brasileira e uma tribo indígena fechou o acesso a seu território, o diretor Alex Pritz encontrou uma forma inovadora de concluir seu documentário: ele entregou as câmeras aos próprios uru-eu-wau-wau. "The territory", que estreou no canal National Geographic na sexta-feira (19), acompanha a difícil situação de quase 200 caçadores-coletores que vivem em uma área protegida de floresta, cercada e invadidas por grileiros e madeireiros agressivos e ilegais.

Embora no filme apareçam com trajes tradicionais e honrando os costumes ancestrais, os uru-eu-wau-wau e seu jovem líder Bitate – protagonista do documentário – ficaram mais do que felizes em utilizar a tecnologia moderna para sua defesa.
 
"Quando a COVID aconteceu, Bitate tomou a decisão realmente ousada de dizer 'OK, sem jornalistas entrando em nosso território, não há mais cineastas, não há mais Alex, não há mais equipe de documentários, ninguém'", disse Pritz. "Precisamos ter uma conversa com ele, algo como 'OK, nós já terminamos o filme? Temos tudo o que precisamos? Há algo mais? Devemos começar a editar?'".

"Bitate foi muito claro: 'Não, não terminamos. Ainda temos muito por fazer. Vocês não tinham terminado antes, por que deveriam terminar agora?. Basta nos enviar câmeras melhores, enviem equipamentos de áudio, e nós vamos filmar e produzir a última parte do filme'".

O resultado foi um "modelo de coprodução", no qual um uru-eu-wau-wau ficou responsável pela direção do filme e a comunidade em geral assumiu a produção, com participação nos lucros e voz nas decisões comerciais sobre a distribuição.

Além de permitir que as filmagens continuassem durante a pandemia, Pritz acredita que a decisão de fornecer equipamentos e treinamento direto aos uru-eu-wau-wau beneficiou o filme ao adicionar uma "perspectiva em primeira mão" sobre as atividades do grupo, que incluem patrulhas na área para impedir invasores.

"Eu filmei várias missões de vigilância. Nenhuma entrou no corte final", disse Pritz. "Não porque queríamos transferir as filmagens... era mais cru, era mais urgente".

"Crianças digitais"

Antes mesmo da chegada da equipe de Pritz, os uru-eu-wau-wau já haviam se tornado adeptos do poder da tecnologia moderna e dos meios de comunicação para defender sua causa, presentes no cenário global como guardiões de uma floresta cuja sobrevivência está ligada a questões de mudanças climáticas e biodiversidade.

"Bitate e esta geração mais jovem dentro do uru-eu-wau-wau são crianças digitais. Ele nasceu no fim dos anos 1990. Ele está no Instagram. E isso é parte de sua forma de relacionamento com o mundo", disse Pritz.

Segundo o diretor, quando os drones que registraram imagens impressionantes e angustiantes de um grande desmatamento aparecem no início do documentário, muitos espectadores imaginam que pertencem aos cineastas. Mas, de fato, as câmeras voadoras foram compradas e operadas pelos próprios uru-eu-wau-wau.

"Enquanto teria levado quatro dias para atravessar a pé as montanhas na floresta espessa e densa, com o drone você chega no destino em 30 minutos e tem imagens marcadas com metadados", explica Pritz. "As pessoas não podem argumentar contra isso".

Bitate e esta geração mais jovem dentro do uru-eu-wau-wau são crianças digitais. Ele nasceu no fim dos anos 1990. Ele está no Instagram. E isso é parte de sua forma de relacionamento com o mundo

Alex Pritz, diretor de ''The territory''


Crime na floresta

E este é um grande contraste com os grileiros, também personagens centrais do documentário. O filme mostra um grupo no momento em que derruba e incendeia florestas sob proteção, abrindo espaço de maneira ilegal para rodovias em um território que um dia desejam estabelecer e reivindicar como próprio.

O acesso foi possível porque muitos grileiros se consideram pioneiros heroicos. Nas entrevistas com Pritz, eles falam sobre a abertura da floresta tropical para o bem da nação. É uma mistura explosiva de cultura dos cowboys do "oeste selvagem" de filmes americanos e propaganda nacionalista alimentada pelo presidente Jair Bolsonaro.

"Eram pessoas ingênuas que não entendiam o contexto histórico de suas ações, as consequências ecológicas, o que estavam fazendo para o resto do planeta", disse Alex Pritz. Para os invasores, muitos deles sem educação formal ou qualquer outra oportunidade econômica, "era apenas sobre 'eu e o que é meu', 'apenas este pequeno lote', 'se eu conseguir apenas isto'".

"Bitate tem a perspectiva expansiva, ele está pensando na mudança climática. Ele está pensando no planeta. Ele é politicamente experiente, orientado para a mídia", afirma o cineasta.

Este ano, "The Territory" levou dois prêmios no Festival de Sundance, nos Estados Unidos: preferido do mundo/documentário mundial e prêmio especial do júri. Também foi premiado em festivais internacionais na Filadelfia e em Seattle. 


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