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Estado de Minas CINEMA

Filme brasileiro "Regra 34" vence o Festival de Locarno

Filme de Julia Murat tem personagem ambígua que atua na Justiça em defesa de mulheres vítimas de abuso e fatura na internet com associação de sexo e violência


15/08/2022 04:00 - atualizado 15/08/2022 08:56

Cena do fillme 'Regra 34'
Sol Miranda (à dir.) interpreta a protagonista, uma jovem advogada que quer prestar concurso para a Defensoria Pública e, ao mesmo tempo, vende conteúdo erótico na internet (foto: Imovision/Divulgação)

Na internet, há uma máxima que diz: “se algo existe, há uma versão pornô”. Esse princípio é conhecido como regra 34, e defende que há pornografia em toda criação imagética que está associada ao meio virtual, desde personagens de filmes e séries - em sua maioria, animes, desenhos animados e personagens de videogame -, até objetos dos mais variados que despertam fetiches nas pessoas. 

A cineasta carioca Julia Murat partiu dessa ideia para conceber o filme “Regra 34”, que ganhou o Leopardo de Ouro de melhor filme internacional em competição no Festival Locarno, na Suíça, no último sábado (13/8).

Estrelado por Sol Miranda, Lucas Andrade, Lorena Comparato e Isabela Mariotto, o longa acompanha o dilema de Simone (Sol Miranda), uma jovem advogada negra que, para custear os estudos preparatórios para o concurso da defensoria pública, torna-se camgirl (uma espécie de stripper on-line).

O dilema, contudo, se dá devido à “vida dupla” da protagonista. Enquanto trabalha na Justiça em defesa de mulheres exploradas e vítimas da violência doméstica, ela mergulha em um mundo de erotismo exacerbado, no qual se depara com diversas brutalidades. 

Prazer

Em suas performances de camgirl, Simone lança mão da associação de atos dolorosos à prática sexual. Asfixia, socos e queimaduras por ponta de cigarro são apenas alguns dos recursos utilizados pela protagonista para levar prazer a seus espectadores e, consequentemente, conseguir dinheiro. 
 
 
 
Nas redes sociais, a cineasta comentou a escolha de Sol Miranda como protagonista do longa. “Foi um longo processo de casting, portanto. E a definição não foi fácil. Quando vi a Sol pela primeira vez, ela me fascinou. Tinha algo nela inacessível, algo que, mesmo escondido, aparecia. Eu não sabia dizer o que era. Quis escolhê-la, mas quase todos à minha volta ficaram com medo. Afinal, não era óbvia a ideia de escolher uma mulher negra para fazer um personagem que descobria o desejo pela violência”, escreveu.

Se com uma mulher branca, o risco já era enorme, com Sol esse risco era ainda maior, avaliava a equipe. Julia, portanto, continuou na busca pela atriz que interpretaria Simone por mais alguns meses, mas Sol não saiu da cabeça da diretora, até que, por fim, ela se rendeu.

“Conversamos com muitos atores maravilhosos que foram lendo o roteiro e discutindo com a gente. Em algum momento, resolvemos admitir que era ela e assumir mais esse risco. E para nossa sorte ela resolveu se arriscar junto com a gente. Hoje sinto que era isso que eu via nela: essa força de se arriscar, de se jogar para dentro, enfrentar seus medos e estar ali, inteira”, comentou a diretora.

Assinam o roteiro, além da diretora,  Gabriela Capello, Rafael Lessa e Roberto Winter. O longa, produção das brasileiras Esquina Filmes e Bubbles Project e da francesa Still Moving, será distribuído no Brasil pela Imovision.

Produção

“Minha filha, Lina, volta e meia me pergunta: ‘Mamãe, há quanto tempo você está fazendo esse filme?’. Respondo para ela que as primeiras ideias começaram ali em 2014, quando ela tinha apenas 2 anos. ‘Demora muito isso de fazer um filme, né?’, ela sempre responde”, contou Julia, em suas redes sociais.

Em seu depoimento, ela revela que, quando iniciou a concepção de “Regra 34”, nutria esperanças de que as manifestações populares iniciadas em 2013 seriam capazes de ajudar a expor contradições que ocorriam no Brasil há duas décadas em pleno período democrático.

“Mas logo veio o impeachment, veio a ascensão dessa direita, e as coisas foram ficando cada vez mais amargas. Ganhei o primeiro dinheiro para fazer o filme no mesmo ano em que Bolsonaro foi eleito. E agora, José? Fazia sentido continuar fazendo um filme cujo intuito era criticar o campo progressista?”, comentou a diretora.

Com a eleição de Jair Bolsonaro, ela cogitou devolver o valor recebido para filmar o longa, contudo, pensou melhor e chegou à conclusão de que, em meio a tanto discurso de ódio e perseguição política, o combate à autocensura se faz extremamente necessário, principalmente levando em consideração o atual momento em que se discute a possibilidade de uma ruptura democrática no país.

O reconhecimento de “Regra 34” no Festival de Locarno respalda a resistência dos cineastas brasileiros, sobretudo diante do descaso do poder público com o segmento cultural. Vale lembrar que, em julho do ano passado, um incêndio atingiu a Cinemateca Brasileira, em São Paulo, destruindo parte de seu acervo.

A última vez que um brasileiro havia recebido o Leopardo de Ouro em Locarno foi em 1967, quando Glauber Rocha (1939-1981)venceu com “Terra em transe”, que se tornaria um clássico do cinema novo.

Nesta edição da mostra suíça, outros brasileiros foram contemplados em diferentes categorias. “Big Bang”, de Carlos Segundo, levou o Pardino de Ouro, de melhor curta-metragem de autor, e “É noite na América”, de Ana Vaz, recebeu menção especial no Pardo Verde, dedicado a filmes que trazem a temática ambiental. (Com France Presse)


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