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Estado de Minas ARTES CÊNICAS

Angústias pandêmicas migram do Facebook para o palco do CCBB-BH

Grupo Teatral Encena estreia peça de Silvia Gomez sobre o vazio, a empatia e o luto vivenciados em meio ao avanço da COVID-19


18/06/2022 08:40 - atualizado 18/06/2022 08:47

Gustavo Werneck, Christiane Antuña, Raquel Lauar, Arthur Barbosa e Wilson Oliveira sorriem para a câmera
Gustavo Werneck, Christiane Antuña, Raquel Lauar e Arthur Barbosa, dirigidos por Wilson Oliveira, interpretam quatro amigos diante do luto (foto: Guto Muniz/divulgação )

Nos meses iniciais da pandemia, cada um se virou como pôde. No caso da dramaturga Silvia Gomez, as angústias foram levadas ao Facebook. Pequenas postagens com frases avulsas - algumas dela mesma, outras que recolheu em interações via whatsapp, videoconferência ou telefone, a comunicação possível durante o isolamento - deram origem a “Pequena coleção de frases em tempos de fundos pensamentos”.

O projeto de rede social acabou se tornando texto para ser apresentado on-line que, por sua vez, originou o espetáculo homônimo, a 19ª peça do Grupo Teatral Encena. Em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), onde cumpre temporada de quatro semanas até 11 de julho, é também a primeira montagem mineira para palco de um texto de Silvia Gomez, belo-horizontina radicada em São Paulo há duas décadas.

AMIGOS

Sob a direção de Wilson Oliveira, os atores Gustavo Werneck, Christiane Antuña, Raquel Lauar e Arthur Barbosa interpretam quatro amigos que se reencontram após a morte de uma amiga comum.

“Conversando sobre o que ela deixou, os personagens falam sobre o que está acontecendo com o Brasil e com eles mesmos. A partir da situação de insegurança geral no mundo e da própria existência, eles precisam se apoiar para continuar. É um texto otimista, que gera ampla discussão”, diz Oliveira.

Até que o texto final ficasse pronto para ser encenado houve longo caminho, relembra Silvia. “Senti que principalmente no momento inicial da pandemia, a comunicação e os diálogos tinham ficado muito urgentes. Pelo menos no meu círculo, as conversas eram mais sinceras, a fala se tornou fervilhante.”

Em maio de 2020, ela já tinha o texto de “Pequena coleção de frases...”, que foi selecionado para o projeto “Cenas do confinamento – Leituras dramáticas virtuais”. Este rendeu um e-book com trabalhos de autores brasileiros, argentinos, colombianos, espanhóis e peruanos.
 
Silvia Gomez sorri para a câmera, atrás de pequenos galhos de uma árvore
A dramaturga Silvia Gomez conheceu as coxias do Encena ainda criança, levada pela tia, a diretora Yara de Novaes (foto: Arquivo Pessoal)
 

TIA YARA

Antes mesmo da crise sanitária, Silvia Gomez havia conversado com Oliveira sobre a possibilidade de o Encena montar um texto dela. “Foi o primeiro grupo que vi se reunir para fazer teatro. Ainda na infância, nos anos 1980, a tia Yara (de Novaes, que participou da fase inicial da companhia) me levava para os ensaios. Considero que minha formação teatral começou ali, vivenciando as coxias. Então, estou orgulhosa de escrever para eles, que me apresentaram o teatro.”

Autora de textos sobre o tempo presente, normalmente questões que a incomodam, Silvia deixou Belo Horizonte no início dos anos 2000. O jornalismo a levou para São Paulo e foi naquela cidade que ela começou a escrever para teatro.

A mineira estudou e trabalhou muito tempo no Centro de Pesquisa Teatral (CPT), criado por Antunes Filho, onde, até 2011, atuou no chamado círculo da dramaturgia. A estreia profissional como autora se deu em 2008, com a montagem “O céu cinco minutos antes da tempestade”.
 

''Fazemos peças infantis, juvenis e adultas com o foco sempre nos conflitos do homem urbano. É algo importante para nós, talvez porque vivamos todos em grandes cidades, o que gera tensão e conflito''

Wilson Oliveira, diretor

 

Wilson Oliveira, que formou o Encena em 1984 – ao lado de Gustavo Werneck, Yara de Novaes, Fernando Ernesto e Elisa Santana –, leu a primeira versão do texto e confirmou a intenção de levá-lo para os palcos. “Mas eu precisava que ela ampliasse o texto para que virasse dramaturgia para teatro. Conversamos muito tempo, observando o que estava acontecendo naquele momento histórico”, ele conta.

A primeira versão foi aprovada. “Disse a ela que queria todas as palavras que estavam ali, mas de forma que os personagens pudessem interagir.” Silvia fez a segunda versão. “É um texto para o palco, mas sempre assumindo o lugar do experimental. Hoje podemos definir o teatro contemporâneo de muitas formas”, acrescenta ela.

FIGURINHAS 

De posse das duas versões, Oliveira e a assistente de direção Adelia? Carvalho trabalharam no texto final. “A perda de uma grande amiga representa um pouco o tempo de luto. Ao se encontrarem para conversar, trocar essa coleção de figurinhas, os personagens refletem sobre questões às vezes pessoais, às vezes coletivas.

O próprio título, ‘Pequena coleção de frases’, traz a ideia do falar como espaço que nos salva do vazio, que permite o encontro com outro. As frases fundas e inquietantes borbulham dentro de nós. Quanto mais os personagens falam, mais chegam num lugar absurdo”, acrescenta Silvia.

O Encena vem trabalhando a nova montagem há três meses. É o primeiro espetáculo do grupo desde 2019, quando houve a temporada de “A morte e a donzela”, de Ariel Dorfman. Caminhando para os 40 anos de sua fundação – em 2024 –, a trupe tem mantido boa média de espetáculos, um a cada dois anos.
 
“Fazemos peças infantis, juvenis e adultas com o foco sempre nos conflitos do homem urbano. É algo importante para nós, talvez porque vivamos todos em grandes cidades, o que gera tensão e conflito”, explica o diretor.

Formado em teatro pelo Cefart (então Cefar, Centro de Formação Artística da Fundação Clóvis Salgado), Oliveira foi logo depois para a Oficina de Teatro, escola livre criada por Pedro Paulo Cava. Ali se encontrou com Yara e Gustavo, também estudantes. “Disse para eles que ninguém chamaria a gente, então deveríamos fazer uma peça”, relembra.

TORTURA E CENSURA

Na época, Oliveira havia se encantado com “A lira dos 20 anos”, de Paulo César Coutinho. Com título que alude à obra máxima do poeta romântico Álvares de Azevedo, a peça, montada no fim da ditadura militar (1964-1985), acompanha um grupo de jovens que luta a favor da liberdade e contra a tortura e a censura nos anos 1960.

“Era um texto tão parecido com o que a gente pensava da vida, então resolvemos fazer. Foi uma montagem eletrizante, pois estávamos motivados pelo mesmo tema”, diz o diretor. Da formação inicial do Encena permaneceram ele e Gustavo Werneck – Christiane Antuña entrou uma década depois.

Desde então, a cada montagem o Encena trabalha com atores de diferentes gerações. Com o grupo, Raquel Lauar participou da peça “Nossa cidade”. Já Arthur Barbosa, ator recém-formado, está fazendo seu batismo no Encena em “Pequena coleção de frases...”.

“Gosto de reunir quem está chegando agora e quem já está no grupo há mais tempo”, finaliza Wilson Oliveira.

“PEQUENA COLEÇÃO DE FRASES EM TEMPOS DE FUNDOS PENSAMENTOS”

Espetáculo do Grupo Teatral Encena. Teatro 1 do Centro Cultural Banco do Brasil – CCBB BH. Praça da Liberdade, 450, Funcionários, (31) 3431-9400. Temporada de sexta a segunda-feira, às 20h, até 11 de julho. Ingressos: 
R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia-entrada), na bilheteria e pelo site www.eventim.com.br






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