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Estado de Minas AUDIOVISUAL

Pandemia faz longa de "Hermanoteu" abrir mão do cinema e estrear hoje na TV

Adaptação da peça da trupe brasiliense Os Melhores do Mundo para as telas sofreu adiamentos e teve estratégia de lançamento reformulada


12/02/2022 04:00 - atualizado 12/02/2022 04:09

dois atores e equipe de filmagem gravam no deserto do Atacama, no Chile
Na adaptação para as telas da montagem da trupe brasiliense Os Melhores do Mundo, o deserto do Atacama, no Chile, foi escolhido como cenário (foto: Os Melhores do Mundo/Divulgação)

Uma coincidência marcou a entrevista com o ator Jovane Nunes, feita na semana passada, para falar sobre o filme “Hermanoteu na terra de Godah”, que estreia neste sábado (12/2), no Telecine. Uma das fotos do ator Ricardo Pipo no deserto do Atacama, no Chile, que serviu de locação para o longa-metragem, foi feita em 3 de fevereiro de 2019, exatos três anos antes do bate-papo sobre o trabalho concluído. 

“A COVID parou tudo. Parou o filme que estava em pós-produção, parou o projeto de lançamento do longa, de uma peça nova. A gente ficou vendo o que ia acontecer, todo mundo ficou em casa naquele primeiro momento. E a gente volta agora, numa situação com o Telecine, que é muito boa para a gente, porque as pessoas não estão saindo ainda”, comenta o ator. 

"Hermanoteu'' é uma das peças de maior sucesso da companhia Os Melhores do Mundo, que tem sede em Brasília. A montagem, que conta a história e as confusões de um homem enviado por Jeová para salvar o povo da fictícia Godah, passou pelos palcos de todas as capitais do Brasil, fez apresentações no exterior e, em novembro do ano passado, cumpriu mais uma temporada no Palácio das Artes, em Belo Horizonte, com ingressos esgotados.

A estimativa da companhia é que 3 milhões de pessoas tenham assistido à peça, cuja estreia ocorreu em 1995. Com a exibição na TV, a expectativa de Jovane é que o público seja ampliado em até 20 vezes.

PARTICIPAÇÕES

O longa tem direção de Homero Olivetto e reúne, além de Ricardo Pipo e Jovane Nunes, Adriano Siri, Welder Rodrigues, Victor Leal e Adriana Nunes, todos do elenco da companhia Os Melhores do Mundo, e ainda Marcos Caruso, Milton Gonçalves e Jonas Bloch em participações especiais.

Curioso que o sucesso de Hermanoteu surgiu com as cópias piratas do DVD da peça, lançado em 2009. “Muita gente que não ia ao teatro passou a ir por uma curiosidade que o DVD causou. Mas muita gente ainda não foi ao teatro porque o teatro é caro. Hoje as pessoas não conseguem comprar o botijão de gás, comida... O teatro fica numa situação lá para o final da fila”, diz Jovane, que repete a parceria com Vítor Leal, seu colega de trupe, na assinatura do roteiro para cinema. Os dois são autores do texto do teatro. 

“Não poderia ser a mesma história do palco, porque no palco o personagem é muito passivo, não acontece nada com ele, que sofre, peregrina, e as pessoas chegam até ele para conversar. Ele precisaria de uma trajetória do herói”, observa Jovane.  

“Foi preciso trazer novidades para quem já viu a peça, garantindo diversão também para quem nunca ouviu falar. O fã quer identificar coisas ali dentro do filme”, diz, citando o caso do casal Jajá (Welder Rodrigues) e Juju (Adriana Nunes), que ficou famoso no extinto programa “Zorra total” (Globo).

 

A reação do público à exibição do trailer do filme, na semana passada, em Brasília, após mais uma sessão da peça, deixou Jovane orgulhoso. “O pessoal delira com Jajá e Juju. Lembrei-me daquele trailer dos ‘Vingadores – Guerra infinita’ (2018), quando aparece o Homem-Aranha e o pessoal ohhhhhhhhhh! Eu falei: Pô, o Jajá e a Juju são o nosso Homem-Aranha da Marvel.”

Outra novidade é a dupla formada por Isaac e Hermanoteu. “O filme abre com os dois dando um golpe ali na praça e termina com eles juntos, voltando para casa. Acho que funcionou”, diz, dando uma informação que não tira a graça e a surpresa da história.  

Jovane Nunes, vestido como César, em cima de uma bancada, em cena de hermanoteu na terra de godah
O ator e roteirista Jovane Nunes, que interpreta César, diz que a equipe não se intimidou nem mesmo diante de um incêndio na locação, no Rio de Janeiro (foto: Os Melhores do Mundo/Divulgação)


PIADA

O anjo analfabeto, que faz o maior sucesso no teatro, também garante boas gargalhadas no filme. “A piada é tão boa que a gente vai adaptando para o analfabeto do momento”, conta. No ano passado, em Belo Horizonte, a plateia gargalhou quando uma personagem diz que o anjo estudou na mesma escola em que o presidente Jair Bolsonaro. 

A despeito da ironia, a personagem do anjo tem uma história afetiva. “Meu pai era semialfabetizado, gostava de ler e lia o jornal em voz alta, de noite, assim: ‘Ó góvérnó vai alfalta as rua da cidade. Ó, o governo vai asfaltar as ruas!’. Quando fomos fazer a peça, eu falei: Pô, eu vou fazer esse anjo lendo igual o meu pai lia.”

O ator e roteirista observa que “grande parte da população do Brasil foi alfabetizada há muito pouco tempo. Lá pelos anos 80, 90, houve um esforço muito grande de alfabetização. Antes disso, 50%, 60% da população brasileira não sabia ler nem escrever”.

As cenas de peregrinação de Hermanoteu seriam rodadas no Nordeste brasileiro, mas o orçamento ficou tão alto que foi mais viável levar parte da equipe para o deserto do Atacama. A trupe só não imaginava que os bastidores das locações renderiam filmes paralelos. No deserto, por exemplo, onde menos chove no mundo, a equipe foi recebida com uma tempestade. “Parecia que estava caindo o mundo. Mas no outro dia o céu abriu e ficou lindo e nós fizemos (a gravação).”

Em uma pedreira, no Rio de Janeiro, um incêndio obrigou todos a saírem correndo, salvando o que pudessem. “Atores, figurantes, todo mundo levando os figurinos, até que o Corpo de Bombeiros chegou e apagou tudo. Mas não perdemos a diária (de filmagem), porque quando apagou o fogo, a gente falou: ‘Bora que tem mais duas cenas pra fazer’. E fomos em frente.” 

"A gente tem necessidade de contar histórias e uma necessidade louca, louca de ouvir histórias. E como a gente vive sem ouvir uma boa história? Como a gente ia viver sem as histórias que falam da gente, que refletem o que nós somos? Enquanto houver ser humano no mundo, haverá essa reflexão do teatro. Não é a COVID, não é nada disso que vai acabar com o teatro. Ele se reinventa, ele sobrevive"

Jovane Nunes, ator da companhia Os Melhores do Mundo


COMPARAÇÃO

Um vídeo de uma apresentação de “Hermanoteu”, feito em 2014 e disponível no YouTube, levou Jovane a comparar Os Melhores do Mundo com Os Simpsons, desenho famoso por suas previsões do futuro. Na cena da trupe brasileira, Hermanoteu está saindo de casa quando Micalateia, sua irmã, entrega a ele itens para sua peregrinação, incluindo uma máscara hospitalar. “Dá para você ir para o México”, diz. “Tudo o que acontece hoje em dia as pessoas não dizem: ‘Oh, os Simpsons falaram disso!’”, brinca.

Apesar das dificuldades do teatro, ainda mais severas com a pandemia, Jovane tem confiança na recuperação no setor. “Acho que o teatro só não sobreviveu à queda do meteoro que acabou com os dinossauros porque eu não sei se os dinossauros tinham teatro. O teatro sobrevive a tudo, sobreviveu às guerras, a todas as pestes que a humanidade já passou. Parece que ele vai e volta mais forte.”

Os Melhores do Mundo completará 27 anos de fundação neste 2022, mas a história da companhia  é anterior à efeméride. Em sua primeira formação, o grupo foi batizado como A Culpa é da Mãe. Com a entrada de Adriano Siri no elenco, estipulou-se a data de aniversário. Desde então, não houve alteração do elenco, que segue em ótima convivência. 

“Você vai envelhecendo, vivendo e os interesses vão mudando. Passamos daquela idade de ter aquela briga que acaba, sabe? Isso acontece quando você não experimentou nada e fica: ‘Que loucura, ai meu trabalho!’. A gente já passou por esse auge do sucesso e, graças a Deus, se estabilizou numa calmaria”, afirma.

Ao longo de sua carreira, o grupo enfrentou poucas polêmicas, surpreendentemente, sobretudo considerando que a mistura de religião com comédia nem sempre dá bom resultado. Diferentemente dos especiais de Natal do Porta dos Fundos, por exemplo, apenas um texto, “Dingou béus”, chamou a atenção de religiosos, mas virou piada. 

Na peça, os reis magos se atrasam para a visita a Jesus e, quando chegam a Jerusalém, o Messias já tem 7 anos de idade. Na temporada em Brasília, o elenco começou a perceber um público que não era exatamente o da companhia, até se dar conta de que um padre tinha ido assistir à peça e recomendou aos fiéis não irem vê-la. “Ele dizia: ‘Não assistam! Não assistam! As pessoas ficam rindo, ficam morrendo de rir, mas é blasfêmia, rindo de blasfêmia. Não é pra ir de jeito nenhum, que é o riso do pecado’.” Bastou para o teatro encher.  

Base do humor do grupo, o improviso em certas situações acabou sendo definitivamente incorporado ao texto, tanto do teatro quanto do cinema. Um exemplo é a cena em que César (Jovane Nunes) quer transformar Hermanoteu em senador. A personagem solta um “uai, sô!”.

“O 'uai, sô' é de Minas, mas já é uma coisa popular no Brasil inteiro. Então, todo mundo no Brasil, quando vê aquilo, ri”, diz Jovane, lembrando que a expressão foi usada pela primeira vez em uma das apresentações no Palácio das Artes. “É nóis!”


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