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Estado de Minas LITERATURA

Conheça a história da escritora mineira premiada postumamente com o Jabuti

Maria Lúcia Alvim foi a vencedora na categoria poesia com ''Batendo pasto'', livro que manteve inédito durante décadas. Ela morreu de COVID, em fevereiro


27/11/2021 04:00 - atualizado 27/11/2021 08:05

Close no rosto de Maria Lúcia Alvim de olhos fechados e com as mãos na face
Afastada do mercado editorial, Maria Lúcia Alvim vivia em uma casa para idosos em Juiz de Fora, quanto foi procurada, no ano passado, por dois jovens poetas fascinados por sua literatura e interessados em ver sua produção publicada (foto: Sebastião Rocha Reis/Divulgação)
O anúncio, na noite da última quinta-feira (25/11), dos vencedores da edição 2021 do Prêmio Jabuti jogou um pouco mais de luz sobre a poeta mineira Maria Lúcia Alvim, que teve seu livro “Batendo pasto” consagrado na categoria poesia. Morta em fevereiro deste ano, aos 88 anos, vítima da COVID-19, ela concorria com outras quatro mulheres: Jussara Salazar, Prisca Agustoni de Almeida, Micheliny Verunschk e Mar Becker.

O fato de ter seu livro listado entre os cinco finalistas comprova que Maria Lúcia não estava fora do radar dos círculos literários no Brasil, mas tampouco seu nome ocupou lugar de grande evidência ao longo de uma trajetória que teve início em 1959, com a publicação de “XX Sonetos”. 

A partir dessa estreia, Maria Lúcia Alvim lançou apenas outros quatro livros ao longo das duas décadas seguintes: “Coração incólume” e “Pose”, ambos em 1968, “Romanceiro de Dona Beja”, em 1979, e “A rosa malvada”, em 1980.

Depois disso, aparentemente, afastou-se da produção literária – ou pelo menos do mercado editorial. As cinco obras lançadas foram reunidas em um único volume, “Vivenda (1959-1989)”, da Claro Enigma, cultuada coleção de poesia que Augusto Massi editou entre 1988 e 1991 pela livraria Duas Cidades. Essa antologia foi, de certa forma, o ponto de partida para que se chegasse, três décadas depois, ao lançamento de “Batendo pasto”.

BUSCA

Poeta brasiliense radicado em Curitiba, Guilherme Gontijo Flores comprou e se encantou com “Vivendas”, que tratou como uma grande descoberta. Foi nesses termos que ele escreveu sobre o livro em seu blog e comentou a respeito com o amigo Ricardo Domeneck, poeta paulista radicado em Berlim, que também ficou fascinado com a verve de Maria Lúcia.

Os dois passaram a procurar pela poeta, pois sequer sabiam se estava viva. Descobriram-na em Juiz de Fora, em uma residência para idosos, onde estava desde 2011. No início de 2020, quando passou uma temporada no Brasil, Domeneck foi ao encontro dela. 

“Queria conhecê-la, criar uma relação de confiança. Naquele momento, não sabíamos que havia um manuscrito”, disse o poeta ao Estado de Minas, em agosto do ano passado, por ocasião do lançamento de “Batendo pasto”.

Após os primeiros contatos, ele organizou um evento em homenagem a Maria Lúcia, em março, na Livraria da Travessa de Botafogo, no Rio de Janeiro. Entre os amigos da poeta presentes, estava Paulo Henriques Britto, que foi quem contou a Domeneck sobre a existência do manuscrito de “Batendo pasto”.

Também ouvido pela reportagem do Estado de Minas na ocasião do lançamento do livro agora vencedor do Prêmio Jabuti na categoria poesia, Britto contou que conheceu Maria Lúcia nos anos 1980, que se tornaram amigos e que depois, quando a poeta já tinha retornado a Minas e se estabelecido em Juiz de Fora, ela foi ao Rio e o procurou para dizer que tinha um livro prontinho em mãos e que gostaria que ele escrevesse a apresentação.

“Ela veio com a história de que queria que fosse publicado logo que morresse. E ainda queria que os originais ficassem comigo. Eu disse que ficaria com a cópia, a duras penas a convenci a tirar o xérox”, relatou o amigo. O livro, conforme o pedido da autora, permaneceu na gaveta de Britto, até ele contar a história a Domeneck, que, juntamente com Gontijo Flores, encaminhou a publicação da obra.

RECONHECIMENTO

Maria Lúcia Alvim nasceu em Araxá, em uma família com outros quatro irmãos – três deles também poetas. Francisco Alvim, conhecido como Chico Alvim no meio literário, é o único ainda vivo. No ano passado, ele afirmou, sobre a trajetória entrecortada, em termos de reconhecimento, que sua irmã cumpriu ao longo da vida: 

“Mais cedo ou mais tarde, o reconhecimento viria, pois Maria Lúcia tem uma poesia notável. Não é que não tenha havido reconhecimento. Ele existiu desde o início, pois ‘XX Sonetos’ recebeu o prêmio da ‘Gazeta de Notícias’, de São Paulo, que tinha muito prestígio. Houve uma segunda onda, com a coleção Claro Enigma, da qual ela foi uma das primeiras convidadas. Agora veio o interesse de outra geração de poetas. E esta é a (onda) mais importante de todas, pois eles estão fazendo uma leitura da poesia da Maria Lúcia muito viva e diferente das outras”.

Como foi pouco publicada, Maria Lúcia também foi pouco estudada. Um dos raros trabalhos de peso sobre sua obra é a dissertação “A narrativa histórica na poesia de Maria Lúcia Alvim: Romanceiro de Dona Beja”, que Juliana Veloso Mendes defendeu em 2015 no mestrado da Faculdade de Letras da UFMG. 

“Ela domina de modo magistral a forma poética transitando entre versos livres e rimas, poemas curtos e longos, formas tradicionais e modernas, colocando-as em diálogo”, disse, por ocasião do lançamento de “Batendo pasto”.

Maíra Nassif, diretora da editora Relicário, pela qual a obra vencedora do Jabuti foi publicada, considera que o prêmio póstumo coroa não só Maria Lúcia, mas todas as cinco finalistas na categoria poesia – já que se tratou de um feito inédito ter apenas mulheres concorrendo ao prêmio. 

Também concorrente na categoria poesia, a pernambucana Jussara Salazar afirmou, na véspera do resultado: “São poetas contemporâneas que se conhecem, que trocam ideia, e são poetas de uma certa geração que começaram a escrever juntas, com exceção da Lúcia Alvim, que certamente também estaria pensando dessa forma. É uma representatividade inédita das mulheres, e fico bastante feliz e honrada de estar participando dessa edição do prêmio que traz essa característica tão importante”. 

NELSON CRUZ

Outro mineiro que se destacou na edição deste ano do prêmio Jabuti foi o ilustrador Nelson Cruz, que, juntamente com João Luiz Guimarães, responde por “Sagatrissuinorana”, anunciado como o Livro do Ano. 
A 63ª edição da principal distinção literária do Brasil coroou a obra no evento on-line apresentado na noite da última quinta-feira por Dan Stulbach, e que teve uma bonita homenagem ao escritor Ignácio de Loyola Brandão, apontado como Personalidade Literária do ano.

“Em 56 anos de carreira, recebi cinco Jabutis, um por década. Então espero ainda conquistar mais um. Quando o livro é lido, a alegria é imensurável. E quando vem um prêmio, a alegria é muito maior. Jamais imaginei que pudesse ser a Personalidade do Ano nesta edição. Estou muito emocionado”, afirmou Loyola Brandão.

Logo depois da homenagem, ele anunciou “Sagatrissuinorana” como o grande vencedor da noite. Os dois autores entraram ao vivo para falar sobre a honraria. “Ganhar esse prêmio no ano em que o Ignácio é homenageado é algo incrível. É um dos melhores dias da minha vida”, disse João Luiz Guimarães. 

“Estamos tocando as gerações do futuro, falando da importância do meio ambiente”, acrescentou. Nelson Cruz lembrou que o livro é dedicado às vítimas da tragédia de Mariana e Brumadinho. A obra também ganhou na categoria Infantil. 

“O avesso da pele”, de Jeferson Tenório, venceu em Romance Literário. Já “Corpos secos”, de Luisa Geisler, Marcelo Ferroni, Natalia Borges Polesso e Samir Machado de Machado,  conquistou o prêmio de Romance de Entretenimento. Ainda no Eixo Literatura, “Flor de gume”, de Monique Malcher, ganhou como melhor Conto. Em Crônica a escolha foi “Histórias ao redor”, de Flávio Carneiro.

Na categoria Histórias em Quadrinhos, venceu “META: depto. de crimes metalinguísticos”, de André Freitas, Dayvison Manes, Marcelo Saravá e Omar Viñole. O prêmio de melhor livro Juvenil foi para “Amigas que se encontraram na história”, de Angélica Kalil e Amma. (Com Agência Estado)


“BATENDO PASTO”
• Maria Lúcia Alvim
• Relicário Edições (132 págs.)
• R$ 39


Prêmio Jabuti 2021


Confira os principais vencedores

Conto
• “Flor de gume”, de Monique Malcher (Editora Jandaíra)

Crônica
• “Histórias ao redor”, de Flávio Carneiro (Cousa)

Histórias em Quadrinhos
• “META: Depto. de Crimes Metalinguísticos”, de André Freitas, Omar Viñole, Marcelo Saravá, Dayvison Manes (Zarabatana Books)

Infantil
• “Sagatrissuinorana”, de João Luiz Guimarães e Nelson Cruz (ÔZé Editora)

Juvenil
• “Amigas que se encontraram na história”, de Amma, Angélica Kalil (Quintal Edições)

Poesia
• “Batendo pasto”, de Maria Lúcia Alvim (Relicário)

Romance de Entretenimento
• “Corpos secos”, de Marcelo Ferroni, Natalia Borges Polesso, Samir Machado de Machado, Luisa Geisler (Alfaguara)

Romance Literário
•“O avesso da pele”, de Jeferson Tenório (Companhia das Letras)

Artes
• “Atlas fotográfico da cidade de São Paulo e arredores”, de Tuca Vieira, Guilherme Wisnik, Henrique Siqueira (AYO)

Biografia, Documentário e Reportagem
• “A república das milícias: dos esquadrões da morte à era Bolsonaro”, de Bruno Paes Manso (Todavia)

Ciências
• “Ciência no cotidiano: viva a razão. Abaixo a ignorância!” , de Carlos Orsi, Natalia Pasternak (Contexto)

Ciências Humanas
• “Sobreviventes e guerreiras”, de Mary Del Priore, Planeta do Brasil

Ciências Sociais
• “A razão africana: breve história do pensamento africano contemporâneo", de Muryatan S. Barbosa (Todavia)

Economia Criativa
• “Prato firmeza preto: guia gastronômico das quebradas de SP”, de Guilherme Petro, Jamile Santana, Milu Araujo, Amanda Rahra (Énois Inteligência Jovem)

Capa
• “Sul da fronteira, oeste do sol”, de Ana Paula Hentges, Gabriela Heberle, Bruno Miguell Mendes Mesquita, Sabrina Gevaerd (Alfaguara)

Ilustração
• “Carona”, de Guilherme Karsten (Companhia das Letrinhas)

Projeto Gráfico
• “O médico e o monstro”, de Giovanna Cianelli (Antofágica)

Tradução
• “Divã ocidento-oriental”, de Daniel Martineschen (Estação Liberdade)

Fomento à Leitura
• “Slam interescolar SP”, de Emerson Alcalde (Emerson Alcalde)

Livro Brasileiro Publicado no Exterior
• “Tupinilândia”, de Samir Machado de Machado (Editions Métailié, Todavia)


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