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Estado de Minas

Minas sediará filmagens de Órfãs da Rainha, que aborda Inquisição Portuguesa

Diretora mergulha na vida das mulheres enviadas ao Brasil para formar as primeiras famílias


postado em 04/01/2020 04:00 / atualizado em 03/01/2020 15:56

Vila cenográfica foi montada em Tocantins, na Zona da Mata: filmagens começam no fim de janeiro (foto: Fotos: Jonathas Marques Abrantes/DIVULGAÇÃO)
Vila cenográfica foi montada em Tocantins, na Zona da Mata: filmagens começam no fim de janeiro (foto: Fotos: Jonathas Marques Abrantes/DIVULGAÇÃO)
A Inquisição no Brasil é um dos episódios menos conhecidos da nossa história, mas não menos relevantes. Ela é a inspiração de As órfãs da rainha, novo filme da cineasta mineira Elza Cataldo, que começa a ser rodado no fim de janeiro no interior de Minas.

Junto com a colonização portuguesa no Brasil, que se efetivou a partir de 1530, muitas transformações – de ordem política e econômica – ocorreram em algumas capitanias, sobretudo na Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro, onde havia maior concentração de colonos. As missões jesuítas e outras ações operadas pela Igreja Católica estavam intimamente ligadas ao processo colonizador. A presença da Inquisição entre os séculos 16 e 18 faz parte desse contexto, perseguindo principalmente judeus que vieram da Europa. “Poucas pessoas sabem que houve Inquisição no Brasil. Não teve fogueira nem um tribunal grande como o Tribunal do Santo Ofício, mas ela perseguiu. Os casos mais graves eram enviados para Portugal e lá, sim, eram queimados em praça pública”, comenta Elza.

É dentro dessa conjuntura que se desenrola a trama das irmãs Leonor (Letícia Persiles), Brites (Rita Batata) e Mécia (Camila Botelho), criadas como católicas, sob a proteção da rainha de Portugal, após a morte dos pais provocada pela Inquisição. No fim do século 16, a soberana envia as três para o Brasil colônia – mais especificamente à Bahia – para que se casem. “As órfãs da rainha eram uma categoria dentro da nossa historiografia. As primeiras mulheres que vieram para o nosso país – a maioria a contragosto – para se casar aqui e formar as primeiras famílias brasileiras. Existem alguns registros sobre a existência delas e, de certa maneira, isso está presente no filme”, explica a diretora.

No longa, as personagens tentam se adaptar à diversidade e à precariedade do Novo Mundo, ignorando a própria origem judaica. Quando um inquisidor chega ao Brasil espalhando terror e desconfiança entre os habitantes da colônia, cada uma reage de forma dife- rente. O elenco ainda traz César Ferrario, Teuda Bara, Inês Peixoto, Selma Egrei e Juliana Carneiro da Cunha.

PESQUISA 

Trabalhar com história e temática feminina não é novidade para Elza. Seu primeiro longa de ficção, Vinho de rosas (2005), que chegou a arrebatar alguns prêmios, como os de melhor figurino, melhor cenografia e melhor som direto no Festival de Maringá (PR), retrata a vida de Joaquina, jovem abandonada na infância e criada em um convento. Aos 18 anos, descobre ser filha de Tiradentes e ter a mãe ainda viva. “Eu já venho atuando nessa questão das mulheres na história, do protagonismo feminino, há algum tempo, e as órfãs da rainha estão nesse processo. Apesar de ser ficção, ajuda a compreender a história do Brasil”, frisa.

Há quase uma década, Elza Cataldo teve a ideia de desenvolver o projeto. Ao longo dos anos, foi levando adiante outros trabalhos, como curtas e médias-metragens, além de documentários. Só em 2017 é que a produção começou a realmente tomar forma. Justamente por se tratar de assunto não tão conhecido, a cineasta se aprofundou em estudos. Chegou a ler 305 livros. “O século 16, período em que se passa a trama, é algo muito remoto, distante. Um filme histórico exige muita pesquisa e dedicação. Além das publicações que li, cheguei a ir a Portugal e à Espanha”, revela. A cineasta escreveu o roteiro ao lado de Newton Cannito e Pilar Fazito e com a consultoria do historiador Ronaldo Vainfas, um dos principais especialistas no tema da Inquisição no Brasil.

Reforço ao polo cinematográfico

Uma vila cenográfica foi construída em Tocantins, na Zona da Mata mineira, terra natal da diretora. Além de pensar na projeção e desenvolvimento do município, a escolha foi motivada por outros fatores. “Tenho conhecimento profundo da região e isso facilita na hora de conseguir apoios, permutas. E por sua localização, ela passa a integrar essa importante iniciativa que é o Polo Audiovisual da Zona da Mata, que se tem sobressaído como um dos mais importantes núcleos de produção, gestão e formação audiovisual do Brasil”, ressalta.

O lugar onde se passa boa parte das ações do filme demorou quase um ano para ser concluído e tem direção de arte assinada por Moacyr Gramacho, diretor-geral do Teatro Castro Alves, em Salvador, e conhecido por seu trabalho como cenógrafo em espetáculos de teatro, dança e cinema. “Praticamente não temos edificações do século 16 por aqui. Não é fácil construir uma vila cenográfica daquela época. Exigiu muito planejamento e estudo. Esse, aliás, foi um dos nossos grandes desafios, assim como um dos nossos trunfos”, acredita Elza Cataldo.

Ela ainda destaca a beleza dos figurinos, a cargo das mineiras Sayonara Lopes, que trabalhou com a diretora em outras produções, e Rosângela Nascimento. A consultoria foi de Beth Filipecki, uma das mais conceituadas figurinistas do país e responsável por trabalhos como as novelas O cravo e a rosa (2000) e Lado a lado, as minisséries O tempo e o vento (1985) e O primo Basílio (1988), e filmes como Lavoura arcaica (2001).

A captação também foi outro empecilho, mas a produção conseguiu contar com recursos do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) e da Lei Estadual de Incentivo à Cultura através da Energisa, concessionária de energia que é da Zona da Mata.

INCERTEZAS 

Sobre as incertezas que rondam o cinema nacional, Elza Cataldo diz que nunca foi fácil trabalhar na área, mas segue confiante e se diz animada para 2020. Apesar de o presidente Jair Bolsonaro ter vetado no fim do ano projeto de lei que concede isenções de impostos para instalação e modernização de cinemas e também permite a empresas e pessoas físicas aplicar parte de seus tributos na produção de filmes brasileiros – ela celebra uma notícia positiva: em meados de dezembro, o Comitê Gestor do Fundo Setorial do Audiovisual (CGFSA) aprovou o Plano Anual de Investimento de 2019 (PAI). A decisão destrava o uso de R$ 703,7 milhões para o setor.

“Acredito que o cinema brasileiro tem força suficiente para continuar avançando. Tenho continuado trabalhando, dando visibilidade à nossa cultura, proporcionando geração de empregos”, salienta. Para a diretora, há também desconhecimento da opinião pública com relação aos mecanismos de fomento cultural, como a própria Lei Rouanet.“Tem muita desinformação e ainda estamos acompanhado com certa preocupação algumas decisões com relação às políticas de cultura. Mas tenho convicção de que vamos conseguir manter as inúmeras conquistas que construímos ao longo desses anos. Cinema sempre foi um trabalho árduo, mas ele continua vivo e é isso que importa”, enfatiza.


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