postado em 29/10/2019 04:00 / atualizado em 28/10/2019 21:44
Workaholic, o diretor e ator Jorge Fernando se destacou na televisão e no teatro (foto: Matheus Cabral/TV Globo)
Jorge Fernando imprimiu sua marca registrada – a alegria – nas telenovelas brasileiras. Mas foi também um criador revolucionário, que chacoalhou a faixa das sete da TV. “Ele começou como ator, enveredou para a direção e deu uma grande renovada nas novelas das oito, com Janete Clair – caso de Sétimo sentido. Porém, entrou para a história ao se tornar o rei do horário das 19h”, afirma o especialista Duh Secco, editor do site de entretenimento RD1.
Secco destaca as parcerias de Jorge com o diretor Guel Arraes e com o dramaturgo Sílvio de Abreu. “Ele nos deixou folhetins memoráveis e de sucesso, como Guerra dos sexos, Vereda tropical, Cambalacho, Brega & chique, Que rei sou eu? e Vamp.”
Jorge Fernando tinha 64 anos. Morreu no domingo (27), no Rio de Janeiro, de parada cardíaca. Estava internado no Hospital CopaStar, em Copacabana, devido a um aneurisma. O velório está marcado para esta terça-feira (29), no Teatro Leblon, e ficará aberto ao público das 8h às 10h. A cerimônia de cremação, no Cemitério do Caju, será reservada à família. Em 2016, ele havia comovido o país ao sofrer um acidente vascular cerebral (AVC). Recuperou-se. Sua última novela foi Verão 90, que terminou em julho.
Multiartista, dirigiu 17 novelas das sete – entre 34 folhetins, minisséries e seriados. Também deixou sua marca nos humorísticos da TV: comandou Sai de baixo, um dos sucessos da Globo, fórmula que mesclava teatro e televisão. Até hoje o bordão “Cala a boca, Magda!”, dirigido à personagem de Marisa Orth, está na boca do povo. Também fez cinema – dirigiu Xuxa gêmeas e A guerra dos Rocha, atuou em Alma corsária e Se eu fosse você.
A TV o projetou, mas Jorge também se destacou no teatro. Dirigiu a amiga Claudia Raia no musical Não fuja da Raia. Talento do besteirol, estreou como ator em 1976, na peça As mil e uma encarnações de Pompeu Loredo, de Mauro Rasi e Vicente Pereira. Tempos depois, brilhou em Boom, cantando e dançando inclusive. Já consagrado, “contou tudo” na autobiográfica Salve Jorge, em 2011, levando aos palcos histórias marcantes de sua trajetória artística.
BRINCALHÃO
O especialista Duh Secco diz que Jorge Fernando deixou legado precioso, que muitas vezes passa despercebido por causa de seu jeito extrovertido e brincalhão. “Todo mundo vai se recordar dele por sua alegria, sim. Mas ele foi um criador extremamente competente, inovador e revolucionário, importantíssimo para a nossa teledramaturgia”, reforça.
A morte do diretor e ator abalou amigos, parceiros e colegas. “Perdi meu norte”, afirmou Claudia Raia. “Fizemos lindas novelas juntos, como Chocolate com pimenta, Alma gêmea e Êta mundo bom. Todas grandes sucessos de público, porque ele era genial. Vai alegrar o céu, Jorginho, com seu humor, sua alegria!”, despediu-se o dramaturgo Walcyr Carrasco.
“Jorginho dirigiu todas as novelas geniais que eu queria fazer quando era adolescente. A testemunha de toda uma geração de humor, o mais alegre, ele e sua bunda de fora”, afirmou a atriz Ingrid Guimarães. “A televisão não será a mesma sem você”, lamentou Lilia Cabral nas redes sociais. “Acaba um pedaço inovador, criativo e espontâneo de uma geração de novelas e programas de que você foi o grande responsável por sua genialidade e irreverência”, completou a atriz.
COLÉGIO
Jorge Fernando de Medeiros Rebello nasceu em 29 de março de 1955, no Rio de Janeiro. Filho da atriz Hilda Rebello, teve as primeiras experiências no teatro no Colégio Estadual Visconde de Cairu, no Méier. O primeiro trabalho na TV foi como jovem galã da série Ciranda cirandinha (Globo), em 1979. Dois anos depois, estreou como diretor de novelas em Jogo da vida. (Com agências)
CINCO MOMENTOS
DE JORGE FERNANDO
(foto: Globo/divulgação)
. GUERRA DOS SEXOS
Guerra de comida de Fernanda Montenegro e Paulo Autran
(foto: Globo/reprodução)
. SAI DE BAIXO
Cala a boca, Magda!, o bordão que fez a fama de Marisa Orth e Miguel Falabella
(foto: Reinaldo Marques/divulgação)
. PARCERIA
Com Silvio de Abreu, Jorge criou clássicos da TV, como Que rei sou eu? e Guerra dos sexos
(foto: Instagram/reprodução
)
. BOOM
Talento para o besteirol, Jorge também fez história nos palcos brasileiros
(foto: Matheus Cabral/Globo)
. MACHO MAN
Como ator, contracenando no seriado da Globo com Marisa Orth
Gosto pela chanchada
Jorge Fernando entrou muito jovem no mundo do espetáculo, do showbiz. Logo aprendeu a dominar sua mecânica. Tornou-se cúmplice de atores e autores. E ele amava a comédia. Servindo ao texto de Silvio de Abreu, criou a memorável Guerra dos sexos, em que Fernanda Montenegro e Paulo Autran contracenavam em cenas de pastelão – os dois mitos da representação dramática do teatro brasileiro.
Anos depois, Jorge Fernando os dirigiu de novo, no remake, em 2012. Na década de 1990, alcançou sucessos memoráveis com as novelas Rainha da Sucata, em que Regina Duarte teve um de seus grandes papéis; Vamp, deliciosa paródia de vampirismo; e de novo Silvio de Abreu – Deus nos acuda e A próxima vítima. Os dois sempre tiveram no DNA o gosto pela chanchada e pelo teatro rebolado como expressões brasileiras.
Este mundo sempre foi um pandeiro para Jorge Fernando, como foi para Oscarito, Grande Otelo. O Brasil parou no último capítulo de A próxima vítima, à espera da revelação do assassino. Misturando teatro e TV, fez história nas noites de domingo com Sai de baixo. Voltou a ser ator no seriado Macho man.
No cinema, dirigiu Xuxa gêmeas, Sexo, amor e traição, com Malu Mader, Alessandra Negrini, Fábio Assunção e Murilo Benício. Foi ator em Se eu fosse você 2. E dirigiu também A guerra dos Rocha, remake brasileiro de um grande sucesso argentino, Esperando la carroza. O filme não foi nenhum blockbuster – pena, porque Ary Fontoura, travestido como matriarca, poderia ter recebido todos os prêmios do ano. Estava excepcional. (Estadão Conteúdo)