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Estado de Minas

'Gil', a nova coreografia do Grupo Corpo, tem samba e 'procissão'

Rodrigo Pederneiras conta como criou o espetáculo em sintonia com a trilha criada pelo cantor e compositor baiano. Temporada em BH vai desta terça (27) a domingo (1)


postado em 27/08/2019 04:00 / atualizado em 26/08/2019 21:26

Depois de estrear em São Paulo, Gil abre temporada hoje em BH, com sessões até domingo, no Palácio das Artes(foto: JOSÉ LUIZ PEDERNEIRAS/DIVULGAÇÃO)
Depois de estrear em São Paulo, Gil abre temporada hoje em BH, com sessões até domingo, no Palácio das Artes (foto: JOSÉ LUIZ PEDERNEIRAS/DIVULGAÇÃO)

Deslizado. Na falta de outra palavra, é dessa maneira que o coreógrafo Rodrigo Pederneiras, de 64 anos, define Gil, novo espetáculo do Grupo Corpo. Depois de temporada de estreia em São Paulo, a montagem, a de número 40 da companhia mineira, chega ao Palácio das Artes. A partir desta terça (27), serão seis apresentações – as três primeiras já têm ingressos esgotados. Gil é a coreografia inédita num programa que inclui Sete ou oito peças para um ballet (1994). A remontagem, no entanto, é uma novidade para a maioria dos bailarinos – apenas três dos atuais 18 integrantes em cena haviam dançado anteriormente a coreografia.

“A trilha é mais linear, não tem grandes picos nem para cima, nem para baixo. É quase um cantochão, no sentido do desenho. (Por causa disto) Criei um balé mais deslizado, todo chão, como se fosse passando uma procissão”, diz Pederneiras, a respeito dos 40 minutos de trilha criados por Gilberto Gil, de 77. O compositor, que até então só assistiu aos ensaios do espetáculo, estará em BH nesta semana e assistirá à sessão de quinta-feira (29), de acordo com sua assessoria de imprensa.

A exemplo de Nazareth (1993), Bach (1996) e Lecuona (2004), Gil, a coreografia, carrega o nome do compositor de sua respectiva trilha sonora. Mas, diferentemente das montagens anteriores, esta é a primeira composta pelo autor-homenageado especificamente para o Corpo. E já que estamos falando de duas trajetórias que se encontram em um momento de maturidade – o grupo foi criado há 44 anos; Gil tem mais de 50 de carreira  (52 desde o lançamento de Louvação, seu álbum de estreia) –, não há como não reconhecer em cena elementos comuns às respectivas carreiras artísticas.

Do Corpo, estão presentes os movimentos de quadril (a marca registrada do grupo), de pés (semelhante a um chutinho, falando bem grosso modo) e também os de cabeça, mais bruscos. “É a base de tudo, vem de quando começamos a imaginar o que poderia ser uma dança brasileira. Praticamente todas as nossas danças começam no quadril, que acaba no outro extremo (no caso, a cabeça)”, explica o coreógrafo.

PARAPAPA
 
De Gil, as referências também são claras. Dividida em quatro partes, a trilha original faz menção a canções como Aquele abraço, Tempo rei, Andar com fé, Sítio do picapau amarelo, Raça humana. São coisas bem sutis. “Não é necessariamente a melodia, mas pode ser só um riff. No Sítio, por exemplo, tem aquele 'parapapa' do início da música”, conta Bem Gil, de 34, o filho número seis dos oito do cantor e compositor baiano. Diretor musical de Gil, integrante de sua banda, foi ele quem produziu a trilha do Corpo.

Quando a trilha estava finalizada, “por um pedido do Paulo (Pederneiras, diretor artístico do Corpo) e do Rodrigo”, foram incluídas na base original as referências às canções. “Não houve uma predisposição para fazer o uso dessas músicas já conhecidas, mas elas acabaram entrando de maneira interessante, de forma bem experimental. Para o meu pai, o grande barato foi fazer uma trilha original. Se o pedido tivesse chegado com uma ideia de compilação, talvez ele não se animasse tanto”, diz Bem. No estúdio, Gil gravou com sua banda atual, a mesma do álbum Ok ok ok (2018).

Segundo Bem, o processo foi todo um desafio. Algo que Rodrigo também enfrentou. A linearidade da música não permitiu que o coreógrafo criasse, por exemplo, os famosos duos do Corpo. Os bailarinos agora fazem mais solos. “O que acabou sendo mais difícil”, admite Rodrigo Pederneiras. Até o número final, que geralmente é o ápice da coreografia, foi diferente. “A música vai 'descendo', 'morrendo'. Então foi uma situação muito nova para a gente. Mas, para mim, este final é um dos pontos altos da peça.”

A ausência do sempre aguardado pas de deux de Gil acabou dialogando com Sete ou oito peças para um ballet, a coreografia que abre o programa. A peça, com trilha de Philip Glass e Uakti, tampouco tem pas de deux. “Os dois espetáculos têm muita cor, são claros, luminosos. Agora, tudo foi um grande acaso. A escolha (de remontar a peça) veio muito antes, foi uma decisão do Paulo. Ele vai lá nos arquivos e vê há quanto tempo não se faz um espetáculo. Essas coisas acabaram dando certa coerência, mas isso foi um acaso, não foi porque a gente é muito bom ou coisa nenhuma”, diz Rodrigo. Em Gil, um painel contínuo em um tom forte de amarelo cobre a caixa cênica.

O coreógrafo se diz muito feliz pela escolha da montagem de abertura. “Quando Sete ou oito peças estreou, o comentário dos críticos era de um espetáculo frio, sem emoção. Segui a linha minimalista da música do Philip Glass. Hoje, as pessoas ficam loucas, sentem um tipo de emoção completamente diferente. É impressionante, mas, assistindo agora, vejo como o espetáculo não envelheceu. Acho, inclusive, que cresceu.”

Neste diálogo com o passado, Gil também busca suas pontes com o futuro. Entre as novidades da coreografia está o samba – “Desta vez eles sambam de verdade, de forma muito leve, suave” – e um movimento com os braços. Logo no início, os bailarinos batem com os braços no peito e nas costas. Essa foi a forma que o coreógrafo usou para saudar Xangô, o orixá de Gilberto Gil. Tais movimentos marcam toda a coreografia – são sempre os mesmos, mas nunca exatamente iguais.

A saudação acaba estabelecendo ainda uma ponte com Gira (2017), a montagem anterior do Corpo. Naquele momento, a companhia mergulhou na umbanda – agora se volta para o candomblé. O catártico balé, considerado um dos mais inventivos da história da companhia, deu lugar a uma peça mais suave, leve, solar. Para Rodrigo, não há como comparar. “Se entrar nesta de 'agora tenho que fazer melhor', estou ferrado. Fazer o que vier, o que deve ser feito.”

QUEBRA-CABEÇAS

Encontre as canções de Gilberto Gil na trilha da nova coreografia do Corpo

» Aquele abraço e Andar com fé
Álbuns Gilberto Gil (1969) e Um banda um (1982)
Logo no início do espetáculo, ouvimos Gil fazendo um vocalise todo 'quebrado' que remete à primeira parte da canção de 1969. No mesmo trecho, um arranjo de metais recupera a melodia de Andar com fé.

» Serafim
Álbum Parabolicamará (1992)
O último verso da canção traz a seguinte frase em iorubá: "Oba bi Olorum koozi" (como Deus, não há nenhum). Na trilha, Gil repete a frase várias vezes, em meio a uma base percussiva.

» A raça humana 
Álbum Raça humana (1984)
Na parte final da trilha, cada trecho tem o nome de uma forma geométrica. Em Triângulo, Gil repete “a raça humana é uma semana do trabalho de Deus”, verso que abre e fecha a canção original. Aqui, ele não canta, quase recita a frase.

» Tempo rei
Álbum Raça humana (1984)
Uma citação bastante discreta na parte final do espetáculo, no trecho que leva o nome de Retângulo. Um dos clássicos de Gil, o refrão, facilmente reconhecível, aparece rapidamente em um arranjo de sopros.

GRUPO CORPO
Espetáculos Gil e Sete ou oito peças para um ballet. De hoje (27) a sábado (30), às 20h30, e domingo (1º), às 19h, no Palácio das Artes – Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro, (31) 3236-7400. Ingressos: Plateias 1 e 2: R$ 130 e R$ 65 (meia) e plateia superior: R$ 100 e R$ 50 (meia). Ingressos disponíveis para apresentações de sexta a domingo (demais sessões esgotadas). Vendas na bilheteria ou no www.ingressorapido.com.br (com taxa de conveniência).

 


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