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Ativismo em sol maior

No lançamento de Ladrão, o rapper belo-horizontino Djonga transforma o espetáculo numa celebração de resistência ao racismo e à exclusão social, expondo um Brasil em chamas


postado em 23/04/2019 05:50

Com letras contundentes, Djonga fez do show em BH um ato político, colocou ingressos a preço popular e exaltou a negritude: 'Nunca se esqueçam de onde vieram'(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A.Press)
Com letras contundentes, Djonga fez do show em BH um ato político, colocou ingressos a preço popular e exaltou a negritude: 'Nunca se esqueçam de onde vieram' (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A.Press)

 

Foi apoteótico – sem exagero. O rapper belo-horizontino Djonga, de 24 anos, fez no domingo um show impressionante no KM de Vantagens Hall para marcar o lançamento de seu terceiro disco, Ladrão. Fenômeno do hip-hop nacional e com 10 faixas inéditas, o álbum chegou às redes em 13 março e já bateu 40 milhões de visualizações no YouTube e Spotify, entre outras plataformas. Em 22 de março, os ingressos para a apresentação já tinham se esgotado em apenas seis horas.

Conhecido por letras contundentes contra o racismo, a exclusão social e a desigualdade – marcas registradas da sociedade brasileira –, Djonga deixou claro que seu show seria, antes de tudo, um ato político. Lembrou que, muito jovem, garoto negro, era obrigado a deparar com “madames escondendo bolsas” e tios “subindo vidros do carro” quando ele circulava pela Savassi, na Região Centro-Sul de BH, onde fica o KM de Vantagens Hall. Fez questão de cobrar R$ 10 pela entrada de seu show. “Tô no palco da área deles. Eles têm que entender que os filhos deles me amam. Sou ladrão mesmo, mas outro tipo de ladrão”, afirmou, ovacionado pelo público, referindo-se à faixa-título de seu novo álbum. Em entrevistas, ele cita sempre a metáfora de Robin Hood, que tira dos ricos para devolver aos pobres e pretos, “que construíram o Brasil”.

“Meto a mão no seu bolso, playboy e patricinha, mas para devolver para quem construiu essa porra aqui. Quem construiu este lugar (KM de Vantagens)? O cara lá do Mangabeiras, o rico? Não, foi o humilde trabalhador, a humilde trabalhadora, que vieram lá de longe do Brasil”, afirmou. “O ingresso custou R$ 10. Muitas pessoas morreriam sem pisar aqui dentro se não fosse isso”, disse o rapper, lembrando que todos os jovens ali “estão na correria” como ele, lutando para sobreviver. “(Chegamos aqui) sem precisar de revólver, sem ir pra boca (de fumo), sem roubar os outros”, afirmou, mais uma vez ovacionado pelos fãs.

Na tarde do domingo, 21 de abril, o KM de Vantagens Hall, com capacidade para 5,5 mil pessoas, foi palco tanto de Djonga quanto de jovens negros com penteados afro, garotas de cabelos crespos. A música do rapper tanto celebra o orgulho e as vitórias dessa juventude quanto denuncia a violência contra os cidadãos da periferia e favelas no país. O show começou com um samba,a capella: “Respeite quem pôde chegar/onde a gente chegou”. Depois veio Hat-trick: “Abram alas pro rei/abram alas pro rei/me considero assim/pois só ando entre reis e rainhas”, hino do empoderamento dos jovens negros.

Djonga recebeu vários convidados que participaram de seu disco: Felipe Ret, Sidoka, MC Kaio, Chris, Doug Now e Coyote Beatz, que levantaram o público. Um dos momentos mais bonitos foi quando ele levou para o palco o pai, Ronaldo Marques, a avó, Maria Eni, e o filho, Jorge, de 2 anos, logo depois de cantar Bença, faixa de Ladrão dedicada à família e à luta da avó para criar as filhas. Dona Maria Eni estava de terço na mão. A linda faixa, aliás, é encerrada com uma bênção dela para o neto e os ouvintes. O público veio abaixo neste “momento família”. Rosângela, a mãe de Djonga, veio abraçada ao rapper em outro momento, quando ele cantou A música da mãe, cujo clipe viralizou na internet – lançado em agosto, são 15,4 milhões de views até agora.

O público cantou absolutamente todos os raps do set list. As “pedradas” – Hat trick, Ladrão, Atípico, Ufa e Esquimó, entre várias outras dos discos Heresia (2017), O menino que queria ser Deus (2018) e Ladrão (2019) – se juntaram às românticas – Tipo, Solto e a recente Leal, essa última dedicada por Djonga ao amor de sua vida, a estudante de cinema Malu Tamietti. Detalhe: com um “casa comigo” ao vivo e em cores.

SENSACIONAL O momento mais impressionante do show foi a parceria de Djonga com os fãs em Olho de tigre, o mega-hit do rapper mineiro cujo refrão, “Sensação/ Sensacional/ Sensação/ Sensacional/Firma/Firma/Fogo nos racista (sic)” se tornou marca registrada do rapper mineiro. O KM de Vantagens Hall tremeu (de verdade), enquanto o público cantava e pulava junto com Djonga. Ele pediu e a plateia atendeu, abrindo impressionante roda de bate-cabeça, de fora a fora da quadra. A máscara que remete à Ku Klux Klan foi pisoteada pela multidão. Esse foi apenas um dos vários momentos em que o público acompanhou o rapper: pôs as mãos para o alto, fez o “gesto pantera negra”, pulou e rimou muito. O presidente Jair Bolsonaro foi xingado a valer. “Vamos mudar o mundo, baby”, convocou Djonga ao cantar a Falcão, que fecha seu novo álbum.

O rapper mineiro trouxe um convidado pra lá de especial ao show em sua cidade natal: Yuri Marçal, humorista negro que vem chamando a atenção do país com o stand up Coisa de preto. As boas piadas do jovem carioca têm o racismo como alvo.

Visivelmente emocionado, Djonga fez um show histórico na “área dos boy”, comprovando, mais uma vez, a força do rap mineiro – nunca é demais lembrar que o Duelo de MCs, referência do hip-hop nacional, chega agora à 11ª edição.

Mais uma vez ovacionado, Djonga convocou aquela multidão de jovens a ter orgulho de suas raízes, de sua origem e de sua cor. “Nunca se esqueçam de onde vieram. Daqui a pouco, você pode morar no Mangabeiras, no Leblon. Se foi difícil chegar, não importa. Lembre-se de onde tudo começou, sempre. Árvore sem raiz não dá fruto”, afirmou Djonga. Suas últimas palavras no domingo de Inconfidência Mineira vieram do rap Esquimó. A letra diz assim: “Sujeito homem fala/Não manda recado/Lei do cuidado, onde conversa fiado/Onde tem quem acha graça zoar viado/Eu acho engraçado um racista baleado/Eu sou macumba/o rival amaldiçoado/Largando linhas/Pra nem morto ser calado/Largando linhas/Pra nem morto ser calado.”


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