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Estado de Minas DIREITO E SAÚDE

Os limites éticos do marketing médico

Existe uma grande diferença entre marketing, publicidade e propaganda; profissionais da saúde precisam se atentar a isso, tendo sempre a ética em primeiro lugar


20/12/2021 06:00 - atualizado 17/12/2021 19:49

Na foto, um notebook, um estetoscópio e um papel com gráficos
(foto: Banco de imagens/Shutterstock)
Os assuntos relacionados à área da saúde, e sobretudo à medicina, estão cada vez mais presentes na mídia. Tanto pelo grande interesse de todos por manterem relação com momentos-chave da existência humana (vida e morte), quanto pelo grande avanço da tecnologia, nos trazendo um mundo cada vez mais conectado em todos os assuntos. 

Contudo, chama a atenção a atual exposição exagerada da classe médica na mídia, de forma voluntária. Em uma sociedade altamente consumerista, a mercantilização da medicina tornou-se uma mazela quase inevitável. A autopromoção de muitos profissionais, sobretudo pelos meios errados e com estratégias questionáveis, vai de encontro a uma imprensa cada vez mais sensacionalista que dá preferência às péssimas notícias, que são, cada vez mais, garantia de uma boa audiência. 

Neste contexto, esbarramos no grande dilema do marketing médico: se por um lado há a necessidade de informar aos pacientes e à sociedade sobre os avanços científicos e tecnológicos na saúde e o direito legítimo dos profissionais de divulgarem sua habilitação e capacitação, temos por outro lado os limites éticos aos quais os médicos estão sujeitos.   

Em síntese, podemos definir o marketing médico como sendo um conjunto de estratégias e ações de comunicação que tem como finalidade difundir conhecimento, seguindo a legislação e os padrões éticos impostos pelo CFM (Conselho Federal de Medicina). Seu objetivo não é o de “vender mais” por meio do maior alcance de pacientes, mas sim ajudar o maior número de pessoas possível. 

Já a propaganda é a repetição de uma mensagem de maneira ostensiva para gerar o convencimento do público-alvo. A publicidade é um conjunto de ações que buscam a visibilidade de um produto ou marca, diante do público consumidor, gerando visibilidade à empresa. Como se nota, são conceitos que não se confundem. 

Obviamente, um bom marketing médico pode criar uma relação mais próxima com o paciente, gerando mais confiança no trabalho do profissional. Pode ainda gerar posicionamento de autoridade como referência na área de atuação do médico, e como consequência, atrair novos pacientes. E o mais importante: não só novos, mas bons pacientes, conscientes e instruídos pelo rico conteúdo compartilhado pelo profissional.

Ao passo que as estratégias de publicidade e propaganda, tão adotadas atualmente por muitos médicos, atraem “clientes” e não pacientes, em busca de soluções tão imediatas e indolores quanto os anúncios que os atraíram, gerando um altíssimo índice de insatisfações e conflitos.  

O próprio CFM e a Codame (Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos) editaram a Resolução CFM 1974/11, que há 10 anos regula o assunto, prevendo que a conduta do profissional deve se guiar pela função de divulgação e promoção de conhecimento científico e de educação da sociedade. Mas, como o avanço social e tecnológico é constante, o CFM editou, anos depois, a resolução CFM 2.126/15, que trata da ética médica nas redes sociais e na internet.

A resolução (que se aplica a sites, blogs, Facebook, Instagram, Twitter e WhatsApp) é cirúrgica em vedar “selfies” e conteúdos que induzam a autopromoção, ao proibir os famosos “antes e depois” e ao vedar o sensacionalismo e a concorrência desleal. 

É importante ressaltar que os tribunais já firmaram o entendimento (acertado, diga-se de passagem) de que o material de marketing integra a documentação médica e vincula o prestador de serviços, podendo ser entendido como uma promessa de resultado.

Portanto, o uso desenfreado de estratégias de publicidade visando tão somente a atração de pacientes pode ser muito perigosa para o médico. E em muitos casos chega a desvalorizar o profissional no mercado, gerando efeito contrário ao pretendido, dado o mal gosto do material gerado. 

Nunca é demais lembrar que práticas como o famoso “antes e depois”, o uso de representações visuais de maneira abusiva e assustadora, e a divulgação de promoções e preços são expressamente vedadas. E a ostentação constante de fotos com bons resultados pode ser entendida como a promessa deles, por gerar essa expectativa no paciente. Fotos só podem ser utilizadas com anuência do paciente, e em eventos de caráter científico.  

O mal-uso das redes sociais pode até passar, a curto prazo, a impressão de crescimento da reputação e retorno financeiro imediato. Mas, a médio e longo prazo, os efeitos do mal-uso podem ser devastadores, e até encerrar a carreira do profissional prematuramente.  

Por outro lado, a atuação em redes sociais com caráter informativo, inclusive tirando dúvidas de pacientes e divulgando novos tratamentos e tecnologias, é muito positiva em todos os sentidos. Caso o profissional da saúde, sobretudo o médico, deseje fazer uso do marketing de forma positiva e nos termos da legislação, é indispensável que sua atuação seja acompanhada por um profissional que domine o assunto, garantindo assim a ética e legalidade no uso das estratégias. 

Em suma, antes de visar o lucro, os médicos devem prezar pela ética. O marketing médico deve ser orientado a uma comunicação com informações relevantes e verídicas, que sejam de interesse público, sem cunho comercial e com o devido acompanhamento jurídico. Daí em diante, o estabelecimento do profissional como referência e a atração de novos (e bons) pacientes se tornam uma consequência inevitável. 

*Renato Assis é advogado, especialista em Direito Médico e Odontológico há 15 anos, e conselheiro jurídico e científico da ANADEM. É fundador e CEO do escritório que leva seu nome, sediado em Belo Horizonte/MG e atuante em todo o país.  (renato@renatoassis.com.br)

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