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Estado de Minas COLUNA

Alta dos juros é remédio amargo para o consumo e a dívida pública

Não há segurança de que elevação das taxas terá efeito relevante sobre a inflação, e elas causam estrago no endividamento do setor público


08/02/2022 04:00 - atualizado 08/02/2022 07:58

Sede do Banco Central, em Brasília
Comitê do Banco Central calibra nos juros, instrumento tradicional, para controlar inflação em escala mundial (foto: Marcello Casal/JrAgência Brasil - 14/5/20)
Retomo os temas da última coluna, que intitulei de tríade da desgovernança macroeconômica, começando pelo primeiro problema, a obsessão dogmática pela redução da razão entre a dívida pública e o PIB, e seu principal instrumento dos últimos tempos, o agonizante “teto de gastos”.
 
O drama, aqui, é duplo. Primeiro, descobriu-se nos meios acadêmicos mais sofisticados dos Estados Unidos que lidam com macroeconomia, uma verdade simples. A razão entre a dívida e o PIB é alta, principalmente, porque é uma fração que tem um estoque no numerador (dívida), que resulta da soma de todos os déficits acumulados ao longo de toda a história do país em causa, e um fluxo de um único ano no denominador que é o PIB mais recente.

Cálculos feitos há pouco mostraram que se trabalhássemos com o conceito de VPR (valor presente redescontado) dos PIBs futuros, um estoque, uma razão dívida-PIB de 90% (com um estoque sobre outro) seria recalculada em 1,8%. Ou seja, não poderia ser chamada de desastrosa...
 
Sem levar esse ponto em conta, e para combater a alta dívida, a burocracia fazendária sugeriu às autoridades que estabelecessem um limite ao crescimento dos gastos federais igual à inflação decorrida, limitação essa que acabou sendo objeto de uma emenda constitucional, algo que, pela alta rigidez da maior parte dos gastos, só poderia ser implementado por uma das duas vias (ou ambas) que se seguem: aumento da carga tributária e/ou corte de investimento.
 
Quem cogitar de aumento de impostos para fechar as contas será no mínimo apedrejado...Quanto ao corte de investimentos, está ficando cada vez mais óbvio que essa rota é mero sinônimo de jogar por terra qualquer chance de fazer com que a economia brasileira cresça minimamente. Concluo tratando da decisão sobre a fixação da taxa Selic, a cargo do Banco Central, que acaba de sair. A partir de 2%, no início de 2021, a Selic havia subido para 9,25% a.a., e agora chega a 10,75% a.a., um senhor aumento.
 
Existe, aparentemente, uma pressão inflacionária relevante em escala mundial, combinando tanto gargalos de oferta ligados ao arrefecimento da primeira fase da pandemia (que, nada obstante, podem ser vistos como temporários), como pressões mais duradouras do lado da demanda agregada. O que se duvida é se, sobre essas condições, haverá mesmo justificativa teórica suficiente para acreditar que subir juros – mesmo na magnitude acima indicada – restringirá a demanda e depois domará a inflação.
 
Na falta de uma melhor especificação dos canais de transmissão desse processo do que a que existe hoje, alguns colegas que se dedicam ao assunto, como André Lara Resende, acham que não dá para responder afirmativamente a isso a priori (https://www.youtube.com/watchv?=IfB7W_JXoPw&t=5149s). A reação do investimento privado (e depois a da inflação por suposto excesso de demanda) à subida dos juros tende a ser vista como fraca, e que aquela dependeria muito mais das expectativas empresariais do que dos juros em si. Da mesma forma, alguns detectam que é também baixo o impacto contracionista da subida dos juros sobre a demanda de consumo.
 
Nesses termos, sob a atual política, o Banco Central parece atirar com todas as balas na direção de um alvo móvel difícil de atingir, sujeitando-nos a efeitos complicados que decorrem das crescentes taxas de juros que vêm sendo praticadas, criando inclusive a sensação de que a situação é até pior do que se imaginava (ou seja, adicionando expectativas ainda mais desfavoráveis do que anteriormente), pois como explicar as fortes subidas da Selic que vêm sendo praticadas?
 
Para piorar, deve-se falar particularmente na elevação dos elevados e inevitáveis custos que incidem sobre o serviço da dívida pública, que, ao fim e ao cabo, é de responsabilidade integral dos contribuintes. Supondo, então, um estoque da dívida pública federal medido em 80% do PIB, ao se aplicar uma Selic 10 pontos percentuais acima da que vigorava no início de 2021, chegar-se-á a um custo adicional de 8% do PIB a ser transferido para os seus detentores, algo que representa mais de três vezes a taxa de investimento público que vem sendo executada nos últimos anos, onde persistem carências gigantescas. E isso seria feito sem qualquer submissão do assunto aos poderes eleitos estabelecidos, onde, em contraste, um gasto com um novo programa de socorro aos afetados pela pandemia teve de ser aprovado no Congresso por meio de uma emenda constitucional.
 
No fundo, meu ponto é simples: se não há segurança, teoricamente, que subir os juros (decisão que é tomada por apenas um pequeno grupo de servidores) faz um efeito relevante sobre a inflação, e, ao mesmo tempo, causa um estrago enorme na dívida pública (valor adicional esse que poderia ter um efeito muito importante sobre a capacidade de produção e de crescimento do emprego se estivesse associado a outro tipo de gasto público — investimento em infraestrutura), pensaria duas vezes antes de tomar aquela decisão. É claro que para os que se sentam na cadeira do combate à inflação a pressão por solução é muito forte, e algo terá de ser feito. Mas devagar com o andor, que o santo é de barro...

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