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Estado de Minas COLUNA

Hora do pânico nas estatísticas e nas sondagens

O atraso no Censo é mortal para as sondagens de opinião, como as pesquisas pré-eleitorais


08/10/2022 04:00 - atualizado 08/10/2022 07:23

Descrição: Funcionário do IBGE durante teste para o Censo 2022
Funcionário do IBGE durante teste para o Censo: atraso no levantamento deixa o país às escuras quanto a situação da população (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press - 4/11/21)

Paulo Rabello de Castro

Numa organização, nenhum problema deve ser resolvido antes de ser medido. Quanto maior a organização – suponha um país – mais necessária será a medida estatística para orientar a ação do governante. As medidas da realidade social são feitas com conhecimento científico. É a ciência estatística, estudada nas faculdades. É um conhecimento especializado, que foge à compreensão de leigos no assunto, incluindo governantes e comunicadores. Esse é o problema maior enfrentado nas estatísticas nacionais. Ignorância e negacionismo em doses cavalares. Para o político não educado, os tais levantamentos estatísticos não servem para grande coisa, senão quando ressaltam feitos e milagres da turma no poder.
 
Nessa toada de desinteresse total pelos levantamentos da realidade social do país é que temos vivido nos últimos anos. A ignorância estatística está em todo espectro da representação política dos partidos. Vivemos isso de perto no esforço de recuperar o calendário, atrasado em cinco anos, do Censo Agro, que, finalmente, saiu em 2017, apenas por sensibilidade de alguns congressistas que lhe fizeram emendas de apoio, bem como do suporte orçamentário do finado Ministério do Planejamento. Quem imaginaria um país como o nosso, com sua poderosa realidade agroambiental, não ter um levantamento atualizado nessa área... Mas, para muitos governantes no Brasil, levantar estatísticas é apenas uma chatice desnecessária, já que eles mesmos nada decidirão em função de dados, mas só de conchavos.
 
Situação semelhante ocorre com o atraso catastrófico do Censo Populacional, que se realizaria nos anos de final zero – 2000, 2010, 2020 – seguido de outra contagem demográfica mais simples nos anos de final cinco. Sem tal parâmetro, não há como saber ao certo quantos habitam cada estado, cidade e bairro. Que renda possuem. Quantos compõem as famílias. Que religião praticam. Em que condições está a habitação e a quem pertence. É um vasto e necessário levantamento universal da população, desde sua contagem numérica, cabeça a cabeça, até a radiografia da situação socioeconômica de cada região e local.
 
Atrasar tal levantamento seria impensável. Mas, no Brasil, isso aconteceu em 2020 por insensibilidade dos governantes quanto ao cálculo do impacto negativo desse atraso. Prevaleceu a tese dos riscos da COVID-19, certamente não desprezíveis, mas que foram enfrentados em outros países igualmente preocupados com a possibilidade de contágio, como EUA, China e Portugal, para citar apenas três deles que, mesmo com risco COVID, realizaram o levantamento censitário cercado de cuidados especiais.
 
O atraso no Censo é mortal para as sondagens de opinião, como as pesquisas pré-eleitorais. Os encarregados de “vender” tais levantamentos aos bancos e jornais dependem da atualização do retrato estatístico nacional realizado pelo IBGE. Assim montam as “amostras” das suas investigações de opinião, que são como mínimos pedaços da “pele” da população, numa espécie de biópsia do corpo inteiro. Porém, se o conhecimento do corpo completo está defasado, não há como medir com sucesso os tais “intervalos de confiança” desses pedacinhos diminutos que compõem uma sondagem.
 
Foi o que ocorreu nas pesquisas pré-eleitorais, desenhadas para não ser dispendiosas, com entrevistas de apenas 2.000 a 5.000 respondentes, em geral por telefone. Ora, o Brasil tem 5.570 municípios, com populações as mais diversas. Certas sondagens não cobrem sequer uma só resposta individual a cada dois municípios! As pesquisas eleitorais são, no dizer de respeitável ex-presidente do IBGE, não mais do que “retratinhos 3x4 da realidade pesquisada”. Comparem-se esses magros levantamentos eleitorais com as quase 70 mil entrevistas mensais realizadas incansavelmente pelo IBGE para medir os dados de emprego da PNAD.
 
Os meios de comunicação, que têm a curiosidade como promessa profissional, deveriam ser muito mais atentos em inquirir da qualidade e confiabilidade efetivas desses levantamentos, que mais estragos do que informações trazem à população, já bombardeada por notícias distorcidas. Qual a diferença desses levantamentos em relação às fake news? Para alguns, seria apenas uma questão de grau de desinformação. As sondagens pré-eleitorais não vão deixar de existir. Então, resta relatar direito o que elas significam e parar de chutar “margens de erro” com base em curvas estatísticas de fato desconhecidas.
 
E tal ignorância tem nome e sobrenome. Ela nasce da caneta vazia de políticos que votam bilhões em emendas secretas, mas são incapazes de liberar recursos adequados para se fazer um Censo Brasil como o IBGE sabe fazer – e, reconhecidamente, dos mais baratos do mundo, não chegando a 10% do gasto americano. A hora do pânico com os recentes erros de pesquisas eleitorais está entrelaçada à péssima gestão política das estatísticas brasileiras, motivo de orgulho no passado, e convertidas, hoje, a material de duvidosa confiança. E, nesse pânico, não há inocentes a ressalvar.

*Paulo Rabello presidiu o IBGE entre julho de 2016 e maio de 2017

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