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Estado de Minas Comportamento

Vá com Deus, Campeão!

'Ele cumpriu magistralmente sua missão de pai%u2019


28/02/2021 04:00

As que se seguem podem ser consideradas as palavras mais duras de ser arrancadas de mim para formar um texto desde que comecei a escrever, há pouco mais de 30 anos. Meu pai partiu esta semana, vítima de infarto, três meses antes de completar 94 anos. Digo partiu porque ele sempre falava que era de outro planeta, no qual a idade era infinita, pois todos tinham uma missão muito longa. E certamente a dele foi. Dono de uma vitalidade invejável, amava a prática de esportes. Aconselhava a todos com os quais cruzava ao menos uma caminhada sempre que possível. Era a receita dele para se desenvolver a autoestima, ter saúde física e mental.
 
Quando jovem, remava na Pampulha. Ao longo da vida adulta, como trabalhava dia e noite, nos fins de semana nadava quilômetros na piscina olímpica do Minas Tênis Clube. Foi lá que nos ensinou a nadar. Estendia seus longos braços e dizia: "Pode vir, estou aqui para te segurar", e a cada braçada nossa dava um passo para trás. E íamos, eu, minha irmã e meu irmão, porque sabíamos que ele estava lá para o que desse e viesse.
 
Assim foi a vida toda. Até outro dia, já debilitado fisicamente pela idade, diariamente quando nos despedíamos ele dizia: "Não vou sair não. Se precisar de qualquer coisa, me liga". 
 
Durante os últimos 30 anos, foi uma pessoa fácil de ser vista nos pontos de concentração de corredores de rua de BH. Correu dezenas de maratonas pelo Brasil e pelo mundo,  sendo seu maior feito o bicampeonato na Maratona de Berlim, categoria acima de 80 anos. Gabava-se de ter chegado à frente de quase 9 mil corredores em uma delas, a massiva maioria bem mais nova que ele, e de ser até hoje o brasileiro melhor colocado nessa competição. 
 
A receita, dizia ele, era acreditar e gostar de si mesmo. Nunca teve uma lesão devido à prática de esportes. Isso porque superava os limites, porém sem que para isso colocasse seu corpo acima de suas reais condições e necessidades. 
 
Serviu e ainda serve de exemplo para muita gente que viu concretizadas nele capacidade e coragem de buscar aquilo que se deseja atingir. Fez várias maratonas internacionais – Nova York,  Buenos Aires e Berlim, rodou vários países da Europa sozinho, depois dos 80 anos, falando apenas uma palavra em inglês: "I". E assim ele se virava, procurando quem compreendesse o português e anotando num caderninho cada rua por onde passava para saber voltar. Se se perdeu algum dia? Não sei. Fato é que sempre retornava planejando uma nova viagem. 
 
Filhos e netos aprenderam com ele a manusear muitas ferramentas, pois ele amava passar horas na oficina que tinha no fundo de casa  fazendo e consertando de tudo. Era dotado de uma habilidade manual invejável, sendo que o que entrava estragado na oficina saía funcionando, mesmo que para tanto fosse preciso construir peças no torno depois de horas de estudo e testes.
 
 Já sinto saudades de meu pai, de tudo o que ele tinha de bom e de suas falhas, de todas as alegrias que ele me causou, assim como dos nãos tão bem dados. Afinal, ele cumpriu magistralmente sua missão de pai, talvez a maior delas entre os habitantes do planeta do qual dizia ter vindo e para o qual acaba de retornar para prosseguir em sua idade infinita.

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