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Estado de Minas PADRE ALEXANDRE

Palavras ao céu

Neste mês em que se celebra o rosário, contamos a história de como as delicadas contas chegaram até nós, curtindo os minutos como se fossem milênios


10/10/2021 04:00 - atualizado 10/10/2021 10:42

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Na antiguidade mais antiga que se possa imaginar, a oração contínua condensou-se numa fórmula breve, como o salmo 70 (“Vinde depressa em meu socorro”). A repetição acabou levando à oração numérica e daí à indagação: quantas fórmulas e em referência a quê se rezaria repetindo palavras?. Resposta: em referência ao “Saltério”, o livro dos 150 salmos utilizado nos mosteiros e conventos para o Ofício Divino. Na época medieval, talvez no tempo das cruzadas à Terra Santa, os anacoretas orientais usavam pedrinhas para contar o número das orações vocais. Nos eventos, os irmãos leigos, dispensados da recitação do “Saltério” pela pouca familiaridade com o latim, completavam as suas práticas de piedade com a recitação dos pai-nossos e para a contagem usavam a adoção de vários grãos enfiados num barbante.

Ainda em outra época, surgiu o costume dos romanos e gregos de coroarem com rosas as estátuas que representavam os seus deuses, como símbolo da oferta dos seus corações. Seguindo esse costume, as mulheres cristãs que marchavam ao Coliseu Romano para ser martirizadas vestiam suas mais belas roupas e adornavam a cabeça com coroas de rosas, como símbolo da entrega dos seus corações para ir ao encontro de Deus. As rosas eram recolhidas à noite pelos cristãos, que rezavam uma oração ou um salmo pelo eterno descanso dos mártires.
 
Se nasceu da dor, a partir daí só espalhou o amor. Nem todos davam conta de recitar os salmos porque saber ler era reservado aos cultos e letrados. Mas a humanidade caminha a passos largos, e cresce, e no século 9 surge o povo simples, que também queria rezar, mas, sem acesso ao “Saltério”, não conseguia orar como os monges. “Quem não pode recitar os salmos deve recitar alguns Pater” – disseram as autoridades religiosas no seu latim da época. “E também umas Ave.” É quase impossível voltar a percorrer com precisão os passos que levaram à atual estrutura do rosário, mas de fórmula em fórmula, de salmo em salmo, ou de conta em conta, chega-se ao terço.

Anos depois, enquanto contamos esta história do capítulo deste domingo falando das delicadezas das contas que nos fazem rezar, entramos em uma guerra de terra e mar. Estamos no Mar de Lepanto. Uma imensa batalha entre católicos e turcos se desenrola dura 10 horas. Se os católicos perdes- sem, a cristandade seria submergida pelos turbantes de Maomé e a religião católica teria desaparecido para sempre. A léguas de distância, em Roma, São Pio V implora o auxílio divino, pedindo ao povo romano que reze o rosário pela vitória de seus irmãos.

Enquanto despachava assuntos urgentes, mas com a atenção colocada no perigo que corria a cristandade, aquele venerável ancião interrompe os trabalhos bruscamente e se dirige à janela. Os circunstantes ficam perplexos, não compreendem a atitude. Reina o silêncio por breve espaço de tempo, rompido pela afirmação ainda mais misteriosa do pontífice: “Vencemos em Lepanto”.

Manda reunir os fiéis e preparar a comemoração pela milagrosa vitória de dom João D’Áustria, comandante da frota. Uma solene procissão tem lugar nas ruas de Roma. Dias mais tarde, chegam os emissários da esquadra trazendo a notícia já antes anunciada pelos anjos. Foi a batalha travada entre a frota cristã, a chamada Liga Santa, e as naus dos turcos islâmicos nas águas do golfo de Lepanto, na Grécia. Sem a vitória de Lepanto, o que teria sido do mundo? Toda uma fé e uma cultura, que já se estendiam pela recém-descoberta América, poderiam ter sido aniquiladas. Lepanto foi um dos acontecimentos mais decisivos da história do Ocidente, num dos mais ferozes confrontos bélicos da história.

Começamos esta história falando de palavras repetidas, de grãos enfiados em barbantes, de flores na cabeça para enfeitar as mártires do Coliseu, rezar sem saber ler, chegar aos navios trocando espadas, mosquetes e canhões enquanto se rezava na Cidade Eterna. Neste mês em que se celebra o rosário, contamos a história de como as delicadas contas chegaram até nós, curtindo os minutos como se fossem milê- nios, descobrindo pérolas nos corações uns dos outros. Hoje, passarão nuvens e estações do ano, usos e costumes, tradições, palavras e imagens. Só as mãos postas não passarão.

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