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Estado de Minas ENTRE LINHAS

O rito de bicentenário no 7 de setembro e o radicalismo de Bolsonaro

Não há um projeto de nação integrado ao mundo pós-moderno, capaz de construir um novo consenso nacional


07/08/2022 04:00 - atualizado 07/08/2022 08:51

Jair Bolsonaro aposta na balbúrdia política no dia 7 de setembro
Jair Bolsonaro aposta na balbúrdia política no dia 7 de setembro (foto: EVARISTO SÁ/AFP)

O prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), manteve a parada militar de 7 de setembro na Avenida Presidente Vargas, como acontece tradicionalmente, por solicitação dos próprios militares. Na capital fluminense se concentram as principais unidades das nossas Forças Armadas – Vila Militar, Baía de Guanabara e Base Aérea de Santa Cruz. O presidente Jair Bolsonaro havia anunciado que o desfile seria na praia de Copacabana, onde tradicionalmente se reúnem seus apoiadores. O desfile militar sempre começa na Candelária e termina em frente ao quartel general do Exército, no Campo de Santana, onde foi proclamada a República. A polêmica mexe com símbolos e pode se transformar num rito de passagem das eleições de outubro deste ano.

A Avenida Atlântica é um símbolo do movimento tenentista, ou seja, das revoltas da jovem oficialidade contra se us comandantes, porque a primeira delas ocorreu em 5 de julho de 1922, no Forte de Copacabana, conhecida como Revolta dos Dezoito do Forte, em protesto contra eleição de Arthur Bernardes, em março daquele ano. No dia 4 de julho de 1922, o capitão Euclides Hermes da Fonseca — filho do Marechal Hermes da Fonseca, que estava preso --, e o tenente Siqueira Campos preparavam o forte para revolta que se iniciaria pela manhã do dia seguinte. Segundo seus planos iniciais, alguns estados brasileiros e áreas militares do Rio de Janeiro participariam do levante, mas o governo federal já sabia da organização militar e a impediu.

No dia 5 de julho, o Forte de Copacabana foi bombardeado fortemente a mando do governo. Euclides Hermes da Fonseca e Siqueira Campos receberam um telefonema do ministro da Guerra, solicitando a rendição dos militares. Dos 301 militares que estavam no forte, renderam-se 272. O capitão Euclides Hermes saiu do forte para negociar com o ministro da Guerra e acabou sendo preso. Os que permaneceram no forte, sob o comando do tenente Siqueira Campos, não bombardearam a cidade como anunciaram, mas saíram em marcha pela Avenida Atlântica.

No caminho, alguns militares abandonaram a revolta, restaram apenas 18 militares. No fim da marcha, os tenentes Siqueira Campos e Eduardo Gomes ficaram feridos, além de dois soldados: os demais morreram em combate. Foi a primeira de uma sucessão de revoltas que desaguaram na Revolução de 1930. A marcha pela Avenida Atlântica foi um rito de passagem na história política e militar do país.

Falta coesão social


Os ritos de passagem foram estudados pelo antropólogo franco holandês Arnold van Gennep (1873-1957), que classificou grande variedade de rituais em três categorias, no livro do mesmo nome, publicado em 1909, a partir de padrões cerimoniais recorrentes: “ritos de separação”, “ritos de margem” e “ritos de agregação”. Todos os ritos de passagem contêm as três fases, porém, cada qual enfatiza um dos aspectos. Os ritos de nascimento enfatizam a agregação, enquanto os funerários, a separação. A fase de margem, especificamente, constituem uma etapa autônoma. Na análise ritual de Van Gennep, muita vezes é a fronteira entre o sagrado e o profano.

A importância da análise de Van Gennep é a ênfase da “razão de ser” do rito e do mecanismo ritual, influenciando outros estudiosos, entre os quais Victor Turner (1920-1983), que incorpora a visão do rito como composto por etapas, e o antropólogo brasileiro Roberto Da Matta. O ano de 1922 marcou a história do século passado, com acontecimentos como a Revolta dos 18 do Forte, a fundação do antigo Partido Comunista e a Semana de Arte Moderna. Foram momentos seminais da história militar, política e cultural do país com características de ritos de passagem. O centenário da Independência fora um ano de muita turbulência, no qual se debatia o futuro do país e a ideia da modernização, sobretudo a industrialização, passou a ser o eixo do nosso projeto de nação.

Neste bicentenário, afora o debate que ocorre no mundo acadêmico, o Brasil parece atarraxado ao passado. Não existe um projeto de nação integrado ao mundo pós-moderno, capaz de construir um novo consenso nacional, como foi, por exemplo, o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek nas eleições de 1950. É preciso construir a coesão social necessária para lançar o país num novo ciclo de crescimento e geração de oportunidades para todos. Estamos naufragando num mar de radicalização política e de iniquidades sociais, entre as quais a fome e a miséria absoluta.

O presidente Jair Bolsonaro, que concorre à reeleição, fomenta o radicalismo político e afronta as instituições democráticas, entre as quais a legislação eleitoral, as urnas eletrônicas, a Justiça Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal (STF). Aposta na balbúrdia política para desmoralizar o processo democrático e pretende transformar o 7 de setembro, a data magna do bicentenário de Independência, num rito de passagem, no qual o sagrado, o Estado democrático de direito, será profanado, se insistir em transferir o desfile militar para Copacabana e transformá-lo numa marcha miliciana, de militantes armados contra a oposição e a ordem democrática.





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