(none) || (none)

Continue lendo os seus conteúdos favoritos.

Assine o Estado de Minas.

price

Estado de Minas

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Utilizamos tecnologia e segurança do Google para fazer a assinatura.

Assine agora o Estado de Minas por R$ 9,90/mês. ASSINE AGORA >>

Publicidade

Estado de Minas coluna hit

Há 55 anos, Belo Horizonte assistia à eleição de sua primeira Miss Travesti

O concurso dividiu opiniões, como mostra exposição virtual do Museu Bajubá, do qual o pesquisador Luiz Morando faz parte


06/12/2021 04:00

Luiz Morando é pesquisador independente sobre memória LGBTQIA+ de BH
Luiz Morando é pesquisador independente sobre memória LGBTQIA+ de BH (foto: LUIZMORANDO37 )

Em 1966, Belo Horizonte era relativamente nova. Mas do alto de seus 69 anos, viu muito coisa acontecer, naquele momento em que a ditadura intimidava a capital mineira. E, nesse cenário, um grupo radicalizou e se impôs. Naquela ano, a cidade viu o primeiro Concurso de Travesti de Minas Gerais. O assunto é tema de uma das exposições virtuais do Museu Bajubá (www.museubajuba.org), criado há pouco mais de um ano.

Segundo Luiz Morando, pesquisador independente sobre memória LGBTQIA+ de Belo Horizonte, o museu “é uma instituição de natureza virtual para preservar a memória dos territórios onde as formas de sociabilidade LGBTQI se constituíram, bem como dos 
eventos e pessoas que se projetaram nesses ambientes”.

Quem navegar pela página, poderá conhecer as exposições em cartaz e os futuros roteiros das estações que compõem o museu (Rio de Janeiro, BH, São Paulo, Curitiba e Campos de Goytacazes). “A base de nossa ação é pensar nossa iniciativa como fundamento da cidadania cultural do público LGBTQI ”, afirma Morando. 

“Entre gritinhos e emoções – 55 anos de Miss Travesti Minas Gerais em Belo Horizonte” é uma das exposições. “O público tem sido bastante receptivo, utilizando o material das duas exposições em escolas e como referência para estudos. Nesse sentido, o museu cumpre seu papel educativo também”, declara o pesquisador.

Curioso ver que o primeiro concurso de Miss Travesti em Minas Gerais completou 55 anos. Ou seja, foi promovido em plena ditadura. De lá pra cá, muita coisa mudou. Hoje, o movimento LGBTQI , apesar dos ataques do governo federal, tem mais a comemorar ou lamentar?

Apesar do atual governo, reacionário e conservador em todos os âmbitos, o movimento LGBTQI ainda pode co- memorar. Isso se deve, contraditoriamente, a conquistas adquiridas por meio de decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), a partir de 2011, como o reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo; a conversão da união em casamento civil; a adoção de crianças por pessoas LGBTQI ; a alteração de nome civil por pessoas transgênero diretamente em cartórios; a equiparação da LGBTfobia ao crime de racismo; a doação de sangue.

No Museu Bajubá, existe uma variedade de recortes de jornais dos anos 1960 mostrando como os meios de comunicação de BH, àquela época uma capital provinciana, fi- zeram ampla cobertura do evento. O que levou ao interesse de cobertura tão ampla em pleno anos de chumbo?

A variedade de recortes de jornais re- vela um olhar majoritariamente preconceituoso, apressado em estigmatizar a diferença e reforçar a discriminação. Por um lado, a imprensa cum- priu o seu papel de noticiar o que é novidade; por outro lado, seu discurso sempre foi moralizador, de apoio a uma ordem já estabelecida (da família heterocentrada) e a ações de violência, por parte da polícia contra o público LGBTQI .

O concurso quase não aconteceu por intervenção da polícia, mas, no fim das contas, Sofia de Carlo (Belo Horizonte), Erika (Passos), Diva de Windsor (Varginha), Mara (Juiz de Fora), Serena (Santa Luzia), Ma- rilu (Divinópolis), Mireille (Itapecerica), Maria Raquel (Patos de Minas), Silene (Ouro Preto) e uma candidata não identificada de Uberlândia fizeram o desfile. O título ficou com Sofia. O que se sabe da trajetória dessas pessoas?

Consegui rastrear a trajetória de apenas três delas – Sofia de Carlo, Erika e Diva de Windsor. Entre as três, Sofia de Carlo foi a única que permaneceu em Belo Horizonte e assumiu, a partir de 1967, a realização dos concursos e desfiles de Miss Travesti até a década de 1980. Ela se tornou uma referência para a comunidade LGBTQI nesse período e obteve grande reconhecimento pelas ações culturais voltadas a esse público nos bares, boates e saunas frequentadas por aquele segmento.

Em um dos recortes de jornal, chama a atenção o fato de senhoras católicas da cidade e a Sociedade de Tradição, Família e Propriedade pedirem satisfação à Secretaria de Segurança, que "permitiu tama- nha afronta às tradições de honradez e polidez de Minas Gerais". Estamos em 2021, mas ainda existem grupos que se escandalizam com o fato de, por exemplo, o filho do Super-Homem ser bissexual. Por que a questão LGBTQI ainda continua sendo sinônimo de preconceito em parte da sociedade?

Infelizmente, o preconceito é uma condição intrínseca ao ser humano. Nossa disposição e nossa luta devem ser de combater o preconceito e a discriminação, de educar quem age desse modo, para que as pessoas não tenham seus direitos diminuídos ou retirados. Em particular, pessoas LGBTQI ainda têm sua existência em risco, sendo alvo de muitas ações de violência que retiram suas vidas, levando o Brasil a ocupar uma posição mundial inaceitável de liderança de mortes de pessoas LGBTQI .

Quais são os desafios tanto para o movimento LGBTQI quanto para o próprio museu em tempos tão complicados?

São vários os desafios! Em relação ao Bajubá, posso dizer que são pelo menos dois grandes: captar recursos financeiros para garantir a continuidade das ações (as leitoras e os leitores podem visitar nossa lojinha no site do museu) e ampliar o número de estações que compõem o museu para diversificar e garantir a pluralidade de culturas regi- onais LGBTQI do Brasil.

Qual o seu grande sonho em relação ao museu?

Que o Museu Bajubá seja reconhecido como uma referência contínua para a guarda e preservação da memória LGBTQI no Brasil.

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)