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Estado de Minas COLUNA HIT

A metamorfose do novo mundo

A cantora Clara Câmpara, da dupla Clara x Sofia, escreve no 'Diário da quarentena' sobre como enfrenta %u2013 com arte %u2013 estes tempos de pandemia


03/09/2020 04:00

Diário da quarentena

Para sentir ou esquecer

Clara Câmpara
Cantora da dupla
Clara x Sofia

 Li Fernando Pessoa outro dia e ele clamou por um sopro de poesia que o fizesse chegar perto de sentir ou de esquecer. Hoje tenho os desejos de Fernando enquanto almejo ser o tal sopro poderoso.

Estou há seis meses em casa e quero cantar para sentir ou esquecer, por um segundo que seja, o estranho 2020. Quero que cantem pra mim também. Estou em casa e não posso ser tocada, não posso tocar! Mas quero tanto sentir poesia. Preciso disso para aguentar ser.

Em tempos de vírus, eu e Sofia, minha dupla na música e na vida, encontramos nossa sobrevivência íntima e artística no mergulho. Um mergulho longo e sem previsão de emersão. Arrastado, silencioso, detalhista. Horas a fio se conhecendo, se entendendo e se redescobrindo. O que não tínhamos tempo para fazer até o boom do vírus virou mato, veio forte.

Clara e Sofia finalmente tiveram um tempo para entender tudo o que havia acontecido durante quatro anos de trabalho duro. Todos os tijolos que foram colocados e agora estão envoltos no concreto que segura e constitui essa dupla. Passamos dias e dias numa terapia infindável, analisando todas as marcas que ficaram e se ramificaram ao longo dos anos e descobrindo para onde elas vão nos levar.

Esse mergulho nos apresentou nossa identidade, nossa mensagem, o som indie pop que produzimos. A gente gosta de cor, a gente gosta de gente, a gente ama o amor e a gente quer cantar. Mergulho de onda criativa e de riscos corridos. Finalmente. Oba! Lá vem a produção do nosso primeiro disco.

Estamos crescidas, vamos amadurecendo. Sem romantizar o período de reclusão, conseguimos colher uns limões durante o nado. Com toda acidez que os acompanha, mas a limonada vem. Nesse encontro com nós mesmas, fomos lembradas de sentir e esquecer. A arte faz viver. Estamos vivas, tudo sob controle.

Paralela e paradoxalmente à submersão, pairamos fortemente no mundo virtual das lives e buzinas no lugar de palmas – o show no drive-in foi louco. Que mundo louco. Me recuso a chamar de novo normal. É mais um recurso, um respiro muito bem dado. Tem que respirar. O palco mudou. Tá diferente. Tem várias facetas. Metamorfose do mundo novo.

Oi, mundo. Oi, gente, que saudade. Deixa eu cantar pra vocês? Viramos produtoras de conteúdo. Fazedoras de lives. Tudo o que era cozinhado nas nossas tais sessões de terapia virava conteúdo criativo nas nossas redes. Fomos dando vazão. Fomos indo. E achamos conforto e plateia. Achamos até uma plateia presencial! Carros! (Que nem no filme!) Buzinas calorosas saudaram e aplaudiram nossa performance! Numa áurea de saudosismo e união, compartilhamos alegria com 106 carros. (QUE NEM NO FILME!) Naquela hora preciosa e estranha, o sopro veio forte! Aquele vento que faz sentir e esquecer. Aquela atmosfera que se descola um pouquinho da estranheza do isolamento. Recebemos, neste mundo ao avesso, um sopro bem forte.

No mergulho ou no novo normal, a poesia tá lá! Me soprando pra frente. Me fazendo sentir. Me dando motivo. A saudade que a gente tá do palco, o amor pela música, a força da nossa amizade leva pra frente. Que vento poderoso! A cada encontro desses longos seis meses, um passo flutuante para a frente foi dado. É difícil enxergar sempre esse lado bonito, o romântico. É difícil se deixar sentir plenamente. Tão plenamente a ponto de você se ver num mundo sem paredes. Mas a poesia tá lá. O tempo todo. Por onde você se adaptar. Por onde os estranhos e improváveis caminhos nos levarem. Ela tá lá.

Felizes somos nós por viver e sobreviver de poesia e gente.

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